Um problema recorrente no
interior do Ceará é o abate de animais de grande e de pequeno portes (bovinos,
suínos, ovinos e caprinos) de forma irregular, ou seja, sem a devida
fiscalização sanitária. No Estado, há 96 matadouros interditados e/ou
desativados. Outros 48 abatedouros municipais estão em atividade por meio de
gestão pública, nove foram concedidos à iniciativa privada, além de oito
particulares em funcionamento. Os dados são do Conselho Regional de Medicina
Veterinária (CRMV) do Ceará, que mostra preocupação com a existência de matança
clandestina (carne de moita) e a saúde da população.
Segundo o presidente do CRMV,
Célio Pires Garcia, a prioridade dos gestores municipais deve ser a saúde da
população. "Essa questão para ser enfrentada depende de decisão política,
de combate efetivo. Se houver fiscalização nos pontos de comercialização, a
carne só pode ser vendida com carimbo da inspeção sanitária".
O número de espaços interditados
é mais do que a metade dos municípios cearenses (52%). Muitos não apresentam
condições mínimas de funcionamento, como curral pavimentado, matança
humanitária com uso de pistola pneumática, presença de médico veterinário,
condução da carcaça por via área - a carne não pode ter contato com o piso -,
disponibilidade de água e adequado escoamento dos resíduos em questão.
"Quando não encontramos as
condições mínimas de funcionamento, solicitamos ao Ministério Público a
interdição da unidade", explicou Célio Pires. Outros órgãos, como a
Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) e a Agência de Defesa
Agropecuária do Ceará (Adagri) têm o poder de fechamento de abatedouros por
descumprimento de legislação do Ministério da Agricultura e Pecuária, de normas
ambientais e de sanidade animal.
Inviabilidade
O presidente da Associação dos
Municípios do Ceará (Aprece), Nilson Diniz, defende a regionalização dos
abatedouros e considera inviável economicamente o funcionamento de unidades em
pequenas e médias cidades. "Não há escala na quantidade reduzida de
matança, (os matadouros) tendem a fechar em pouco tempo", disse. "Já
cansei de falar isso, mas muitos gestores ainda estão com a cabeça há 20 anos
atrás e as exigências atuais são enormes".
Nilson Diniz defende a
transferência para a iniciativa privada dos abatedouros públicos. "Se não
houver renda, escala, o empresário não vai querer", observou. "Não
tem sentido um matadouro em uma pequena cidade". O Governo do Estado tem
evitado liberar recursos para a implantação em cidades menores, mas prefeitos
obtêm verba de emenda parlamentar federal e constrói, mas não mantêm.
O presidente do CRMV disse que a
entidade defende, há bastante tempo, a construção de abatedouros regionais.
"Essa é uma proposta antiga, mas vários prefeitos querem ter o ganho
político de ter a unidade em seu município", observou Pires Garcia.
Problemática
Na região Centro-Sul do Ceará, há
matadouros interditados nas cidades de Acopiara, Quixelô, Cariús, Cedro, Orós,
Lavras da Mangabeira e Várzea Alegre. Há esforço dos gestores municipais em
construir ou adequar unidades, mas esbarram em escassez de recurso,
dificuldades de gestão e obtenção de licenciamento de operação.
Em Acopiara, o matadouro foi
interditado em 2016 pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE).
"Existe uma unidade em construção, mas essa questão da falta de abatedouro
é um problema de saúde pública", observa o secretário de Agricultura do
município, Vicente Júnior. "Muitos animais são abatidos de forma
clandestina, em áreas rurais, sem inspeção".
Na cidade de Quixelô, está em
construção um matadouro novo, localizado após a Vila Antonico. "A obra
continua e deve ser concluída neste ano", disse o secretário de
Agricultura do município, Hélio Gomes de Araújo.
Alguns criadores levam os animais
para o abatedouro regional de Iguatu, mas a maioria dos abates é feita na
moita. "Esse é um problema que ainda acontece", pontuou Araújo. Nas
áreas rurais, a matança é feita sem o devido acompanhamento de médicos
veterinários e muitos desses animais, além de serem consumidos pelos moradores das
vilas e distritos, chegam aos pontos de venda nas cidades.
Na cidade de Várzea Alegre, a
Prefeitura vem tentando há algum tempo colocar o novo matadouro para funcionar
a partir da readequação do imóvel e obtenção de licença por parte da Semace. Já
houve licitação para compra de equipamentos. Uma vez por semana, 60 animais são
levados para serem abatidos no abatedouro de Juazeiro do Norte. A Prefeitura
participa da logística de transporte.
No Sul do Estado, a região
conhecida como Cariri Oeste também sofre com as interdições, como em Araripe.
Segundo o secretário de Agricultura do Município, José de Alencar Costa, já foi
feita uma vistoria no equipamento, mas a gestão não tem a verba necessária para
a reforma. Uma opção é fazer o abate dos animais em Nova Olinda, a cerca de 63
quilômetros, o que acaba encarecendo o preço da carne fresca.
Em Granjeiro, também no Cariri, a
unidade de abate está interditada há oito anos. Lá, além de situações
irregulares detectadas pela Semace, houve um avanço da área urbana onde está
localizado o equipamento, que antes pertencia a zona rural.
Barbalha e Quixadá
A situação mais curiosa, no
Cariri, é a de Barbalha. Inaugurado em 2014, o prédio foi interditado em 2016
pela Semace, e a Prefeitura foi multada em R$ 200 mil por não ter os
licenciamentos, alvará e, também, pelos dejetos estarem sendo jogados ao ar
livre. Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi feito entre a gestão
municipal e o MPCE, mas não foi cumprido. Apesar de ser um prédio novo, o
projeto arquitetônico não observou diversas normas técnicas como a própria
entrada do abatedouro, que deveria ser feita na parte de trás, e foi feita na
frente. Além disso, não há câmaras frias e os currais não estão calçados, entre
outros problemas. "É melhor derrubar tudo", resume o secretário de
Agricultura e Meio Ambiente do Município, Bosco Vidal.
Já em Quixadá, o matadouro
público da cidade continua fechado. Quem necessita realizar o abate precisa
recorrer ao abatedouro da cidade vizinha, Quixeramobim. A distância é de 100 Km
e acaba encarecendo o preço do serviço de abate. O secretário municipal de Desenvolvimento
Urbano e Meio Ambiente, Higo Carlos Cavalcante, informou que o matadouro ainda
não está funcionando porque a Prefeitura aguarda liberação da Justiça. O pedido
de suspensão da interdição foi encaminhado no ano passado, mas o deferimento
ainda não foi expedido. O prédio de abate foi interditado pela Adagri e Semace
em agosto de 2016, por conta das condições precárias de funcionamento .