O papa Francisco fez oficialmente, ontem, de Irmã Dulce, a Santa Dulce dos Pobres, a 37ª personalidade brasileira canonizada pela Igreja Católica. Ela é a primeira mulher nascida no País a se tornar santa.
Eram 10h34min na Cidade do Vaticano (5h34min no horário de Brasília). A
cerimônia, realizada na Praça São Pedro e marcada por muita emoção,
reuniu, segundo a guarda local, cerca de 50 mil pessoas e fez outros
quatro novos santos: um teólogo inglês, uma freira italiana, uma freira
indiana e uma catequista suíça.
“Em honra da Santíssima Trindade, pela exaltação da fé católica e
para incremento da vida cristã, com a autoridade de Nosso Senhor Jesus
Cristo, dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, e Nossa, depois de refletir
por muito tempo, ter invocado a ajuda divina e ouvido a opinião de
irmãos bispos, declaramos e definimos santos os beatos John Henry
Newman, Giuseppina Vannini, Maria Thresia Chiramel Mankidiyan, Dulce
Lopes Pontes (Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes) e Marguerite Bays,
e os inscrevemos no registro dos santos, estabelecendo que, em toda a
Igreja, eles sejam devotamente honrados entre os santos”, afirmou o
papa, no momento solene.
Foi visível o número de brasileiros entre os fiéis. Bandeiras do País
e trajes verde e amarelo podiam ser notados em todas as partes da
praça. Em um dos momentos mais emocionantes da cerimônia, foi exibida
uma relíquia de Irmã Dulce: um pedaço de osso de sua costela, impregnado
em uma pedra de ametista.
Na homilia, o papa destacou o fato de que dos cinco novos santos,
três eram freiras. “Invocamos como intercessores”, referiu-se aos novos
santos. “Mostram-no que a vida religiosa é um caminho de amor nas
periferias existenciais do mundo”.
Milagres
O músico José Maurício, considerado curado milagrosamente por graça de Santa Dulce, estava presente. A recuperação de sua cegueira foi citada como o milagre decisivo para a canonização da religiosa.
Já o primeiro milagre de Irmã Dulce ocorreu em 2001, quando a
sergipana Claudia Santos, hoje com 50 anos, enfrentava uma grave
hemorragia após o parto do segundo filho e chegou a ficar em coma, com
insuficiência renal. Após a equipe médica usar todos os recursos que
poderia, a recomendação foi que se preparassem para a morte.
“Estou aqui desde as 20 horas de ontem. Eu não poderia deixar de vir.
A emoção é muito grande de relembrar tudo aquilo que passou, hoje a
minha fé é muito maior”, afirmou. “Depois do que passei, vi que nós
realmente não somos nada”.
Claudia começou a melhorar de forma milagrosa com a visita do padre José Almir de Menezes, devoto de Dulce. Ela compareceu ao Santuário Irmã Dulce, em Salvador, usando como pingente a santinha que recebeu dele.
O milagre foi oficializado pelo Vaticano em 2011, dez anos depois da
recuperação de Claudia Santos. “Foi uma bênção de Deus, agradeço
primeiramente a Deus e pela intercessão de Irmã Dulce. Não era nem para
eu estar aqui, ela é minha santinha”, afirmou.
A comitiva de autoridades brasileiras foi acomodada à esquerda do
altar, em espaço reservado para convidados não religiosos. O
vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB); os presidentes do Senado, Davi
Alcolumbre (DEM-AP); da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ); o
governador da Bahia, Rui Costa (PT); e o prefeito de Salvador, ACM Neto
(DEM), estavam no local.
Além dos políticos brasileiros, participaram da cerimônia o
presidente da Itália, Sergio Mattarella, o príncipe Charles, do Reino
Unido. Autoridades da Índia, da China, da Irlanda e da Suíça também
estiveram presentes.
Cearenses na canonização
O tempo quente nos arredores da Praça São Pedro, em Roma, é algo
comum para as centenas de brasileiros vestindo blusas com o rosto de
Irmã Dulce, agora Santa Dulce dos Pobres, presentes na cerimônia de
canonização. “Era um sol para cada um”, recitou Waldonys, que teve a
oportunidade de cantar para os devotos. Nunca imaginei tocar na
cerimônia de canonização de uma santa, a primeira santa brasileira. A
praça São Pedro lotada e poder executar o hino oficial de Irmã Dulce.
Ainda estou me beliscando”, conta.
O sanfonista destaca, inclusive, duas semelhança com a santa: além de
nordestina, Irmã Dulce também era sanfoneira. Junto à cantora baiana
Margareth Menezes, ele entoou os versos de Doce Luz antes da Missa de
canonização. “A letra é tão ela que não fala o nome, porque seria
redundância”, resume Waldonys.
Natural de Fortaleza e missionário da Comunidade Católica Shalom em
Roma, Vitor Carvalho lembra da canção, entoada não apenas por Waldonys e
Margareth, mas por todos os brasileiros presentes. A participação
entusiasta dos brasileiros ocorreu não só durante a canção, mas durante
toda a Missa. “Em especial no momento em que o papa declara santas
aquelas pessoas. Você olhava no rosto das pessoas e sentia a alegria que
só uma vida de santidade pode dar. Foi uma verdadeira experiência de
união da terra com o Céu”, emociona-se.
O trabalho social realizado por Irmã Dulce é inspiração do deputado
Eduardo Bismarck (PDT), na vida pública. “Enquanto político, a esperança
que eu tenho que a gente possa olhar para os mais pobres como ela
olhou. É nossa obrigação ter esse olhar”.
Em Fortaleza, os fiéis estavam de pé logo cedo, às 5 horas. Na Capela
São Francisco, no Bairro de Fátima, os religiosos acompanharam o ritual
de canonização em uma televisão. “Não é fácil falar de uma pessoa como a
Irmã Dulce. Ela se doou de corpo e alma, de fé e caridade. Ela na terra
já era uma santa”, declara Franci Campos, decoradora da Capela.
(Diário do Nordeste)