Se por um lado as águas de março trouxeram alegria e alívio ao sertanejo
e conferiram um tom esverdeado à paisagem cinza do Sertão, por outro
causaram danos estruturais a diversas cidades, escolas e estradas do
interior cearense - e, além das perdas materiais, várias mortes foram
registradas no Estado desde o início da quadra chuvosa.
No dia 18 de março, o vaqueiro José Guilherme Pereira Souza, de 20
anos, foi arrastado ao tentar atravessar uma passagem molhada na
localidade de Sítio Fundão, no Município de Crato. A forte correnteza
movida pelas águas do Rio Granjeiro levou a vida de José Guilherme e do
cavalo em que estava montado ao realizar a travessia.
Tristeza
O mês terminou com outros óbitos na Região Norte. Nesse domingo (31),
um carro com cinco pessoas foi arrastado pelas fortes correntezas do
Rio Juré, na localidade de Mufumbal, em Reriutaba. Das vítimas, três
pessoas morreram afogadas: uma criança de dois anos, a avó dela, de 46
anos; e uma terceira vítima que tentou resgatá-las. O grupo também
tentava atravessar uma passagem molhada. Comuns no interior do Estado,
as passagens molhadas são geralmente construídas em locais em que o
curso do rio é intermitente, ou seja, cobre a pista apenas no período de
cheias.
"Vai ter momentos em que não será possível o tráfego de carros ou o
caminhar de pedestres. Por isso, para se construir uma passagem molhada
deve ser realizado um estudo hídrico", explica o engenheiro civil Angelo
Guerra, diretor geral do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas
(Dnocs).
Segundo o diretor da autarquia, uma passagem molhada serve para dar
curso a um local em que há escoamento de água. Ele ressalta: "o problema
não está na passagem molhada, mas no momento da travessia. Lógico que,
com uma chuva de mais de 200 milímetros, como a que aconteceu em
Reriutaba, o espelho d'água fica mais alto e se torna perigoso
atravessar no local".
Para segurança de quem atravessa esses locais, o Dnocs afirma que
toda construção de uma passagem molhada de um local deve ter no projeto a
implantação de balizas. Entretanto, com o tempo, essas estruturas caem
ou são deterioradas. Mais baratas que a construção de uma ponte, essas
edificações garantem o acesso dos distritos às sedes de municípios e são
construídas em pontos em que não há um fluxo frequente de água. "Tem
passagem molhada que vai fazer oito anos que não escorre água por baixo
dela, imagine você construir uma ponte num local desses", acrescenta o
diretor do Dnocs.
Por conter uma vazão menor de água e não obstruir um rio
completamente, elas não são consideradas uma barragem, portanto, não
seguem as mesmas regras destas construções maiores.
Estrutural
As barragens são outras estruturas que sofrem com as fortes chuvas.
Em Ubajara, no dia 18 de março, cerca de 250 famílias que moram próximo à
barragem do Açude Granjeiro tiveram que ser evacuadas, por risco de
rompimento. Também na Região Norte, uma chuva de 104 milímetros em
Itapipoca fez um açude transbordar.
A correnteza da água invadiu casas, ruas e até o quartel do Corpo de
Bombeiros. Várias famílias foram retiradas de suas residências. Medidas
preventivas foram feitas pelos técnicos da Companhia Cearense de Gestão
dos Recursos Hídricos (Cogerh) em mais quatro reservatórios que existem
na região.
O que tem em comum entre os dois casos é que ambos os açudes são
particulares, ou seja, são pontos cegos dentro da legislação da Agência
Nacional de Águas (ANA) e da Secretaria de Recursos Hídricos do Estado
do Ceará (SRH).A equipe do Sistema Verdes Mares, ao longo de março, fez
um levantamento de rodovias que apresentavam problemas devido às chuvas.
Durante todo o mês, leitores, telespectadores e internautas enviaram
vídeos de rodovias estaduais e federais que apresentavam problemas.
Pelo menos 20 CEs sofreram com as chuvas de março. São elas a CE-025,
040, 060, 085, 090, 138, 153, 163, 168, 176, 176, 253, 257, 265, 292,
282, 386 e 388.
Em nota, o Departamento Estadual de Rodovias (DER) diz que "realiza
conservação rotineira das estradas, com ações de recuperação funcional e
obras de restauração. Desde 2015, já foram restaurados 1.055
quilômetros de rodovia e outros 234 quilômetros estão em obras", afirma.
A nota finaliza ressaltando que "todos os trechos danificados estão
identificados e serão recuperados".
Federais
Trechos de rodovias federais que passam pelo Estado do Ceará também
apresentam má conservação. As BRs 020 (entre Canindé e Ipueiras; Canindé
e Madalena; Canindé até Boa Viagem; Fortaleza a Canindé; e Fortaleza a
Boa Viagem) a BR-122 (trecho que interliga Quixadá, Juazeiro via
Banabuiú), a 222 (quilômetro 11, em Caucaia) e a BR 403 (que liga Acaraú
a Cruz) são alguns exemplos.
Em resposta, a Superintendência Regional do Dnit no Estado do Ceará
informou que estava com problemas em todos os seus contratos de
manutenção. "Com a elevação dos preços de materiais betuminosos (aqueles
utilizados no asfalto) ocorrida em todo o País, diversas empresas
começaram a abandonar os contratos firmados com a Autarquia".
Sobre as BRs que foram citadas nesta matéria, o órgão pontuou que a
BR-122, 222 e 403 já estão com novos contratos assinados e ordem de
serviço emitida. Já a BR-020 teve licitação concluída e aguarda a
assinatura do contrato pela empresa vencedora.
Os buracos nas estradas são um risco para as pessoas que transitam
nelas. As Polícias Rodoviárias Federal e Estadual foram demandadas mas
não divulgaram dados de acidentes ocorridos devido à conservação das
vias.
Em nota, a PRF afirma que "faz a orientação dos condutores quando
solicitada por meio do telefone 191, em suas Unidades Operacionais ou
através das equipes de ronda. Também são prestados auxílios aos usuários
quando estão com o veículo em pane, principalmente, de pneus".
Nas estradas estaduais, a Polícia Militar do Ceará (PMCE) informa que
a orientação e prevenção de acidentes acontecem ininterruptamente nas
rodovias e são realizadas pelos policiais militares do Batalhão de
Polícia de Trânsito Urbano e Rodoviário Estadual (BPRE).
"Em razão da atual quadra chuvosa e das más condições de algumas
rodovias, essas orientações são intensificadas, como respeito ao limite
de velocidades; atenção para o devido funcionamento das palhetas dos
para-brisas e dos faróis e conservação dos pneus e freios", orientou o
BPRE.
(Diário do Nordeste)