Pescadores cearenses estão inconformados com as mudanças
estabelecidas pela Portaria Interministerial Nº 78, que modifica as
normas para o período de defeso em águas continentais da região
hidrográfica do Atlântico Nordeste Oriental, incluindo o Ceará. Com a
nova portaria, a pesca durante o período de defeso, entre os meses de
janeiro e abril, será proibida apenas para espécies nativas. Para
espécies exóticas ou originárias de outras regiões, será permitida,
mesmo durante o período reprodutivo.
O titular da Secretaria da Agricultura, Pesca e Aquicultura do Estado
do Ceará (Seapa), Euvaldo Bringel, se reuniu ontem (11) com pescadores e
o deputado federal Odorico Monteiro (PSB) para debater ações visando a
suspensão da Portaria, assinada pelo titular do Ministério da Indústria,
Comércio Exterior e Serviços (MDIC), Marcos Pereira, e pela substituta
do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Diva Alves Carvalho. O parágrafo
primeiro do artigo 9º da Portaria determina que os peixes de "espécies
nativas, quando capturados, deverão ser imediatamente devolvidos ao
corpo d'água onde foram pescados".
Viabilidade questionada
No entanto, os pescadores questionam a viabilidade prática da seleção
de espécies durante o trabalho da pesca. "Trabalhamos à mercê da sorte.
Como vamos selecionar as espécies? É crime ambiental devolver sabendo
que está morto ou vai morrer", ressalta José Ribamar Pereira, presidente
da Colônia Z45, de Granja.
José Ribamar conta que adota a pesca de espera com malharia, também
chamada de pesca de molho. Todo o processo duraria entre oito e dez
horas, e o tempo de sobrevivência dos peixes na rede seria, segundo ele,
de duas a três horas, no máximo.
O presidente da Federação das Colônias de Pescadores do Estado do
Ceará, Raimundo Felix da Rocha, ressalta que a portaria vai resultar na
suspensão do Seguro-Desemprego dos Pescadores Artesanais (SDPA),
conhecido como Seguro Defeso. Caso isso ocorra, segundo ele, cerca de
cinco mil famílias deixarão de receber o benefício durante o período de
defeso, recurso utilizado para financiar a alimentação dessas pessoas.
Por meio de nota, a Secretaria de Aquicultura e Pesca do MDIC esclarece
que a Portaria Nº 78/2017 estabelece alternativas de pesca durante o
período de defeso. Por esse motivo, e de acordo com o Decreto Nº
67/2017, não será devido o benefício do Seguro Defeso quando houver
disponibilidade de alternativas de pesca nos municípios alcançados pelos
períodos de defeso. A Secretaria ressalta, ainda, que a medida permite
que os pescadores continuem exercendo sua atividade, não resultando em
nenhum prejuízo econômico para o setor.
Por outro lado, a nova determinação também preocupa o secretário
Euvaldo Bringel. Conforme suas informações, o Ceará é o Estado
brasileiro com o maior número de açudes, e a medida vai afetar a
sobrevivência de 17 mil pescadores que atuam em águas continentais.
"A portaria vai impactar espécies importantes para o equilíbrio
ambiental. Existe toda uma cadeia alimentar. Mexer no equilíbrio do
ecossistema é muito grave. Se mexer, haverá desequilíbrio. É uma medida
de quem não conhece a realidade do Nordeste", afirma Bringel.
De acordo com Odorico Monteiro, a Portaria seria uma tentativa de
diminuir os gastos com o auxílio recebido pelos pescadores. "É forçada
pela área econômica. Vamos lutar para que seja revogada. É uma ameaça à
sobrevivência dos pescadores", afirma. O deputado informa que tem
reunião agendada para o dia 17 de janeiro com o secretário da
Aquicultura e da Pesca do MDIC, Dayvson Franklin de Souza, para debater
sobre a questão.
O MMA informou, por meio de nota, que as propostas de revisão das
normas de pesca para a Região Hidrográfica do Atlântico Nordeste
Oriental surgiram em oficina de trabalho sobre conservação e uso
sustentável de recursos pesqueiros das bacias do Nordeste, realizada em
dezembro de 2015.
"As informações trazidas apontaram para a afirmativa de que a atividade
pesqueira na região é predominantemente realizada em corpos d'água
artificiais, como açudes e represas, e que a captura é direcionada
principalmente às espécies exóticas", explica a nota.
O órgão esclarece, ainda, que as mudanças propostas pela Portaria têm
como objetivo aumentar a proteção ambiental às espécies nativas e
harmonizar as regras de pesca das bacias afetadas com as normas vigentes
em outras bacias hidrográficas brasileiras no que tange à permissão da
pesca de espécies exóticas.
Fique por dentro
Portaria Interministerial Nº 78
Pela Portaria, fica proibida a captura, o desembarque, o transporte, o
armazenamento, o beneficiamento e a comercialização das espécies
curimatá comum, mandi e piau verdadeiro, com comprimentos totais,
respectivamente, inferiores a 25, 15 e 26 cm. Também fica proibido,
entre janeiro a abril, o armazenamento, o transporte e a pesca comercial
de peixes e invertebrados aquáticos nativos das regiões hidrográficas
do Atlântico Nordeste Oriental. Indivíduos de espécies nativas, quando
capturados, deverão ser devolvidos ao corpo d'água onde foram pescados.
Fica permitida a utilização de rede de espera com malha apenas em
represas e açudes artificiais. E mesmo nesses locais, de janeiro a
abril, o uso desse apetrecho de pesca é proibido.
Diário do Nordeste
Caderno Regional
(Colaborou Aline Moura)