Pelo menos cinco prefeitos do Ceará tiveram os números dos telefones
celulares clonados por bandidos que atuam no interior do Estado. O POVO
teve acesso ao Boletim de Ocorrência (BO) do caso registrado em
Camocim, localizado no litoral norte cearense. Depois de perceber a
fraude, a Procuradoria do município teria conseguido bloquear o repasse
de R$ 552 mil do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
Além do telefone da prefeita de Camocim, Mônica Aguiar, os celulares
dos prefeitos Osvaldo Neto (Reriutaba), Isis Martins (Hidrolândia), Zé
Ailton (Crato) e Renê Vasconcelos (Ubajara) também foram clonados,
segundo fontes da Polícia Civil e perfis dos gestores nas redes sociais.
Os fraudadores, de acordo com depoimentos, entravam em contato com
amigos e secretários municipais, se passando por prefeitos e prefeitas,
para que fossem efetuados pagamentos às empresas que teriam executado
supostos serviços para o município.
Algumas pessoas desconfiaram das
mensagens. Outras, como foi o caso registrado em Camocim, caíram no
golpe do WhatsApp e fizeram transferências diretas da verba do (Fundeb)
para contas particulares. O dinheiro federal é exclusivo para educação. O
valor repassado indevidamente chegou a somar R$ 552.500,00. Segundo o
Portal da Transparência, em 2018, Camocim recebeu R$ 26,2 milhões da
União para aplicar nas despesas admitidas para o Fundo.
O caso
aconteceu na última sexta-feira, dia 30, no início da tarde. Uma pessoa,
se passando pela prefeita, entrou em contato com Felipe Araújo Veras,
que é presidente da Comissão de Programação Financeira da cidade.
Acreditando
estar trocando mensagens com Mônica Aguiar, o tesoureiro das contas de
Camocim "passou a conversar normalmente atendendo aos seus
direcionamentos". Essa história está narrada num boletim de ocorrência
(BO), registrado na manhã seguinte, sábado, 1º de dezembro, na delegacia
da cidade. O POVO teve acesso a uma cópia do BO.
Via
WhatsApp, uma pessoa deu orientações para que o servidor fizesse
"transferências diversas para várias contas" a partir da verba do
Fundeb. A primeira quantia repassada teria sido de R$ 100 mil, dirigida
para uma conta inscrita no Banco Inter (com sede em Minas Gerais). O
repasse não precisou de nenhuma outra chave de bloqueio ou confirmação
eletrônica, foi transferido automaticamente.
O tesoureiro disse,
no BO, ter estranhado a ordem, "sem nenhum tipo de documento como notas"
ou processo de licitação" e teria respondido que "não haveria margem
para tal" (operação). Ele contou na delegacia que chegou a ligar para o
próprio número da prefeita, que teria retornado com a mensagem de
desligado ou fora de área. Ainda assim, teria voltado à conversa via
WhatsApp.
Felipe Veras teria questionado que nunca a movimentação
do dinheiro do Fundeb teria sido deste modo, sem documentações
específicas de contratos. O golpista teria explicado, por escrito, que
ele ficasse tranquilo, que os papéis necessários chegariam a ele ainda
no final da tarde de sexta-feira. O tesoureiro, então, decidiu continuar
atendendo aos pedidos.
A mesma conta do banco Inter recebeu mais
duas transferências, de R$ 45 mil e de R$ 300 mil, respectivamente. O
fraudador indicou mais duas contas e novos valores. Para uma conta no
Banco do Nordeste, pediu que fossem repassados R$ 90 mil. E para a Caixa
Econômica, orientou a transferência de R$ 17.500.
Já perto do fim
da tarde da sexta-feira, por volta das 17 horas, a chefe de gabinete da
prefeita, Ana Elizabeth Rodrigues ("Betinha") ligou para o tesoureiro
avisando que a prefeita tentava falar com ele. Seria para alertá-lo de
que o celular dela teria sido clonado. Só aí Felipe Veras teria
confirmado o golpe.
No Boletim de Ocorrência, consta que o Banco
do Brasil, que atende a conta da prefeitura de Camocim, recebeu ofício
(nº 1130001/2018) com relato da fraude e pedindo o bloqueio das
transações - contas e bancos de destino. O BO é assinado pela delegada
Alana Pinheiro Portela.
O QUE É O FUNDEB
O
Fundeb substituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que vigorou de
1997 a 2006. O fundo atual está em vigor desde janeiro de 2007 e se
estenderá até 2020.
O portal do Ministério da Educação explica
que "o recurso financia todas as etapas da educação básica e reserva
recursos para os programas direcionados a jovens e adultos".
O
MEC ressalta que "a destinação dos investimentos é feita de acordo com o
número de alunos da educação básica, com base em dados do censo
escolar do ano anterior. O acompanhamento e o controle social sobre a
distribuição, a transferência e a aplicação dos recursos do programa
são feitos em escalas federal, estadual e municipal por conselhos
criados especificamente para esse fim".
(O Povo)