As misteriosas manchas escuras e oleosas que vêm
se alastrando pelo litoral do Nordeste acenderam um alerta em órgãos e
associações de proteção ambiental. No Ceará, a substância foi flagrada
em pelo menos dez praias, com relatos de difícil remoção após contato
com outras superfícies. Por isso, biólogos estão apreensivos quanto à
próxima temporada de desova de tartarugas no Estado, que deve começar já
no mês de outubro.
"Se a mancha chega na praia, na areia, e a desova começa a acontecer
com essa substância presente, ela pode passar para os ovos. Nos
primeiros dias, eles respiram o oxigênio de fora pra dentro, então pode
ser que algum tipo de composto volátil entre e os contamine de alguma
forma", explica Alice Frota, uma das coordenadoras do Grupo de Estudos e
Articulações Sobre Tartarugas Marinhas (GTAR), do Instituto Verdeluz.
Segundo ela, o problema vai além porque os ovos também são fonte de
alimento para outros animais silvestres. "É toda uma cadeia de
problemas". A temporada de desova em Fortaleza, por exemplo, costuma
seguir até junho. "Começamos a registrar os primeiros ninhos em
dezembro, quando os ovos começam a eclodir" - em média, de 55 a 60 dias
após a desova. Até agora, foram registrados nascimentos de
tartarugas-de-pente, embora a Capital também seja área de alimentação e
passagem para as espécies oliva, verde e cabeçuda.
Além dos animais que estão para nascer, os vivos também são afetados.
Desde o início de setembro, o GTAR somou cinco tartarugas 'oleadas' na
orla duas em Fortaleza (Sabiaguaba e Serviluz) e outras em Flecheiras,
Taíba e Jericoacoara. Quatro estavam mortas. Outra foi limpa e devolvida
ao mar por moradores. Um erro, conforme a bióloga.
"Quando ela chega na praia, é porque já está tão debilitada que não
consegue mais nem respirar no mar. Todas estavam no mesmo estado:
caquéticas, desnutridas, extremamente cansadas. A gente recomenda que
não se jogue de volta no mar porque ela volta ao ambiente de onde estava
fugindo", esclarece.
Por isso, uma rede foi montada para acolher os animais exclusivamente
afetados pelo óleo, após reunião na Secretaria Estadual do Meio
Ambiente (Sema), na manhã dessa quarta (25). A ONG Aquasis, que possui
estrutura para atendimento, limpeza e estabilização de animais marinhos e
aves, poderá se deslocar às praias do Litoral Leste. Para Fortaleza,
Região Metropolitana e Litoral Oeste, contará com apoio logístico da
Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace).
Um helicóptero e dois drones da autarquia estadual também serão
utilizados para examinar a extensão das manchas oleosas nos 20
municípios que integram o litoral cearense, ainda nesta semana. "O
helicóptero será utilizado para identificar se há dispersão no mar",
explica Carlos Alberto Mendes, superintendente da Semace.
Tempo
O chefe da Divisão Técnico-Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Ceará, Miller
Holanda, pondera que o levantamento visual poderá estimar mais
precisamente quantos dias o problema ainda pode perdurar. "Por enquanto,
não dá para prever. O certo é que vamos ficar em alerta enquanto tiver
isso chegando às praias", ressalta.
Segundo ele, também não é possível indicar a quantas cidades a mancha
já chegou. "Não existe uma centralização das ocorrências. Para evitar
desencontro de informações, vamos visitar todos os municípios do
litoral", afirma. Entre as orientações, está a guarda da substância em
tanques metálicos, sem vazamentos para o solo, e a incineração dela em
fornos de cimento. "Os municípios que não foram afetados serão
prevenidos do que pode acontecer", diz o técnico.
Nos próximos dias, também será realizada a coleta da água do mar e do
solo das praias dos 20 municípios. As substâncias serão analisadas por
laboratórios do Núcleo de Tecnologia Industrial do Ceará (Nutec) e da
Universidade de Fortaleza (Unifor). Os laudos devem ser encaminhados ao
Ibama para as investigações.
De acordo com o secretário estadual do Meio Ambiente, Artur Bruno,
também foi firmada uma parceria com o Instituto Verdeluz para a
capacitação de agentes dos Batalhões de Polícia Militar Ambiental (BPMA)
e de Turismo (BPTur) para o manejo correto das espécies afetadas.
Em caso de achado de animais cobertos por óleo, pode-se acionar
resgate da ONG Aquasis pelo número (85) 99800-0109. Para ocorrências de
tartarugas marinhas, o GTAR pode ser contatado pelo número (85)
98597-3007.
(Diário do Nordeste)



