O afastamento e dissipação da Zona de Convergência Intertropical
(ZCIT) - uma extensa massa de nuvens que forma o principal sistema que
traz chuvas nessa época do ano para o Ceará - traz preocupação para os
produtores rurais e surpresa para os meteorologistas. Nos últimos seis
dias, as precipitações deixaram de ser generalizadas no Estado e
tornaram-se localizadas e reduzidas.
A ocorrência de veranicos é considerada normal. Os meteorologistas
sempre lembram que o Semiárido nordestino é caracterizado por
irregularidades das chuvas no tempo e no espaço geográfico. Mas o que
provocou em primeiro momento o afastamento da ZCIT da costa cearense
desde o último dia 4 e atualmente a dissipação do próprio sistema?
O supervisor da Unidade de Tempo e Clima da Fundação Cearense de
Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), Raul Fritz, explicou que um
centro de alta pressão formou-se na atmosfera superior, inibindo a
convectividade, ou seja, a subida do ar úmido para formação de nuvens de
chuva. "Esse fato é imprevisível, está associado às condições
atmosféricas, mas não se sabe, segundo os modelos atuais, a causa e a
sua duração", explicou. "A ciência ainda não domina todo esse
conhecimento".
Ainda segundo Raul Fritz, as condições oceânicas permanecem favoráveis.
No Oceano Pacífico Equatorial, continua o sistema denominado de La
Niña, esfriamento das águas superficiais. No Norte do Oceano Atlântico
Equatorial Sul, a temperatura permanece entre neutro e aquecido. "A
umidade não está chegando a altos níveis, fica mais próxima da
superfície e não se formam nuvens de chuva. Um centro de alta pressão
impede essa conectividade", enfatizou.
As imagens de satélite mostram não só o afastamento da ZCIT, mas a sua
dissipação, isto é, a ausência das nuvens. "É normal ocorrer durante a
quadra chuva, ocasionando os veranicos, mas não se esperava para o
início deste mês", reafirmou Fritz. "No momento houve uma dissipação até
a costa da África".
Os modelos meteorológicos, entretanto, apontam para que a ZCIT comece a
voltar, beneficiando inicialmente o Norte do Estado, a faixa litorânea,
a partir da próxima semana. A ausência de chuvas ou diminuição delas
traz dificuldades para a recarga dos principais reservatórios. A
tendência é a queda do nível de água nos riachos e rios nos próximos
dois dias.
"Para recarga satisfatória dos grandes açudes, vamos precisar de chuvas
mais intensas e com maior regularidade", observa Fritz. A tendência
para o trimestre (março, abril e maio) continua, segundo a Funceme, de
ocorrência de chuvas acima da média. "Podemos, por exemplo, ter um fim
de março e um começo de abril muito bons", estimou Fritz. "A nossa
previsão é feita para a média geral, da quadra, e não mês a mês".
Mais afetada
A região dos Inhamuns e grande parte do Centro-Sul e Sertão Central
enfrentam ausência de chuvas desde o último dia 4. "A chuva foi embora e
isso já começa a nos trazer preocupação", disse o diretor de Políticas
Agrícolas do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Tauá, Raimundo
Cícero Pereira. "O dia amanhece nublado, mas logo o sol abre".
Os agricultores mostram preocupação. "A segunda quinzena de fevereiro
animou todos os produtores com muitas chuvas em todo o Ceará que se
estendeu até o início deste mês, mas o quadro mudou", observou o gerente
regional da Ematerce, em Iguatu, Joaquim Virgolino Neto. "A terra está
bem molha, mas se o veranico se estender o solo começa a secar e
prejudicar o crescimento do plantio".
O secretário de Meio Ambiente e Políticas Agrárias do STR de Crateús,
Luís Edvan Vieira da Silva, disse que, na maioria dos municípios da
região, as chuvas continuam. "Estão mais fracas, isoladas, um dia chove
em uma área, depois em outra, mas os agricultores continuam animados",
frisou. A sangria do Açude Batalhão, em Crateús, fez com que fosse
suspenso o fornecimento de água por meio da adutora do Açude Araras, em
Varjota.
Reunião
No próximo dia 14, haverá em Iguatu a reunião de avaliação e alocação
de água dos três maiores açudes do Ceará: Castanhão, Orós e Banabuiú. No
encontro, promovido pelos Comitês de Bacias Hidrográficas dos Vales do
Jaguaribe e Banabuiú haverá definição sobre os múltiplos usos da água
(irrigação, consumo humano e dos animais).
"Por enquanto, a liberação de água do Castanhão para a Região
Metropolitana de Fortaleza permanece suspensa", observou o gerente da
Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), em Iguatu, Lauro
Filho. "Qualquer mudança será definida na reunião de Iguatu".
Diário do Nordeste