Um tempão
atrás, sei lá, há quase 10 anos, eu escrevi sobre a primeira
identificação de um gás na atmosfera de um exoplaneta. Era uma detecção
de hélio na atmosfera de um Júpiter quente, se não me engano, bem no
limiar do instrumento. A detecção era marginal, o planeta em questão era
um planeta bem maior e mais quente que Júpiter, quase uma estrela, e o
mais empolgante nem foi o resultado, mas sim a detecção em si.
As dificuldades técnicas em se conseguir identificar as espécies
químicas na atmosfera de um exoplaneta através de seu espectro são muito
grandes. Além da estabilidade do instrumento, há que se considerar que
não é possível apontar para o planeta apenas. Da distância em que
estamos, toda a luz refletida pelo sistema de planetas, cometas,
asteroides e tudo o que houver em torno da estrela vai vir junto com a
luz da estrela, que é muito mais intensa. Desde a época desta primeira
detecção, astrônomos do mundo inteiro desenvolveram técnicas para
“filtrar” a luz da estrela e ficar com o que interessa. No caso, a luz
do exoplaneta.
E assim foi feito com o exoplaneta K2-18 b, descoberto em 2015 pelo
telescópio Kepler. Ele foi identificado como uma ‘super-Terra’, ou seja,
um planeta com massa de até 10 vezes a massa da Terra. Mais do que
isso, um exoplaneta entra na categoria de ‘mini-Netuno’, um planeta até
rochoso, mas com uma grossa camada de nuvens. No caso de K2-18 b, sua
massa deve ficar em torno das 8 vezes a massa da Terra, com um raio um
pouco maior que o dobro do raio do nosso planeta. Além de super-Terra,
isso o faz um planeta rochoso.
Outra coisa
interessante dessa super-Terra é que ela está na zona habitável da sua
estrela, uma anã vermelha menor e mais fria que o Sol. A zona habitável é
aquela região ao redor de uma estrela em que a radiação incidente é
suficiente para manter a água no estado líquido, ou seja, mais que 0
graus Celsius e menos do que 100 graus. Isso não significa, a priori,
que haja água no estado líquido em K2-18 b. Além da radiação incidente, é
preciso ter outras condições favoráveis, como a existência de uma
atmosfera que não seja muito densa, ou muito rarefeita. Veja o caso do
Sistema Solar: Vênus, Terra e Marte estão na zona habitável do Sol, mas
só a Terra possui oceanos.
Para estudar K2-18 b, uma equipe de astrônomos liderada por Angelos
Tsiaras, da Universidade College London, baixou um conjunto de dados
públicos do Hubble. Sim, isso mesmo, os dados estavam à disposição de
quem quisesse pega-los, depois que foi cumprido o prazo de exclusividade
da pessoa que fez as observações. Com o Hubble, a estabilidade do
instrumento estava garantida, restou ao grupo “apenas” trabalhar na
filtragem da luz do exoplaneta. Na verdade, o termo mais correto é
subtração da "luz da estrela" da "luz total" registrada.
Depois disso, o grupo de Tsiaras rodou diversos modelos de
transmissão/reflexão de luz por diversos tipos de atmosferas. Em outras
palavras, os programas simulavam a capacidade de absorção de atmosferas
com diferentes composições químicas, incluindo até mesmo nuvens e os
modelos que mais se aproximam dos dados observados são os que incluem
vapor d’água!
Dentre os resultados, não é possível excluir a presença de hidrogênio e
hélio, que deve estar presente em um planeta com tanta massa. Modelos
com nitrogênio (como nossa atmosfera), ou com nuvens também descrevem
bem os dados obtidos pelo Hubble e não dá para descartar nenhum dos dois
cenários. Mas o que se sabe é que sem vapor d’água nenhum modelo se
encaixa direito, ou seja, é sim muito provável que haja vapor d’água na
atmosfera dessa super-Terra.
(G1)