Sem público desde março, classe artística reflete sobre a retomada gradual de eventos no Ceará

 
Cinemas, museus e teatros de cidades cearenses que cumpriram a fase 4 do Plano de Retomada Responsável das Atividades Econômicas e Comportamentais contra a pandemia do coronavírus estão liberados para funcionar com 35% da capacidade de público, desde o dia 1º de setembro. Ao mesmo tempo, o Governo estadual programou, a partir do dia 14 de setembro, a liberação de pequenos eventos com até 100 pessoas. Entretanto, os protocolos de segurança para o início das atividades seguem em planejamento. Enquanto isso, artistas e empresários sofrem para pagar contas de água, aluguel e energia.


A falta de eventos atinge diversos nichos da cultura. Segundo Bryan Stevanovich, quinta geração de família circense, responsável pelo Cirque Amar, estrangeiros que trabalham em Fortaleza no espetáculo estão retornando para países de origens como Dinamarca, Rússia, Itália e Japão.


Um grupo de seis dinamarqueses voltou nesta semana para a Europa. "As famílias estão mandando dinheiro para eles. O que acontecia era o inverso", conta o gestor do circo.


No último fim de semana, o Cirque Amar chegou a realizar apresentações em formato drive-in, mas Bryan Stevanovich afirma que não foi rentável. "A experiência valeu como experiência. Vai ficar para história do circo. Financeiramente não foi positivo. Não sabemos se o público está receoso com o que está acontecendo".


Bryan conta que o retorno financeiro por meio dessa primeira fase da liberação de eventos será pouco pela grande cadeia produtiva que atua nos espetáculos. Ao todo, 104 pessoas trabalham no Cirque Amar. "Eu não posso nem abrir o circo para 100 pessoas. Estou em um terreno particular. Pago 5% de Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), mais 5% de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), pago artistas e técnicos".


Teatro


Em Fortaleza, além dos artistas circense, grupos teatrais temem a descontinuidade de produções. Rogério Mesquita, do grupo Bagaceira de Teatro, lembra que a pequena casa de espetáculo do grupo recebe até 60 pessoas e uma redução para 35% dificultará o pagamento das atividades. "Estamos com quatro meses de aluguel vencidos. Estamos negociando com os donos do imóvel. As contas de água e energia são pagas em parceria com outros artistas. Estamos nos virando dessa maneira. Cada ator está se virando para ter um prato de comida para viver. Estamos em situação emergencial desde o início da pandemia", revela.


Além das medidas de isolamento social, o membro do Bagaceira lembra que o medo em pegar a doença entre espectadores é uma realidade. "Acho que essa pandemia descortinou o quanto estamos desamparados de financiamentos. Em relação ao público, questionamos se as pessoas vão se arriscar. Antes o risco era da violência urbana, agora, de saúde pública. O impacto é imensurável. Nossa sede está parada com custos fixos só aumentando. Não tem como acompanhar essa ruptura", avalia.


Futuro


Com 20 anos, o Bagaceira é formado por seis pessoas. Cada integrante busca alternativas para sobreviver. Uma das atrizes chegou a trabalhar em shopping medindo a temperatura de clientes. "Nossa visão de futuro, até de continuidade do trabalho artístico, está bem confusa. Por mais que seja contraditório, estamos em meio a um processo artístico para estrear, daqui a dois meses, uma produção de forma virtual. A criação está nos salvando de uma depressão coletiva", explica Rogério Mesquita.


O artista acredita que a pandemia está colocando em risco a própria sobrevivência do coletivo artístico. "Não vemos tanto futuro assim na continuidade do grupo se continuar com essa falta de discussão e um debate mais amplo".


Animadores e recreadores infantis também enfrentam a dificuldade da falta de trabalho, pois atividades de entretenimento estão proibidas em hotéis, bufês, clubes e casas de shows. O casal de palhaços Raquel Alves e Wescley Morais - intérpretes dos personagens Bitoca e Miolo Mole - está sobrevivendo com ajuda de amigos e familiares.


"Nós estamos há cinco meses parados. A grande maioria não conseguiu esse auxílio do Governo, nós mesmos conseguimos apenas duas parcelas. Quando vemos a coisa caminhar para um retorno, nos deparamos com esse decreto estadual que não pode ter entretenimento nos eventos. Tudo isso piorou nossa situação. Os bufês, por exemplo, nossa área de atuação, não vão cancelar as festas por conta do entretenimento. É mais provável cancelarem apenas os contratos com os artistas", ressalta Wescley Morais.


Cinema


As salas de cinemas também passam por um longo período sem receber público. Pedro Martins Freire, crítico de cinema, aponta que os exibidores de filmes do Ceará precisarão se reinventar para oferecer as produções audiovisuais. "Avalio que eles precisarão ter os próprios streamings para o espectador assistir em casa e no cinema. É algo para um futuro próximo. O que vale agora é o serviço, o que se pode oferecer".


Para amenizar os efeitos da pandemia, um grupo de estúdios, distribuidores, exibidores e fornecedores do segmento criaram o "Festival De Volta Para o Cinema". Em Fortaleza, o Shopping Benfica exibe produções como "Matrix", "Vingadores" e "Pantera Negra" com preços populares.


Medidas


O governador Camilo Santana destacou, durante uma das lives semanais sobre a pandemia, que a liberação dessas atividades se deu após aval do Comitê Científico que acompanha a pandemia no Estado. "Sempre temos nos pautado pelos dados científicos e com muita precaução a retomada das atividades econômicas".


Apesar das liberações, a Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho (Sedet), em parceria com a Secult, está finalizando as propostas de protocolos setoriais a fim de ser apreciados pela Secretaria da Saúde (Sesa) a para posterior publicação.


Esses protocolos terão recomendações detalhadas que devem ser adotadas na reabertura. Cabe a cada equipamento, público ou privado, elaborar o próprio protocolo institucional seguindo as diretrizes especificadas no decreto. Cada um pode tomar a decisão sobre o seu prazo de reabertura, mas é fundamental que, quando o faça, já tenha o protocolo elaborado e pessoal treinado.


ATIVIDADES I


Museus, prédios históricos, atrações similares, cinemas e teatros
Limite de capacidade: até 35%, desde que respeite os protocolos geral e específicos


ATIVIDADES II


Bibliotecas e arquivos
Limite de capacidade: até 35%, desde que respeite os protocolos geral e específicos


ATIVIDADES III


Eventos


Limite de capacidade: eventos em igrejas, hotéis, bufês, clubes e casas de eventos, em espaço privativo, para até 100 convidados sem entretenimento, até 23h, ocupação limitada a 1 pessoa a cada 12m2


Fonte: Decreto n°33.730,de 29 de agosto de 2020 - Diário Oficial do Estado do Ceará (DOE)
 
 
O POVO

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