Refém foge de cativeiro, se alimenta de caju por 4 dias em mata e reencontra família — Foto: Reprodução |
O jovem Pablo Pedroza, de 21 anos, que passou 4 dias desaparecido em uma área de mata no Ceará após ser levado por criminosos armados enquanto trabalhava em uma obra, contou ter se alimentado apenas de caju e água escavada da terra, o que garantiu a ele dieta com o mínimo de nutrientes e calorias necessários para manter o organismo funcionando, segundo avaliam especialistas que analisaram o caso.
Segundo a família de Pablo contou ao g1, ele conseguiu fugir do cativeiro, em uma área erma, e voltou para casa após quatro dias. Enquanto procurava o caminho de casa, ele se alimentava de caju e cavava buracos no chão para encontrar água para matar a sede.
O caso ocorreu durante o último fim de semana em Itarema, a 204 quilômetros de Fortaleza. Quatro homens - incluindo Pablo - trabalhavam na parte elétrica da obra de um posto de saúde da cidade quando foram abordados por criminosos. Um dos trabalhadores morreu após ser baleado.
Pablo Pedroza foi levado pelos criminosos e desapareceu em uma região de mata. Ele era procurado desde o dia 14 de setembro, e foi encontrado com vida no dia 17. Os suspeitos do crime ainda não foram encontrados.
Dieta limitada, água imprópria
O local onde Pablo esteve desaparecido era uma região de mata em Itarema, no litoral norte do Ceará. O município possui, nas proximidades do litoral, uma vegetação conhecida como tabuleiro costeiro - um ambiente em que são encontradas frutas, como caju, e no qual o solo costuma ter lençóis freáticos.
"Tabuleiros costeiros são áreas planas, com pouca inclinação, com solos medianamente profundos ou profundos e com possibilidade de água subterrânea", explicou o professor Flávio Nascimento, do departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC). "Muito provavelmente ele se perdeu numa região dessas, onde você tem frutas silvestres como caju e frutas endógenas".
Conforme o professor, o solo da região e as dinâmicas hidrográficas da área devem ter possibilitado que jovem tenha encontrado água sem muita dificuldade. "Acredito que ele tenha encontrado um leito de rio seco. Se você entra no leito do rio e escava poucos centímetros, dependendo da região, você pode encontrar algum tipo de umidade ou água", destaca Nascimento.
Município de Itarema possui extensas áreas de carnaubais, o que indica um solo com ricos lençóis freáticos — Foto: Helene Santos/Agência Diário |
A dieta limita ao caju, conforme nutricionista com quem o g1 conversou, continha os elementos necessários para fornecer ao organismo o mínimo de energia para manter seu funcionamento.
"As frutas fornecem açúcares naturais, fibras, vitaminas e minerais que ajudam o corpo a manter o funcionamento", detalha a nutricionista Sabrina Oliveira Pessoa.
"No caso do caju, ele contém a vitamina C, esses açúcares que são importantes para o nosso organismo, que são os açúcares bons, e uma pequena quantidade de proteína e gordura. Todos esses elementos são importantes para fornecer energia e sustentar o metabolismo em curto prazo, que foi o caso dele", afirma.
De acordo com Sabrina, em situações como essa, de pouca ou nenhuma alimentação, o corpo humano aciona mecanismos para economizar energia e manter os sinais vitais.
"Ele reduz a taxa metabólica e começa a usar reservas de gordura que o nosso organismo tem para produzir energia, para conseguir ficar vivo. Isso pode explicar como ele conseguiu se manter por esse período, apesar dessa ingestão calórica extremamente baixa", avalia.
No entanto, o essencial para a sobrevivência de Pablo, segundo avalia Sabrina, foi ter conseguido encontrar uma fonte de água. "O corpo pode até resistir à falta de alimentos por alguns dias, mas a falta de água poderia ter sido letal em menos tempo. Mesmo que a quantidade de água fosse baixa, ela ajudou a evitar essa desidratação", pontua.
O professor Flávio Nascimento destaca que, provavelmente, a água encontrada por Pablo ao escavar ao solo não era propícia para o consumo humano.
"Como ele escavou à mão e encontrou a água a baixíssima profundidade, de centímetros, essa água realmente é imprópria. É diferente de água de poço, água de poço normalmente está mais protegida de contaminantes porque é mais profunda", detalha. "Ela pode salvar tua vida, mas pode trazer problemas gastrointestinais, relacionados a contaminação de fezes e minerais do solo. Mas serviu para sobrevivência do mesmo ".
Medo de não voltar para casa
Pablo e as demais vítimas são naturais do município de Itapipoca e foram para Itarema, a cerca de 90 quilômetros de distância, a trabalho. Eles trabalhavam na parte elétrica de uma obra de um posto de saúde.
Quando o posto de saúde onde ele trabalhava foi invadido, Pablo estava na companhia de outros três funcionários. Na ocasião, os criminosos fizeram os quatro de reféns e retiraram eles do local.
Durante o deslocamento, um dos trabalhadores, um rapaz de 20 anos, foi baleado. Ele chegou a ser atendido em um hospital, mas não resistiu aos ferimentos e morreu. As outras duas vítimas foram resgatadas ainda no sábado (14), dia do crime, porém Pablo ficou desaparecido até a última terça-feira (17).
"Ele não é uma pessoa de ficar saindo com amigos. Só acordava, ia para o trabalho. Se tivesse bico para fazer, fazia. Se não tivesse, ficava em casa com a esposa ou ia para a casa da mãe", disse um familiar à TV Verdes Mares.
Após ser encontrado com vida, Pablo foi devolvido à família, em um encontro acompanhado pela Polícia Civil do Ceará. Ao g1, um familiar que preferiu não se identificar disse que o jovem está com medo, mas feliz, pois está com a esposa e o filho.
"Ele continua assustado e fica calado com medo. Ao mesmo tempo, se encontra aliviado, pois voltou a conviver com a sua esposa e o filho. Ele teve medo de não mais retornar para casa", concluiu.
Trabalhador desaparecido por três dias se alimentou de caju e cavou buraco para achar água
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Ceará (SSPDS) informou que a Delegacia Municipal de Itarema está responsável pela investigação dos crimes de homicídio, restrição de liberdade e desaparecimento.
(g1)