O Brasil perde cerca de R$ 550 mil para cada assassinato de jovens entre
13 a 25 anos. Em 20 anos, o país acumula mais de R$ 450 bilhões em
prejuízo devido ao elevado número de homicídios. A conclusão é de um
estudo inédito da Secretaria de Assuntos Estratégicos do governo
federal, obtido pelo Jornal Folha de São Paulo.
A pesquisa calculou quanto custou a criminalidade para o país no período
de 1996 a 2015. No caso dos homicídios, o valor se refere à perda da
força produtiva, ou seja, quanto o Brasil deixa de ganhar com os frutos
que o trabalho de cada vítima renderia. Para calcular o valor que o país
desembolsou por causa da violência, o relatório mensurou os gastos do
setor público e privado em seis áreas: segurança, seguros e danos
materiais, custos judiciais, perda da capacidade produtiva,
encarceramento e serviços médicos e terapêuticos.
Em 2015, a criminalidade custou 4,38% do PIB brasileiro, o que equivale a
aproximadamente R$ 285 bilhões. De 1996 a 2015, os recursos destinados à
segurança pública subiram expressivamente (162%, em valores corrigidos
pela inflação). Contudo, o estudo defende que eles não foram aplicados
de maneira eficiente, visto que o país não conteve o avanço do crime.
Para se ter uma ideia, no mesmo período, o número de homicídios cresceu
49%, e a taxa de assassinatos por 100 mil habitantes, 14%, segundo dados
do sistema de saúde. Nos estados, que são responsáveis pela maior fatia
dos gastos em segurança, o peso da criminalidade no orçamento é ainda
maior, especialmente naqueles com maiores índices de homicídios e com
menor renda per capita.
No Amapá, a violência custou, em 2015, 7% do PIB estadual, maior
percentual do país. Ao mesmo tempo, a taxa de homicídios por 100 mil
habitantes foi de 38,2, enquanto a média brasileira foi de 28,9, segundo
o Atlas da Violência. No Ceará, em Alagoas e em Sergipe, que têm taxas
acima de 46 por 100 mil, a violência custou 5% do PIB.
Segundo o estudo do governo, em razão da Lei do Teto de Gastos (que
limita o aumento dos gastos federais à inflação do ano anterior) e da
situação fiscal delicada da maioria dos estados, não é viável aumentar
expressivamente o valor empregado na segurança. Assim, o documento
sugere uma revisão da política de seguridade brasileira, de modo a
desenvolver estratégias baseadas em evidências empíricas – ou seja,
investir recursos em ações planejadas e com forte chance de retorno.
“Como o Estado não tem mais como gastar, precisamos buscar soluções de
alto impacto e baixo custo”, diz Hussein Kalout, secretário de assuntos
estratégicos e um dos autores do relatório. O pesquisador de violência
da USP Leandro Piquet afirma que, apenas com mudanças na gestão da
segurança pública, muito pode ser feito. “Hoje, na minha visão, o
principal problema é a baixa produtividade dos recursos que temos. Temos
muito policial empregado e poucos na rua. Muito policial civil e pouca
gente investigando”.
Ele explica que o cenário de gastos brasileiro é semelhante ao da
América Latina, região com os maiores índices de homicídio no mundo.
Estudo semelhante feito pelo Banco Mundial estimou que a violência
custa, em média, 3% do PIB latino-americano. Embora sociedades mais
ricas e mais seguras também gastem muito com segurança, o custo relativo
é menor, visto que o reduzido número de crimes gera menos perdas em
força de produtividade, atendimento médico, encarceramento e processos
judiciais. Sobra mais, portanto, para investir em áreas estratégicas.
Outro ponto importante do estudo é a forte recomendação de que as
políticas e ações de segurança sejam alvo de constante avaliação, de
modo a medir sua eficácia e corrigir problemas. Segundo Piquet, porém,
essa cultura de monitoramento de resultados está longe de ser regra na
administração pública. Para Robert Muggah, cofundador do Instituto
Igarapé e colaborador do estudo, quando avaliadas, as políticas de
segurança brasileira levam em conta critérios equivocados.
“Em vez de medir a redução dos índices criminais, os policiais são
recompensados pelo número de prisões e pela quantidade de crack que
apreendem. Em vez de serem recompensados por processar e prender
criminosos violentos, promotores e juízes são recompensados pelo número
de suspeitos encarcerados. O foco está errado”, diz.
Para mudar o contexto atual, o relatório do governo sugere que a
liberação de recursos seja condicionada à realização de avaliações
consistentes sobre as ações. Por fim, o documento traz uma lista de
iniciativas aplicadas em diferentes lugares que tiveram efeitos
comprovados por vários estudos.
Elas se referem a estratégias que vão além da atuação da polícia, como
educação e legalização de certos tipos de drogas. “Os autores defendem,
entre outros, policiamento mais inteligente, sentenças alternativas para
crimes não violentos, intervenções com crianças e o emprego de
tecnologias em áreas que vão da iluminação pública à análise preditiva
de crimes”, explica Muggah.
Ceará Agora