Embora o número de vagas ofertadas na Educação
Infantil de Fortaleza esteja em crescimento nos últimos anos, o déficit
de matrículas segue em proporção ainda maior. Levantamento do Centro de
Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca-CE) - com base no cadastro do
Registro Único da rede municipal - aponta que, até o momento, 5.692
crianças de um a três anos de idade permanecem sem vaga garantida para o
ano de 2019.
Nos últimos cinco anos, a demanda não atendida teve um salto de 192%,
ao passo que o número de vagas cresceu 50,4%. Em 2014, a rede
matriculou 14.329 crianças no Infantil I, II e III, e outras 2.643
ficaram sem esse acesso. Em 2018, por sua vez, o número de matrículas
chegou a 21.564, mas em agosto do mesmo ano, 7.725 crianças ainda não
haviam sido atendidas.
A incerteza quanto à garantia da primeira etapa da educação ronda,
neste ano, a dona de casa Tatiane Almeida, 27. Mãe de um menino de 11
meses, ela afirma ter feito a inscrição do filho na creche que atende ao
Parque Santa Maria, onde moram, ainda em 2018, recebendo a negativa no
mês passado. "Ele e todas as crianças de um ano foram prejudicadas
porque a sala apropriada para essa faixa etária não ia abrir. Foi uma
surpresa para mim".
A solução, segundo conta, é aguardar a construção e entrega de uma
nova creche no bairro, prevista somente para agosto, o que significa,
para ela, ficar sem trabalhar nesse período. "Não tenho com quem deixar
ele e por isso só quem trabalha é meu esposo. Mesmo em agosto eu não
posso procurar emprego porque ele ainda terá um período de adaptação",
relata.
A demanda reprimida de 2019 deve aumentar ainda mais ao longo do ano,
aponta a assessora técnica do Cedeca-CE, Marina Araújo. Segundo
destaca, o problema é um dos reflexos da precarização de investimentos
na Educação Infantil do Município. "O que a gente vem analisando é que o
orçamento público de Fortaleza não prioriza ações que têm como objetivo
a construção, ampliação e reforma de centros de Educação Infantil".
Segundo cita, a Ação Orçamentária 1133, que trata da construção,
reforma e ampliação dos centros educacionais, apresentou baixa execução
nos últimos anos, não chegando nem a 60% do total previsto. Dados do
Portal da Transparência de Fortaleza referentes a 2017, por exemplo,
apontam que dos mais de R$ 45 milhões previstos para o período, cerca de
R$ 23 milhões foram executados, ou seja, 51,6% do total.
"Mas quando a gente vai analisar a ação que diz respeito à
publicidade governamental, ela tem uma execução muito superior, chegando
a 97%. A Prefeitura não pode argumentar não possuir dinheiro. A
arrecadação aumentou nos últimos anos, ela tem uma situação fiscal
positiva dentre os municípios do Brasil", afirma Marina Araújo.
Esse conflito alocativo, na avaliação da assessora técnica do Cedeca,
reflete principalmente nas periferias, de onde saem as maiores queixas
sobre a precarização das unidades. "O Cedeca tem casos atendidos no
Parque Santa Maria, no Lagamar e a gente pode afirmar que essa
repercussão da demanda reprimida e a falta de manutenção e reformas são
muito verídicas", fala.
Ação
O cenário fez com que o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE),
por intermédio da promotora de Justiça de Defesa da Educação, Elisabeth
Almeida, protocolasse, na tarde de ontem, Ação Civil Pública contra a
Prefeitura de Fortaleza, solicitando a ampliação da oferta em 7.725
novas vagas em tempo integral. O cálculo teve como base o Registro Único
de 2018 - sistema no qual os pais cadastram as crianças para a obtenção
da vaga.
O secretário adjunto de Educação de Fortaleza, Jefferson Maia, aponta
a rede municipal dentre as que mais cresce no País, resultando
diretamente no aumento da procura e, como consequência, a
impossibilidade de atender toda a demanda de imediato. Segundo destaca, o
Registro Único chegou a ter 12 mil nomes registrados no fim do ano
passado, sendo atendidas 6 mil crianças até o momento.
"Desde 2014 a gente vem divulgando, estimulando a população a
procurar a Prefeitura para fazer o Registro Único, e, com o aumento da
Rede e da oferta, aumentou a qualidade e assim a população se sentiu
mais estimulada. Estamos hoje com mais de 50 mil matrículas realizadas,
só de 2017 pra 2018 aumentamos mais de 5 mil matrículas, mas isso gera
um aumento da credibilidade da população, que continua nos procurando",
afirma.
Em 2019, a rede cumprirá a meta de 6 mil novas vagas criadas, segundo
ressalta o gestor, atendendo a meta estabelecida no início de 2017, que
teve como base o Registro Único da época. Segundo acrescenta, mais 26
Centros de Educação Infantil (CEIs) estão previstos para a cidade até
2020, ampliando em mais 5 mil o número de vagas.
Ainda segundo o secretário adjunto, os custos com insumos, folha de
pagamento e construção de novos equipamentos superou R$ 160 milhões em
2018. "Isso faz de Fortaleza a capital com maior investimento na
Educação Infantil. E em 2019 a perspectiva é repetir o investimento,
haja vista que a gente continua entregando novos centros. A Prefeitura
usa de todos os seus esforços financeiros pra investir em equipamentos
construídos do zero para atender exclusivamente a Educação Infantil".
Sobre a ação do Ministério Público, Jefferson Maia afirma que a
Prefeitura não foi notificada até o momento.
(Diário do Nordeste)