Impossibilitada anteriormente por
questões ambientais, a mina de urânio e fosfato de Itataia, em Santa Quitéria,
já tem novos planos para o início das operações de extração. Com um
investimento de US$ 350 milhões, o potencial do novo empreendimento já começa a
ser comparado com o impacto gerado pela Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP),
considerando a atividade econômica da região. Contudo, a viabilidade
socioambiental do empreendimento é questionada por conta dos riscos ambientais
do negócio.
"Santa Quitéria pode ser uma
nova CSP", assegura Ricardo Cavalcante, presidente da Federação das
Indústrias do Estado do Ceará (Fiec). O projeto de exploração da jazida em
Itataia foi elaborado, inicialmente, em 2009, pelo Consórcio Santa Quitéria. A
parceria é formada pela Galvani (empresa privada) e pela estatal Indústrias
Nucleares do Brasil (INB). Contudo, o negócio acabou sendo deixado de lado após
as empresas não conseguirem uma licença ambiental para a exploração da jazida,
o que deverá mudar a partir deste ano.
No dia 10 de setembro, o ministro
de Minas e Energia (MME), Bento Albuquerque disse que a atividade de mineração
de urânio, que estava "sendo barrada" pelo Instituto do Meio Ambiente
e Recursos Renováveis (Ibama), deverá ser retomada no País. Com a nova
perspectiva, o consórcio já trabalha para fazer as adequações necessárias e
entrar com um novo requerimento de licença e, a partir daí, iniciar as
operações até 2025. A informação foi confirmada pela INB, em entrevista
exclusiva ao Sistema Verdes Mares.
Investimento
Segundo a estatal, o investimento
no projeto será feito integralmente pela Galvani e será de US$ 350 milhões. A
perspectiva é que a produção anual de fosfato (usado na produção de
fertilizantes) seja de 900 mil toneladas por ano (t/a), enquanto a de
concentrado de urânio seja de 1.600 t/a. Além disso, o empreendimento deverá
gerar, de acordo com a INB, cerca 1.000 vagas de trabalho durante a fase de
implantação e 1.500 na operação.
"O Projeto Santa Quitéria é
baseado em uma rocha fosfática com urânio associado. O produto principal será o
fosfato que ficará com a Galvani e será utilizado para fabricação de
fertilizantes e ração animal; e o coproduto (urânio) será o concentrado de
urânio, que será entregue à INB para ser utilizado na fabricação do combustível
nuclear para geração de energia elétrica", explicou a INB em nota. O
empreendimento ainda deverá, segundo a estatal, aumentar em 10% a produção de
fosfato do País.
Impacto econômico
Para o geólogo e mestre em
geologia econômica Carlos Rubens, pelo nível de desenvolvimento da região de
Santa Quitéria, a mina deverá causar um impacto maior que a CSP, considerando
as devidas proporções.
"É uma unidade industrial da
mais alta tecnologia onde será feito um investimento enorme. O projeto não é só
a unidade. As pessoas que trabalham no projeto, se hospedem em algum lugar,
comem em algum lugar e tudo isso será um efeito indireto muito grande. Quando
você está em uma região muito pobre, o impacto é maior do que em uma região
mais rica, comparando à CSP", disse Rubens.
Para iniciar as operações, a CSP
contou com um investimento de US$ 5,4 bilhões. A expectativa, na época, era de
que fossem gerados 2,8 mil empregos diretos, 1,2 mil terceirizados e 12 mil
indiretos.
Contudo, algumas preocupações
ambientais ainda estão relacionadas ao projeto. Apesar de a INB afirmar que
avanços nas técnicas de mineração facilitam a aplicação do projeto, a usina
necessitaria, provavelmente, de uma barragem de rejeitos. Apesar da semelhança
dos casos da Vale em Brumadinho e Mariana, onde as barragens romperam, deixaram
vítimas e afetaram o meio ambiente, Rubens alega que não haveria riscos em
Santa Quitéria.
"Todo lugar que tenha
mineração exige barragens, mas não podemos achar que só porque uma pessoa fez
uma coisa errada, todo mundo vai fazer também. A questão é que, quando for
feita a barragem, tem ser tomado todo tipo de cuidado", disse.
Meio ambiente
Contudo, Rafael Dias Melo,
pesquisador do núcleo Tramas, da Universidade Federal do Ceará, apontou que os
riscos de contaminação do solo e dos recursos hídricos na região não podem ser
desconsiderados. Ao longo dos anos, somente pela checagem de viabilidade, a
parte do solo na região ao redor da jazida em Santa Quitéria já estaria apresentando
níveis de urânio acima do normal. Dias ainda pontuou que o processo de
exploração da mina, que terá como base a dinamitação das rochas, poderá
dispensar poeira com elementos radioativos que poderiam causar danos à saúde
dos moradores da região, aumentando a incidência de vários tipos de câncer,
como o de pulmão. O pesquisador ainda alertou sobre as proporções do projeto.
"Durante os vinte anos de
exploração, seria gerado um volume de rejeitos maior do que a da barragem em
Mariana, mas um rompimento pode causar um impacto maior do que o de lá, pela
concentração de minerais radioativos", apontou Dias.
O pesquisador ainda alertou que a
Capital não estaria livre de riscos de contaminação, em caso de descuidos, já
que o material seria escoado pela CE-020 e seria enviado à INB pelo Porto do
Mucuripe. Para Dias, o projeto de exploração de Santa Quitéria não oferece
viabilidade sócioeconômica.