A taxa de mortalidade infantil no Ceará em 2018 foi de 11 óbitos a cada
1.000 nascidos vivos. Índices disponibilizados pela Secretaria Estadual
da Saúde (Sesa) revelam que, nos últimos cinco anos, esse índice segue
estável. Mas apesar de a proporção das mortes estar dentro do que a
Organização Mundial da Saúde (OMS) chama de "aceitável", o cenário é de
preocupação.
Em números absolutos, foram 1.470 mortes de bebês com até 1 ano de
idade no ano passado. Desses, 1.039 morreram até o 28º dia de vida, o
chamado óbito neonatal. A situação é de alerta, e as precariedades nas
maternidades, sobretudo no interior do estado, são fatores que
influenciam na quantidade de registros.
As mortes, avaliam profissionais da saúde, são consequências de um
conjunto de falhas em, pelo menos, três dimensões de assistência:
pré-natal, hora do parto e cuidados ao recém-nascido. A taxa de
mortalidade infantil considera os óbitos que vão da hora do nascimento
até 1 ano. Dentro deste grupo, explica a obstetra e presidente da
Sociedade Cearense de Ginecologia e Obstetrícia, Liduína Rocha, há o
óbito neonatal - que vai do nascimento até o 28º dia de vida, e o
pós-neonatal, do 28º dia de vida até 1 ano.
Liduína também coordena o programa Nascer no Ceará, do Governo do
Estado, lançado em 2018, na tentativa de melhorar a rede de atendimento
materno infantil no estado. De acordo com ela, metade das mortes de
bebês no estado são óbitos neonatais precoces, que vão do primeiro dia
de vida ao 7º dia. Levando em consideração esta estimativa, em 2018,
cerca de 750 crianças morreram no Ceará nos primeiros 7 dias de vida.
No que diz respeito ao pré-natal, a obstetra relata que hoje, de modo
geral, o Ceará tem quantidade adequada de pré-natal, mas falta
qualidade. "O Comitê de Prevenção à Mortalidade Materno Infantil e Fetal
do Estado anualmente vem sendo alimentado por um instrumento que são os
comitês macrorregionais. Eles tentam investigar os óbitos que
aconteceram na semana anterior. No ano de 2018, mais ou menos 93% dos
óbitos infantis eram evitáveis. Um terço deles eram evitáveis por alguma
ação no pré-natal que não foi feito adequadamente. Eram crianças que
deveriam ter tido uma intervenção mais precoce, criança que tinha
sífilis e não tratou", explica a obstetra.
Qualidade das maternidades
No que diz respeito à situação das maternidades, Liduína avalia que
esse é um dos grandes gargalos. A proposta do Nascer no Ceará, conta
ela, foi mapear a rede de assistência. O diagnóstico constatou que
diversas maternidades do estado não garantem assistência adequada.
Diante disso, um dos planos é redimensionar a rede de maternidades e,
aquelas unidades que fazem menos de 300 partos ao ano, devem ser
repensadas.
Isto porque, esclarece a médica, nessas maternidades os profissionais
"não estão habituados a conduzir assistência ao parto, a maioria desses
profissionais não tem intimidade com a obstetrícia. São médicos
generalistas, recém-formados, e esses profissionais precisam ter um
treinamento de educação continuada e eles precisam entender os fluxos e
protocolos", diz.
"Temos maternidade no interior do estado que em um ano houve três
partos, dez partos. Certamente quem está lá não está acostumado a
acompanhar os partos. O Sertão Central e Litoral Leste não têm
referência da atenção terciária. Tem várias maternidade nessa condição
de pouquíssimos partos e são duas regiões que o estado quer olhar”.
Para garantir a assistência obstétrica adequada, as equipes devem ter,
pelo menos: médico obstetra, enfermeiro obstetra, técnico de enfermagem,
médico neonatologista, anestesiologista e enfermeiro neonatologista.
Isto, sobretudo em regiões como Sertão Central e Litoral Leste no Ceará,
conforme a enfermeira e coordenadora do Cuidado Materno-Infantil da
Sesa, Silvana Napoleão, ainda é uma realidade a ser alcançada.
Outro fator relevante destacado pelas profissionais da assistência
materno-infantil é que, embora o parto vaginal seja considerado mais
seguro que a cesárea, é preciso sempre reforçar as condições de
realização do parto pois a assistência adequada no momento de parir
interfere na segurança do nascimento do bebê.
No Ceará, o parto cesariano, embora seja considerado menos seguro, é
realizado com mais frequência. Segundo dados do Departamento de
Informática do Sistema Único de Saúde (DataSus), até abril deste ano,
17.048 cesarianas foram feitas no estado, contrastando com 15.664 partos
vaginais. Já em 2018 foram 49.942 vaginais e 53.265 cesarianos.
A coordenadora de Políticas e Atenção à Saúde da Sesa, Magda Almeida,
reitera as percepções das profissionais técnicas do Nascer no Ceará e
reforça as preocupações com os "ambientes inseguros de saúde". De acordo
com ela, as unidades do Ceará carecem de qualificação adequada para
realizarem partos vaginais.
"Falta uma maior formação da equipe de médicos e enfermeiros
obstétricos que possam identificar sinais de alarme na gestação",
pondera. No interior, reforça Magda, com equipes reduzidas e
maternidades que não realizam tantos partos quanto a capital, mães e
bebês estão mais propícias a serem vítimas do despreparo profissional.
(G1/CE)