O papa Francisco
determinou mudanças nas leis da Igreja Católica nesta quinta-feira (9),
que tornam obrigatório a bispos e padres reportarem suspeitas de abusos
sexuais e permite a qualquer pessoa enviar denúncias diretamente ao
Vaticano.
Caso os bispos não reportem os casos de abuso, poderão ser considerados corresponsáveis pelo crime que ocultaram.
Todas as dioceses do mundo deverão implementar dentro de um ano um
sistema acessível ao público para apresentar relatórios sobre as
denúncias de potenciais casos de abusos sexuais, que serão examinados em
um prazo de 90 dias.
Até o presente momento, os clérigos e religiosos denunciavam os casos
de violência de acordo com sua consciência pessoal. A novidade do texto
é que o papa torna juridicamente vinculativo em toda a Igreja a
denúncia de abusos sexuais "no menor tempo possível" por padres e
religiosos. Os leigos que trabalham para a Igreja também são encorajados
a denunciar casos de abuso e assédio.
Quando as suspeitas estiverem relacionadas a pessoas em posição
hierárquica, incluindo cardeais, patriarcas e bispos, a notificação pode
ser enviada diretamente para a Santa Sé ou a um arcebispo
metropolitano.
A legislação da Igreja ainda não conta com uma obrigação de comunicar
esses crimes às autoridades judiciais do país, a menos que as leis do
país façam disso uma obrigação. Na Itália, por exemplo, o clero não tem
obrigação legal de denunciar os casos de abuso sexual à justiça.
O pontífice desejou, no entanto, que o segredo da confissão continue
absoluto, o que exclui, portanto, uma denúncia de fatos reportados por
um fiel no confessionário.
O texto condena toda violência sexual, dando ênfase aos crimes
cometidos contra crianças e pessoas vulneráveis. Inclui, portanto, os
casos de violência contra religiosas por seus superiores, ou assédio de
seminaristas e noviças.
O decreto ressalta ainda que é proibido produzir, exibir, armazenar e distribuir "material de pornografia infantil".
A hierarquia da Igreja também está proibida de conduzir "ações ou
omissões tendentes a interferir ou contornar as investigações civis ou
as investigações canônicas, administrativas ou criminais, contra um
clérigo ou um religioso", especifica a carta.
As regras também definem que bispos com conflitos de interesse devem
se afastar das investigações e que eles podem ser punidos por casos de
abuso de poder em relações sexuais com adultos.
Essas decisões foram tomadas em um "motu proprio", ou seja, uma carta
emitida diretamente pelo papa, que modifica a legislação interna da
Igreja (o direito canônico).
Na introdução desta carta apostólica intitulada "Vos estis lux mundi"
(Vós sois a luz do mundo), o papa Francisco ressalta que os "crimes de
abuso sexual ofendem Nosso Senhor, causam danos físicos, psicológicos e
espirituais às vítimas e lesam a comunidade dos fiéis".
"Por isso, é bom que se adotem, a nível universal, procedimentos
tendentes a prevenir e contrastar estes crimes que traem a confiança dos
fiéis", aponta o pontífice.
O motu proprio, que também detalha as regras do processo de
investigação, também não modifica as sanções já previstas pela lei
canônica.
Francisco pediu em fevereiro medidas "concretas e eficazes" no início
de uma cúpula sem precedentes no Vaticano para lutar contra os crimes
sexuais contra menores cometidos por membros do clero em resposta às
vítimas.
(Folha de São Paulo)