Ciro Gomes, o presidenciável do PDT, recentemente, por ocasião de uma
palestra em Barcelona, na Espanha, falou do temor de termos uma das
eleições "mais fraudadas da história", segundo registro do jornal O
Estado de S. Paulo. Em dois momentos, neste espaço, tratamos da questão
do Caixa Dois, no pleito deste ano, por conta dos limites de gastos
estabelecidos pela legislação eleitoral, para os postulantes a cada um
dos cargos em disputa (deputados federais e estaduais, governador e
vice, senador e suplentes, e presidente da República).
Pouco se tem falado de abuso do poder político, um dos mais
significativos instrumentos proporcionadores dos desequilíbrios nas
campanhas, embora um ou outro deputado estadual, incomodado com
interferência de pessoas ligadas diretamente aos executivos em seus
colégios eleitorais, tenham esboçado tímidas reações.
Um documento do Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Ceará, retirado
de uma auditoria, por amostragem, em convênios da Secretaria do Trabalho
e Desenvolvimento Social (STDS) do Executivo cearense, mostra a força
que tem um candidato controlador de verbas da administração pública.
O secretário Josbertini Virgínio Clementino, titular da Secretaria
citada, que está na relação de candidatos a deputado estadual, por sinal
motivo de reclamação de alguns dos seus concorrentes a vagas no
Legislativo, administra um total de R$ 169.828.983,35, aplicados em 120
convênios voltados para a assistência social e segurança alimentar,
envolvendo, dentre outras ações, a contratação indiscriminada de
pessoal.
Banheiros
Recursos de convênios e de emendas parlamentares precisam sempre de
fiscalização especial. Eles, como os exemplos têm comprovado, são um dos
caminhos da malversação, incluindo a compra de votos. Não faz muito os
cearenses tomaram conhecimento do escândalo dos banheiros, fruto de
convênios do Estado com associações comunitárias para a melhoria
sanitária de residências de pessoas humildes, embora tenha resultado, de
fato, em ações com fins eleitoreiros e de enriquecimento ilícito,
descoberto por denúncias que resultaram em ações judiciais para
recuperação dos recursos públicos desviados e punições dos culpados.
A ação dos integrantes do TCE, no seu mister, neste momento não chegou
apenas a Josbertini, pretenso candidato, ela também tem resultados na
área da Saúde, onde era abusiva a acumulação de cargos e nas secretarias
relacionadas ao Sistema Previdenciário do Estado, esta, realmente,
tratando de questões burocráticas, importante, sim, para o equilíbrio
das finanças públicas estaduais.
Poder político
O caso da Saúde é diferente do Previdenciário, pois a questão da
acumulação de cargos ou empregos, no caso brasileiro, quase sempre está
relacionada a interesses eleitoreiros, principalmente quando eles
acontecem antes e depois das eleições, com os governantes cumprindo
compromissos de campanha.
O uso da estrutura de qualquer das administrações, de prefeituras, de
estados e da União, nas eleições deste ano é muito mais forte por conta
de aberturas da legislação eleitoral, e, como o Caixa Dois, outro forte
mecanismo de fraude nas campanhas, quando eleva os titulares de cargos
públicos, mesmo que se afastem seis meses antes do dia da votação, à
condição de candidato privilegiado.
E são muitos os que estão abusando da força do poder político.
Atualmente, no Ceará, semanalmente estão acontecendo verdadeiros
"comícios" a pretexto de inauguração de obras ou liberação de ordem de
serviços e entrega de bens comunitários.
Não nos surpreenderá se representantes do Ministério Público Eleitoral,
logo após as convenções partidárias, em agosto próximo, propuserem um
grande número de ações de impugnações de registros de candidaturas de
detentores de cargos comissionados, deputados estaduais e federais, e
até do senador Eunício Oliveira, figura permanente nos eventos
promovidos pelo governador do Estado. Embora não se registre "o pedido
explícito de voto" nos eventos oficiais dos governos, para configurar a
propaganda eleitoral antecipada, por certo o órgão responsável pela
fiscalização do pleito, o Ministério Público, tem outros elementos para
tentar enquadrar os cometedores de excessos.
