Um estudo, publicado esta semana na revista científica Nature Medicin,
relatou dois casos de bebês que nasceram com microcefalia associada à
exposição das mães ao vírus Zika durante a gravidez e que apresentaram
desenvolvimento normal do cérebro após o parto.
Com 28 autores, a pesquisa, desenvolvida em parceria do Instituto
Fernandes Figueira, da Fundação Oswaldo Cruz (IFF/Fiocruz) com a
Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, foi publicada em forma
de artigo com o título “Neurodesenvolvimento infantil tardio e
alterações neurossensoriais no segundo ano de vida em um grupo de
crianças expostas ao Zika vírus”, em tradução livre do inglês.
Uma das autoras do estudo, a pediatra Maria Elizabeth Moreira,
pesquisadora do IFF/Fiocruz, explica que foram acompanhadas 216 mulheres
grávidas que apresentaram os sintomas do vírus Zika em 2016, quando o
Rio de Janeiro teve surto da doença.
“As crianças são acompanhadas desde a exposição da mãe ao Zika, mães
que tiveram os sintomas de rash cutânea, febre. Elas fizeram o exame
PCR, que detecta a patologia na fase adulta da doença. Aí, desde a
gravidez, essas mães foram sendo seguidas, passando pelo nascimento dos
bebês e pelo desenvolvimento dos bebês até o terceiro ano de vida, que
eles estão chegando agora”.
Pesquisa
De acordo com a pesquisadora, a microcefalia associada ao Zika
resulta da destruição do parênquima cerebral, ou seja, da massa
encefálica. “Por isso que a tábua óssea, que define o tamanho do
perímetro cefálico, colapsa e a cabeça fica pequena”, explica. Entre as
216 mães que entraram no grupo do estudo, oito tiveram filhos com
microcefalia.
Segundo Elizabeth Moreira, os dois bebês que apresentaram recuperação
após o nascimento não tinham a destruição do parênquima cerebral, ou
seja, eram casos menos graves da doença, filhos de mães que tiveram Zika
no final da gravidez.
“Um dos bebês era todo pequeno, tinha perímetro cefálico, peso e
comprimento pequenos, porque havia uma insuficiência placentária e o
bebê tinha uma restrição de crescimento intra-útero. Quando o bebê nasce
e começa a receber nutrientes e estimulação adequadas, o perímetro
cefálico volta a crescer, porque ele não tinha a destruição do
parênquima, ele só tinha a cabeça pequenininha e era todo pequenininho”,
disse.
O segundo bebê nasceu com a moleira fechada, patologia conhecida como
craniosinostose, mas com o cérebro normal. “A gente sabe que o cérebro
da criança cresce até mais ou menos os 3 anos de vida, por isso que a
moleira nasce aberta. Se ela fecha antes do tempo, vai impedir o
crescimento do cérebro embaixo. Então esse tem que passar por uma
cirurgia para liberar o crescimento do cérebro e foi o que aconteceu. O
bebê fez a cirurgia, abriu a tábua óssea e o cérebro, que estava normal
embaixo voltou a crescer normalmente”, explica Elizabeth Moreira.
A pesquisa também mostrou que em 31,5% dos casos (68 crianças)
tiveram efeitos negativos no desenvolvimento neurológico entre 7 e 32
meses de idade. Exceto as afetadas por alterações de parênquima
cerebral, de 49 crianças com anormalidades logo após o nascimento, 24
delas, ou 49%, tiveram avaliações normais no segundo e terceiro anos de
vida. Complicações em exames oculares foram detectados em nove de 137
crianças que fizeram o teste e dificuldades auditivas ocorreram em 13 de
114 crianças avaliadas.
Acompanhamento
De acordo com a pesquisadora, o resultado do estudo mostra a
importância de fazer o acompanhamento neurológico precoce de todos os
bebês, mesmo os que não apresentam microcefalia.
“A grande questão que esse estudo traz é que os bebês sem
microcefalia também podem apresentar atraso no desenvolvimento, 30%
deles podem apresentar isso. E o diagnóstico tem que ser feito a tempo
de você poder fazer algum tipo de estimulação precoce para minimizar os
problemas relacionados a atraso no desenvolvimento. Então esses bebês
precisam ser seguidos periodicamente, com testes de desenvolvimento,
para que você possa encaminhar precocemente à estimulação”, disse.
O IFF/Fiocruz acompanha, atualmente, um total de 87 crianças com
microcefalia associada a problemas como toxoplasmose, citomegalovírus e
questões genéticas, além do vírus Zika.
(Agência Brasil)