Os bons volumes pluviométricos fizeram com que a estimativa para colheita aumentasse 12,96% em relação a 2019. Além disso, os maiores reservatórios do Estado ganharam aporte considerável, viabilizando a garantia hídrica
Os bons volumes desta quadra chuvosa (fevereiro a maio) foram
suficientes para alterar o cenário de dois importantes eixos do Estado: o
abastecimento hídrico e a produção agrícola. Com mais de 730 mm
precipitados, segundo balanço parcial da Fundação Cearense de
Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), este foi o primeiro
quadrimestre desde 2009 a ficar acima da média histórica - de 695.8 mm.
Desde 1973, quando a Funceme passou a disponibilizar os dados
pluviométricos, isto só aconteceu em 12 ocasiões.
Consequência das boas chuvas, o Ceará deve alcançar uma safra de
637.787 toneladas de cereais, leguminosas e oleaginosas em 2020,
crescimento de 12,96% em relação a 2019 (564.615t) e de 34,7% em relação
à expectativa de safra de janeiro deste ano (467.673t), segundo
Levantamento Sistemático da Produção Agrícola, do IBGE.
O resultado da quadra acima da média traz alento para o agricultor
familiar cearense, que depende das chuvas para o cultivo nas áreas de
sequeiro. A Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA) acrescenta ainda
que a expectativa de safra também tem correlação com a distribuição de
duas mil toneladas de sementes pelo Programa Hora de Plantar, adaptadas
ao clima e solo do semiárido cearense e com alto potencial germinativo.
Já em relação ao abastecimento humano, as chuvas garantiram recarga à
maioria dos reservatórios cearenses. Os três maiores açudes do Ceará,
Castanhão, Banabuiú e Orós, ganharam 13,14%, 7,19% e 22,71% de volume,
respectivamente, de janeiro até o último sábado (30). O Castanhão
acumula agora 15,97% de seu volume de água, Banabuiú 13,58% e Orós
27,96%.
Distribuição
Além dos bons volumes pluviométricos, o ponto alto desta quadra foi a
distribuição espacial das chuvas. "Embora algumas áreas isoladas possam
não ter sido tão beneficiadas pelas chuvas, de um modo geral,
diferentemente do observado nos últimos anos, as precipitações foram
melhor distribuídas no Estado", avalia Meiry Sakamoto, gerente de
Meteorologia da Funceme. "Em fevereiro, março e parte de abril, as
condições do oceano Atlântico favoreceram o posicionamento da Zona de
Convergência Intertropical (ZCIT) sobre o Nordeste do Brasil, levando
chuvas, inclusive, para o interior do Ceará".
As condições fizeram com que esta quadra chuvosa atingisse alguns
parâmetros que não se repetia há anos. Ontem (31), o volume acumulado no
Ceará, de fevereiro a maio, alcançou 732,8 mm, ficando 22% acima da
normal climatológica. Segundo a Funceme, quando o acumulado nos quatro
meses fica entre 505.6 mm e 695.8 mm, o período é considerado "em torno
da média"; e abaixo de 505.6 mm, o órgão considera "abaixo da média".
Neste século, somente as quadras chuvosas de 2009 (965.7 mm), 2008
(768.2 mm) e 2020 ficaram acima da média.
"Estes números, apesar de preliminares, confirmam os prognósticos
climáticos divulgados em janeiro e fevereiro. É o melhor resultado desde
2009, quando as precipitações ficaram 60,8% acima da média do
quadrimestre", ressalta Sakamoto. "A partir de maio, observou-se o
afastamento da ZCIT, e as precipitações foram menos abundantes e
ocorreram associadas a áreas de instabilidade formadas no oceano próximo
à faixa litorânea, ou se deslocando em direção ao Estado, a partir do
setor leste da região Nordeste. Essa tendência de redução ao longo da
estação chuvosa havia sido indicada nos prognósticos da Funceme".
No quadrimestre (fevereiro-maio), a macrorregião do Cariri foi a que
apresentou maior variação positiva. Com 864 mm, o índice ficou 40,1%
acima do normal para a região. Na sequência está o Litoral de Fortaleza,
com chuvas 27,6% acima da média, região que em termos absolutos
acumulou a maior média (1.016 mm).
Nesta quadra, março foi o mês mais chuvoso, com 275.7 mm (35.5% acima
do normal), seguido de fevereiro (192.2 mm) e abril (181.5 mm). Maio
apresentou o menor índice, como 86.6 mm (-4,4%). Ainda assim, foi o maio
mais chuvoso desde 2014, quando o Ceará registrou 85.1 mm (-6.1%).
Reservatórios
As boas chuvas tiveram impacto positivo no cenário hídrico geral do
Ceará. Dos 155 reservatórios monitorados pela Companhia de Gestão dos
Recursos Hídricos (Cogerh), 36 excederam a capacidade máxima e
permanecem sangrando, conforme o Portal Hidrológico do órgão. Além
disso, o Estado atingiu a marca de um terço da capacidade, situação que
não ocorria desde outubro de 2013.
Região que concentrou os maiores volumes de chuva no Ceará, os
reservatórios da bacia do Litoral estão em situação mais confortável,
concentrando 99,86% do suporte total. Dos 10 açudes, sete estão
sangrando. Situação semelhante ocorre na bacia do Coreaú, que acumula
98,81% da capacidade e possui sete dos 10 reservatórios sangrando
atualmente.
Na bacia do Médio Jaguaribe, onde fica o Castanhão, o acúmulo é de
15,49%. Em 1º de janeiro, esta taxa era de apenas 2,85%. Já nas bacias
do Alto Jaguaribe e do Banabuiú, onde ficam Orós e Banabuiú, a
recuperação foi ainda maior. Na primeira, que iniciou o ano com 5,74% da
capacidade, este índice chegou a 35,12%. Já na do Banabuiú, onde fica o
reservatório homônimo, a capacidade saiu de 6,36%, em 1º de janeiro,
para 14,6%, até este domingo.
Pandemia
O abastecimento chega em um momento de aumento da demanda com o
isolamento social, consequência da pandemia de Covid-19. A Cagece,
responsável pela distribuição no Ceará, chegou a ampliar o sistema
integrado de Fortaleza. As estações de tratamento do Gavião e Oeste
tiveram aumento de 3,6% na vazão de água produzida. O objetivo é
aumentar a oferta de água que normalmente é distribuída para Fortaleza e
outros Municípios da região.
Até 10 de junho, Quixeramobim e o Hospital Regional do Sertão Central
devem seguir recebendo reforço hídrico durante o isolamento. O aumento
acontece a partir da operação controlada de transferência de água do
açude Fogareiro, do sistema Banabuiú, para o Açude Quixeramobim,
iniciada no início de maio. "Com a crise provocada pela pandemia, a
demanda por água se tornou mais urgente ainda", explicou o gerente
regional em Quixeramobim, Paulo Ferreira. "A transferência não tem
causado impacto no abastecimento das comunidades rurais situadas no
entorno do Fogareiro", avaliou.
(Diário do Nordeste)