Sobral. "Sempre admirei a figura de Dom Pedro I, um
liberal para sua época, defensor do pensamento constitucional, em
detrimento ao absolutismo". Com este pensamento sobre a figura
emblemática, conhecida por todos apenas pelas imagens oficiais
retratadas e reproduzidas à exaustão nos livros de História do Brasil,
que fincou pé na antiga Terra de Santa Cruz e, em desobediência à corte
portuguesa, disse que ficaria no Brasil, em 9 de janeiro do ano em que
proclamaria a Independência do País, o advogado e professor
universitário José Luís Lira resolveu, aproveitando-se da tecnologia
atual, realizar um antigo sonho: saber como eram os traços fisionômicos
do Imperador, se ele parecia com seus tetranetos, ou mesmo com as
imagens e estátuas que o representam.
A curiosidade de menino, enfim, se uniu ao olhar apurado do
pesquisador, do cientista que busca por respostas baseadas nos fatos.
"Diminuíram o valor histórico e político que Dom Pedro I tinha. Após a
Independência, ele foi aclamado por todas as câmaras municipais
brasileiras, o Imperador e defensor perpétuo do Brasil. Por quê nos
privarmos da verdadeira imagem dele?", questiona o pesquisador, nascido
em Guaraciaba do Norte, na Serra da Ibiapaba, no Norte do Estado.
Resgate
"A mim, essas e outras eram perguntas que não queriam calar", reforça o
professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA), em Sobral,
cidade polo do Norte do Estado, ao descrever outros talentos do
imperador, além de seu lado aventureiro, que por várias vezes o fez cair
de cavalos, causando fraturas no nariz, reconhecidas e consideradas ao
longo do processo de recriação de seu rosto.
O homem apaixonado; o musicista, que compôs e executou diversas músicas
ao lado de sua esposa, Dona Leopoldina; o autor da música do Hino da
Independência do Brasil; o Duque de Bragança, após abdicar o trono
português, em favor de Dona Maria II, sua filha, que teve seu reinado
garantido por conta do pai, que lutou para isso, e foi aclamado o "Rei
Soldado"; enfim, descortinar todo o legado, até em parte, deixado de
lado pela própria História. Um resgate possível com apoio e ajuda dos
descendentes do Imperador, ligados à Família Real Brasileira.
Pesquisa
Em 2015, após a reconstrução dos rostos de Maria Madalena e de Santa
Paulina, Luís Lira e o amigo Cícero Moraes, designer catarinense,
referência no campo da reconstrução facial forense no Brasil, resolveram
encarar o novo desafio. Os pesquisadores entraram em contato, por meio
de amigos em comum, com Dom Luís de Orleans e Bragança e o irmão dele,
Dom Bertrand de Orleans e Bragança, tetranetos de Dom Pedro I, além de
primeiro e segundo, respectivamente, na linha de sucessão ao trono
brasileiro.
Os parentes do imperador autorizaram a fazer a reconstituição. Com o
aval da Casa Imperial do Brasil, ao longo das buscas por material, Luís
Lira encontrou uma fotografia do crânio do monarca, realizada em 2012
por Maurício de Paiva, da Revista National Geographic Brasil, durante a
exumação dos restos mortais do imperador, na cripta localizada no bairro
do Ipiranga, zona sul de São Paulo. À época, o trabalho serviu a um
estudo científico realizado pela Universidade de São Paulo (USP). Com os
direitos de uso da fotografia adquiridos pelo advogado, o designer
Cícero Moraes conseguiu realizar a reconstituição.
Particularidade
Entre as particularidades encontradas ao analisar as imagens, como a
possibilidade de o monarca ter seu nariz fraturado, por exemplo, Lira
conta que o material colhido foi encaminhado ao perito legista Marcos
Paulo Salles Machado, chefe do Serviço de Antropologia Forense do
Instituto Médico Legal (IML) do Rio de Janeiro. Sem saber que se tratava
do crânio do imperador, o legista atestou em seu laudo, além do sexo,
cor, idade aproximada, tipo físico e outros detalhes, como sua etnia,
por exemplo, que "a pessoa em questão", segundo o advogado, "tinha um
desvio no nariz, que não era natural. Podendo ter sido causado por
quedas de cavalo. O que foi confirmado pelos familiares de Dom Pedro I,
durante as constantes trocas de informações ao longo do processo de
reconstituição da face do primeiro imperador do Brasil, morto em 1834,
pouco antes de completar 36 anos.
O projeto durou cerca de três anos, quando o resultado foi apresentado
ao público, após a aprovação final dos irmãos Orleans e Bragança.
Caracterização
Na imagem, o imperador aparece com olhar firme e cabelos
característicos da época em que viveu, além de usar o Colar da Ordem do
Tosão de Ouro do Reino da Espanha, ordem de cavalaria fundada em 1429,
por Filipe III, Duque da Borgonha.
Dom Pedro também usa diversas comendas de Grão-Mestre de ordens
imperiais, entre elas, a de Dom Pedro Primeiro, Fundador do Império do
Brasil, e Ordem do Cruzeiro Real.
A imagem também traz a faixa da Imperial Ordem do Cruzeiro e da
Imperial Ordem de Pedro Primeiro, unificadas na cor verde com listras
brancas.
Ainda, segundo José Luís Lira, "após ser apresentada à família imperial
e divulgada ao mundo, a imagem será mostrada no XXVIII Encontro
Monárquico Nacional, realizado no mês de junho deste ano, no Rio de
Janeiro. Lá, será apresentada em uma exposição mais ampla e detalhada,
acredito", adianta o pesquisador, sobre o evento realizado pela Casa
Imperial do Brasil, que reúne os apoiadores da Monarquia de todo o País.
Diário do Nordeste