O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) rebateu hoje, em entrevista ao site Brasil 247, a declaração do ministro do Fazenda, Paulo Guedes, de que poderia haver pedidos por um novo AI-5 —a medida mais autoritária da ditadura militar brasileira— se houver uma radicalização de protestos de rua no Brasil.
Lula defendeu a realização de manifestações de rua contra a política econômica do governo, afirmou que a democracia não é um "pacto de submissão" e negou que tenha estimulado protestos violentos.
Decretado em 1968, o AI-5 (Ato Institucional nº 5) fechou o Congresso, suspendeu direitos políticos e instituiu a censura prévia, além de abrir caminho para o endurecimento da repressão contra a oposição armada, com mortes e desaparecimentos de militantes.
"A democracia não é um pacto de submissão, de silêncio, e quem ganha as eleições pode fazer tudo. Quem ganha tem que fazer o que está na lei, e o povo não é obrigado a aceitar a venda de todo o patrimônio público", disse Lula. "O povo tem que ir para a rua e dizer: não vai vender o BNDES. Qual é o mal disso?"
O ex-presidente afirmou que nunca convocou "quebra-quebra" durante sua militância política, iniciada na década de 1970, e disse ter orgulho de ter participado de manifestações "a favor de tudo e contra tudo".
Na segunda (25), Guedes falava a jornalistas sobre a instabilidade política e social na América Latina quando fez a menção ao AI-5.
"Sejam responsáveis, pratiquem a democracia. Ou democracia é só quando o seu lado ganha? Quando o outro lado ganha, com dez meses você já chama todo mundo para quebrar a rua? Que responsabilidade é essa? Não se assustem então se alguém pedir o AI-5. Já não aconteceu uma vez? Ou foi diferente? Levando o povo para a rua para quebrar tudo. Isso é estúpido, é burro, não está à altura da nossa tradição democrática", afirmou o ministro.
Ontem, Guedes definiu manifestações de rua como "uma bagunça, uma convulsão social" e pediu uma "democracia responsável" no Brasil.
Não tenho a ver com reformas em sítio, diz Lula
Lula concedeu a entrevista ao mesmo tempo em que o TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) julgava, em Porto Alegre, o caso do sítio de Atibaia (SP), da Operação Lava Jato. O ex-presidente foi condenado em primeira instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele é acusado de ter sido o beneficiário de reformas realizadas por empreiteiras na propriedade, no valor aproximado de R$ 1 milhão.
Aos jornalistas do Brasil 247, o petista negou que tenha relação com as reformas no sítio e voltou a dizer que é alvo de uma perseguição política. Lula frequentou de forma assídua o sítio nos primeiros anos após deixar a presidência. A propriedade pertence ao empresário Fernando Bittar.
"Se [a chácara] não é minha, pode fazer 500 reformas que eu não tenho nada a ver com isso. Eles não têm prova, eles têm uma tese: o Lula não pode ficar solto", afirmou.
O ex-presidente também comentou o projeto de emenda à Constituição para legalizar a prisão em segunda instância, o que poderia levá-lo de volta à prisão. Lula disse esperar que "se forme uma maioria que perceba que não dá para mudar a Constituição ao bel prazer da conjuntura".
Petista não firma posição sobre candidatura
Apesar de solto, Lula continua condenado em mais de uma instância pelo caso do tríplex, e por isso continua inelegível pela Lei da Ficha Limpa. Ele evitou afirmar se vai ser ou não mais uma vez candidato a presidente em 2022, mesmo dizendo que estaria "feliz de ser o cabo eleitoral de um companheiro" como o ex-ministro Fernando Haddad (PT).
"Eu não vou dizer que eu vou ser o candidato. Vou estar com 77 anos. Eu me cuido, eu estou apaixonado e pretendo cuidar da minha mulher. Mas eu também não vou descartar", declarou.
Apesar de não dar certeza sobre uma nova candidatura, Lula disse que quer "conquistar o direito de ser candidato, embora possa não ser".
UOL