Diante da escalada de casos da Covid-19, as cidades de Sobral,
Itapipoca, Camocim, Itarema e Acaraú, todas na Região Norte, tiveram
medidas mais restritivas no isolamento social decretadas pelo Governo do
Estado. O ‘lockdown’ passou a vigorar na segunda-feira (1º), com o
objetivo de mitigar a disseminação do novo coronavírus e, assim, evitar
um colapso no sistema de saúde. No entanto, nos dois primeiros dias de
vigência do decreto, o resultado não foi o esperado. Houve desrespeito
às normas em quase todas as cidades.
O cenário preocupa. Os cinco municípios já somam, juntos, 4.852 casos
confirmados da Covid-19. O quantitativo é 7% maior do que o registrado
na última segunda-feira. Como agravante, a taxa de ocupação dos leitos
está próxima do limite. Nas três cidades (Sobral, Itapipoca e Itarema)
que têm UTIs dedicadas a pacientes com Covid, a taxa de ocupação está em
93,66% - em Acaraú e Camocim não há leitos de UTI. Já para os leitos de
enfermarias, presentes nas cinco cidades, a taxa é de 73,88%. Ao todo,
os cincos municípios dispõem de 410 leitos (UTI e enfermaria) exclusivos
para tratamento da Covid. Neste universo, a ocupação é de 80,7%. Os
dados são confirmados pelas secretarias de saúde dos municípios
atualizados às 11h e, os números do Hospital Regional Norte (HRN), são
do IntegraSUS, atualizados às 19h27.
Evitar o estrangulamento das vagas - que se mostra eminente -, só
será possível com isolamento rígido, avaliam especialistas. “Não adianta
abrir vagas e mais vagas se a população não colabora. O mais
importante, hoje, é adotar o isolamento”, alerta a médica Luana Costa.
Mas, não é o que tem sido observado até agora.
“Tem muita gente nas ruas ainda, e sem máscara. O pessoal ainda não
teve a consciência de como esse vírus é sério”, desabafou uma moradora
de Sobral, que se recuperou da Covid-19 e que não quis se identificar. O
Município registra o maior número de casos no Interior, com 2.416
pessoas infectadas, e é um dos que mais preocupa. A situação de Sobral
gera atenção pois a cidade também é referência hospitalar para a
macrorregião.
Só no HRN, que atende pacientes de 55 municípios, dos 99 leitos de
UTI, 96 estão ocupados. Apesar das aglomerações, o diretor da
Coordenadoria Municipal de Trânsito de Sobral (CMT), Julif Guedes,
garantiu que há fiscalização no Município.
“A PM reforçou as operações”. Há blitz em todos os acessos a Sobral e
em algum deles há bloqueios. Além disso, todo o Centro foi isolado.
Outro município em situação grave pelo grande número de casos é
Itapipoca, que já soma 1.043. Na cidade, todos os 17 leitos de UTI estão
ocupados. Mesmo assim, muitos moradores seguem se aglomerando. “As
pessoas não respeitam. As filas continuam grandes, os supermercados
cheios. A Prefeitura barrou as entradas no município, mas ainda não vi
sucesso nessa nova medida”, conta a agente de microcrédito Mirelle
Dutra.
O presidente da Autarquia Municipal de Trânsito de Itapipoca (AMTI),
Paulo da Mota David, admite dificuldades para conter a circulação de
pessoas e veículos, já que muitos, vindos de outros municípios, se
dirigem à cidade para utilizar serviços essenciais, como os bancos. “Vem
gente de Amontada, Miraíma, Uruburetama”, exemplifica.
Hoje, o principal trabalho dos agentes de trânsito é conter as
aglomerações em dia de pagamentos. “Os agentes estão dando apoio. Isolou
a Caixa Econômica, pintou o chão para manter a distância”, enumera as
ações.
Com 25 agentes trabalhando por escala, David admite as dificuldades.
“É insignificante o número porque fazemos (fiscalização) a noite”,
pontua. Outro problema é que a cidade é cortada pela BR-402, que liga o
Ceará aos estados de Piauí e Maranhão. “Não podemos ser arbitrários e
impedir o cidadão que passa de uma cidade para outra”, pondera David. Os
agentes têm orientado para não circularem nas vias municipais.
Para tentar conter o fluxo, Itapipoca adotou um rodízio de veículos a
partir do número final da placa. “Em dias ímpares só circulam os que
têm placas ímpar. Em dias pares, apenas final com número par”, explica
David. A regra não é aplicada para quem presta serviços essenciais ou
veículos de quem tem permissão para trabalhar.
Já em Camocim, no extremo Norte cearense, a própria coordenadora de
atenção básica do Município, Ana Cristina Bernardino, observa que parte
da população descumpre as medidas de isolamento social. “A população não
está consciente do que está ocorrendo e precisamos da ajuda dos
moradores”, pontuou. “As pessoas saem para fazer compras”, completa.
Apesar da gestão municipal afirmar que vem adotando medidas desde o
início da pandemia, uma enfermeira que trabalha em uma unidade básica de
saúde e pediu para não ser identificada disse que as medidas
preventivas foram adotadas tardiamente. “Fazemos limite com Jijoca de
Jericoacara e o fluxo de turismo estava intenso com a praia de Tatajuba,
onde os casos de Covid-19 começaram”, pontuou. “Até hoje não há
barreira nessa área”. O município, que não tem UTI, já registra 11
óbitos pela Covid.
A professora Ângela Cecília da Silva denuncia que, mesmo com o
decreto mais rígido, ainda há muitas pessoas nas ruas e a fiscalização e
as barreiras não estão surtindo efeito. “Não mudou quase nada”,
garante.
Um empresário local reforça: “Aqui nada mudou, o quadro atual com
lockdown é igual à situação anterior, com muitas pessoas nas ruas e os
comerciantes colocando clientes dentro das lojas e fechando as portas”,
desabafou. A reportagem entrou em contato com a chefia de Gabinete da
Prefeitura de Camocim, mas as ligações não foram atendidas. A gestora do
Comitê de Crise de Acaraú, Marjore Viana, também reconhece a existência
de aglomerações. “A situação nos preocupa com muita gente nas ruas, nos
bancos para receber benefícios sociais, aposentadorias, e isso forma
aglomerações”, contou. “A rodovia estadual de acesso a outras cidades
passa por dentro de Acaraú e isso traz dificuldades de controle”,
afirma. Os casos em Acaraú saltaram 36,5% em uma semana, chegando ontem
(2) a 734 infectados.
(Diário do Nordeste)