Sonhar para o futuro em liberdade. O lema ecoado pelas paredes da
Unidade Prisional Sobreira Amorim, em Itaitinga, é dito por cerca de 350
internos que, por quatro horas diárias, transformam-se em alunos de
Alfabetização, Ensino Fundamental e Médio. O número chega a 3.450 pessoas privadas de liberdade
estudando em presídios no Ceará, distribuídos pela Região Metropolitana
de Fortaleza (RMF) e mais oito municípios do interior do Estado. No ano
passado, segundo a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP),
eram 1.693 estudantes.
A Pasta afirma que 20 Unidades Prisionais são atendidas, abrigando 2.390 detentos estudando em Fortaleza e RMF, além de 1.060 em cidades no interior do Ceará.
Uma dessas histórias é a de Kelton Soares, de 19 anos. No presídio,
ele cursa o Ensino Fundamental 1 para, quando alcançar a liberdade,
tentar voltar para o mercado de trabalho. Preso há um ano e um mês, o
cearense conta que está há três meses se dedicando aos estudos. A
experiência com as aulas tem sido transformadora. "Estar na sala de aula
conforta, né? Deixa tranquilo. A professora ensina a gente e melhora
muito nossa escrita e a leitura. É uma oportunidade que não tive lá
fora", confessa o jovem.
Entre as matérias preferidas de Kelton está Matemática. Os números
encantam, mas os planos de uma vida fora das grades, com um retorno ao
mercado de trabalho é seu impulso. Ele nem arrisca qual profissão vai
seguir. Como tem experiência em metalúrgica, reage com felicidade ao
perguntar se a profissão envolve sua disciplina preferida e ver a
resposta assertiva da professora. Para ele, sonho mesmo é ver o filho
Kevin, de apenas dois anos, se tornar um médico.
O coordenador escolar de educação em prisões da Secretaria da
Educação do Ceará (Seduc), Emanuel Barreto, discorre sobre a importância
do ensino para os presidiários, classificando as aulas como
oportunidade que eles não tiveram fora da prisão. "A educação, por si
só, tem um viés transformador. É o que a gente tenta explorar aqui nos
presídios. Os alunos se interessam, querem estar na aula".
Esforço dos alunos
Dedicação não falta para os alunos do presídio Sobreira Amorim. É o
que garante a professora Eliane Souza, de 46 anos. Ela ensina para a
população penitenciária desde julho deste ano e afirma que se
surpreendeu com o interesse dos estudantes. "Sou mais feliz dando aula
aqui. Eles são mais dedicados que os alunos lá de fora. Os outros
precisam 'do pai ficar puxando a orelha', aqui não, eles vêm porque
enxergam a oportunidade", conta a educadora.
Eliane reforça, ainda, que não teve medo de assumir as turmas no
presídio quando a oportunidade apareceu. Segundo ela, uma prima já
trabalhava no local e a tranquilizou quanto à experiência. "Eles
(detentos) me perguntam muito 'professora, a senhora tem medo da
gente?', eu digo que não, nunca tive. Eles estão aqui querendo
aprender".
A dedicação dos presidiários é recompensada. Segundo Rodrigo Moraes, coordenador educacional da SAP, a cada 12 horas de aula, os presos têm um dia de remissão de pena.
Rodrigo completa, ainda, dizendo que a seleção dos detentos é feita por
critérios de disciplina e de bom comportamento. "O interesse dos
internos é grande, praticamente todos têm interesse no projeto
educacional".
(Diário do Nordeste)