Financiamento
Ciro, ao falar sobre a possibilidade de Caixa Dois na campanha, disse
da sua preocupação com a possibilidade de Igrejas e do narcotráfico,
"que movimentam grandes quantias de dinheiro vivo", serem os
abastecedores do tal Caixa, substituindo o financiamento das empresas
privadas, hoje proibidas de doarem para os partidos e candidatos. Esta
proibição, sem dúvida, garantirá a manutenção dessa contabilidade
condenada, posto ser irreal o limite de gastos determinado para cada
candidato, sem que se tenham sido feitas as alterações necessárias ao
modo de campanha feita no Brasil. A pequena redução do tempo para os
candidatos inebriarem os eleitores reduz muito pouco despesas.
Pela legislação aprovada no ano passado para as eleições de 2018, um
candidato a deputado estadual pode gastar até R$ 1 milhão; para deputado
federal o teto é de R$ 2,5 milhões; os postulantes às vagas de senador,
que neste ano são duas, poderão fazer despesas que variem entre R$ 2,5
milhões e R$ 5,6 milhões, dependendo do número de eleitores em seu
respectivo Estado.
No caso dos governadores, a lei estabelece uma margem de gastos entre
R$ 2,8 milhões a R$ 21 milhões, dependendo do número de eleitores de
suas respectivas localidades, sem especificar os valores para um
possível segundo turno da disputa, como acontece para a eleição
presidencial, cujos números foram fixados em R$ 70 milhões para cada
candidato no primeiro turno e, no segundo turno, R$ 35 milhões.
Repetindo o que registramos neste espaço, em fevereiro último, no
Ceará, pessoas consideradas entendidas em campanhas, com as diferentes
peculiaridades de cada uma delas, admitem custar a eleição de um
deputado federal, sem ligação com emendas parlamentares,
consequentemente sem contar com prefeitos para custearem boa parte das
despesas, entre R$ 5 milhões e R$ 7 milhões. E entre R$ 2 milhões e R$ 3
milhões uma campanha de deputado estadual. E se só podem contabilizar
oficialmente o valor máximo determinado pela legislação, o restante fica
no Caixa Dois.
Janela partidária
Termina na próxima sexta-feira o prazo legal para os deputados federais
e estaduais mudarem de partidos, sem sofrerem as consequências da lei
que trata de fidelidade partidária. Alguns cearenses já buscaram
acomodação onde admitem ter melhor chance na eleição. Outros, porém,
ainda têm dúvidas, pois lhes sobraram poucas opções e ainda convivem com
a desconfiança de alguns dirigentes partidários.
No dia 7 de abril, todos os pretensos candidatos precisam estar
filiados a um partido político. Antes, a exigência da filiação
partidária era de um ano antes da eleição. Acontece que as convenções
partidárias só acontecem entre julho e agosto, e serão nelas que
acontecerão as homologações das candidaturas. Como em muitos dos atuais
partidos nacionais os donos deles decidem quem será candidato ou não,
têm políticos, no campo da oposição, preocupados em não ter legenda, no
caso de o Governo se acertar com o partido em que ele está filiado.
Além da questão da legenda, vários políticos interessados na mudança de
sigla enfrentam outro tipo de dúvida: a mudança de comando dos
partidos, como aconteceu recentemente no Ceará, alterando totalmente o
curso da agremiação, com sérias consequências para os seus filiados.
Todo e qualquer partido no Estado administrado por Comissão Provisória
está sujeito a essa situação, pois só o Diretório daria uma certa
garantia aos filiados do Estado, em razão da dificuldade de ele ser
destituído e, portanto, fora do arbítrio dos donos dos diretórios
nacionais.
Diário do Nordeste