Ex-lutador de 58 anos passou dois anos e meio internado por demência pugilística, a Encefalopatia Traumática Crônica
Esse é o nome popular da Encefalopatia Traumática Crônica, síndrome
neurodegenerativa causada por frequentes golpes na cabeça, o mal dos
pugilistas. Mas ela não é exclusiva dos lutadores. As pesquisas mais
recentes se debruçam sobre o futebol americano, hóquei e rúgbi. Não tem
cura e é lentamente progressiva com uma sobrevida de 20 anos.
As
pancadas levam à destruição dos neurônios ocasionando vários sintomas.
Antes dos 50 anos, ela provoca mudanças no comportamento. Nos mais
idosos, perda de memória, fala arrastada, tremores e problemas de
coordenação. Maguila, sergipano de Aracaju, está no primeiro time.
Imagine um peso pesado bravo. “Ele ficava agressivo. Até tentou bater em
um paciente do hospital”, conta a mulher Irani Pinheiro.
No caso
de José Adilson Rodrigues dos Santos, o buraco estava um pouco mais
embaixo. O diagnóstico inicial, e equivocado, apontava Mal de Alzheimer,
doença progressiva que destrói a memória e outras funções mentais.
Renato Anghinah, coordenador do Núcleo de Neurologia do Hospital
Samaritano, acha injusto falar de erro médico. O que houve, na sua
opinião, foi um equívoco de diagnóstico. “Não é culpa do médico. A
encefalopatia aparece com cara de Alzheimer, de fato”, comparou o médico
de Maguila.
Um dos autores do livro “Concussão cerebral – muito
mais que uma simples batida na cabeça”, Anghinah coordena o atendimento a
um grupo de pacientes no Hospital das Clínicas de São Paulo. Por
insistência de amigos, o especialista deu uma olhada em Maguila no ano
passado. Foi aí que o ex-boxeador começou a se levantar. Literalmente.
A
internação foi sofrida. Maguila se alimentava por meio de uma sonda
porque não conseguia mastigar. Ele emagreceu 28 quilos. Tornou-se mais
agressivo. Foram três instituições diferentes: Hospital da Santa Casa de
Misericórdia, Hospital Dom Pedro II e a Clínica Incare. Irani afirma
que foi “pauleira”, pois não tinha condições de instalar um centro
médico em casa.
Maguila saiu da última clínica em setembro e
está reaprendendo a viver em casa. O medicamento forte impede
estripulias. Depois do café da manhã, ele se deita novamente, vê TV e
caminha. Às vezes se confunde com o tempo e pergunta várias vezes que
dia é. “Maguila virou um filho que precisa de atenção 24 horas por dia”,
explica a mulher.
O ex-boxeador fala bem e entende tudo. Atento
ao noticiário, elogiou a conquista da medalha de ouro pelo lutador
Robson Conceição nos Jogos do Rio. A inteligência está viva e conseguiu
se esquivar das poucas chances que teve na educação formal – Maguila foi
servente de pedreiro antes de ser lutador. Sua marca registrada – as
piadas e sacadas bem-humoradas – ainda está lá. “Dinheralmente, não
ajudei o boxe, mas incentivei muito”, sorri.
E vai muito além da
língua afiada. Ele é o mais bem-sucedido peso pesado do boxe brasileiro.
A derrota para o norte-americano Evander Holyfield em 1989 acabou com o
sonho de disputar o título mundial com Mike Tyson, supercampeão da
época. Maguila foi campeão mundial em 1995, ao derrotar por pontos o
inglês Johnny Nelson, pela Federação Mundial de Boxe, uma das dezenas de
entidades da modalidade e que possuía pouca expressão. “A luta mais
difícil da minha carreira foi contra o George Foreman. Parecia que eu
dava soco numa parede”.
O lutador deixou os ringues em 2000, com
77 vitórias, 61 delas por nocaute, em 85 lutas. Aí, virou pop. Tem gente
que deve se lembrar do bordão “Esta porta é mutcho resistente” em
comercial de TV. Estrelou programas como o “Aqui Agora”, do SBT, e o
“Show do Tom”, na Record. Lançou um CD de samba e tentou se eleger
deputado federal em 2010, mas os três mil votos foram insuficientes.
Agora,
quer voltar à tevê. Embora o tratamento para reabilitação seja
contínuo, com medicação, fisioterapia e fonoaudiologia, Anghinah aposta
que ele poderá retomar algumas atividades. “Ainda hoje as pessoas se
lembram de mim. Fico muito feliz por isso”, diz o lutador.
O
jornal O Estado de S. Paulo encontrou Maguila na semana passada em
homenagem que recebeu do projeto social Amanhã Melhor, coordenado por
sua mulher e companheira de vida. Prestou atenção nas quase duras horas
do evento e tomou o sorvete no final. Ele adorou tudo e também ficou
satisfeito por não ter derrubado nenhuma gotinha no terno preto. Com
informações do Estadão Conteúdo.
Jornal do Pais




