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20 chupa-dentes estão sendo translocados da Serra de Baturité para a Serra da Aratanha — Foto: Fábio Nunes |
Quando se pensa em Ceará é inevitável imaginar praias paradisíacas e um litoral de água transparente. Sem dúvida, o estado é um dos destinos mais procurados pelos turistas brasileiros e estrangeiros que buscam contato com o mar e descanso.
Mas as belezas naturais do Ceará vão muito além da costa. Apesar da Caatinga ocupar 92% do território cearense, o estado conta com regiões onde a floresta úmida é o principal tipo de vegetação. A Serra de Baturité, que fica há cerca de 100 quilômetros de Fortaleza, é um exemplo.
Essa área no interior cearense apresenta altitudes que chegam a até 1.114 metros. Um local único com vegetação exuberante. No entanto, a história da Serra de Baturité relata que esse foi um processo de revigoramento da flora levou décadas.
Passado esse primeiro ciclo do café na região, a cultura entrou em declínio, só se recuperando com uma nova técnica de plantio, a do "café de sombra". Os produtores notaram que replantando a vegetação nativa junto aos pés de café, a produção melhorava, assim como a qualidade do produto.
Só a partir de 1930, um ano após a quebra da bolsa de Nova York, é que a área de café na serra começou a diminuir. Por consequência, sem a manutenção das lavouras, a mata úmida começou a revigorar.
Hoje, uma grande mancha de Mata Atlântica de 32 mil hectares fazem parte da APA criada em 1990. A área de proteção ambiental se espalha pelos municípios de Aratuba, Baturité, Capistrano, Caridade, Guaramiranga , Mulungu, Pacoti, Palmácia e Redenção.
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Foto: Fábio Nunes |
Nesse contexto todo, o chupa-dente-do-nordeste (Conopophaga cearae) sobreviveu no local apesar de tantas mudanças ambientais. Hoje ele é um dos símbolos do Ceará.
Por isso, a ONG Aquasis, uma das mais importantes e referência no estado, está fazendo um trabalho de encaminhar casais de aves para uma outra área com as mesmas características geográficas, a Serra da Aratanha, que fica próxima à região metropolitana de Fortaleza. O biólogo Fabio Nunes é o coordenador desse trabalho de reintrodução da espécie na Aratanha.
"Quando a gente começou a fazer esse trabalho aqui , a gente viu que a Serra da Aratanha era, de certa forma, uma floresta vazia. O sinal de que a floresta está vazia são frutos apodrecendo no chão sem um animal para dispersar e o silêncio da paisagem".
A reintrodução do chupa-dente-do-nordeste é feita em parceria entre a Aquasis, a Universidade Estadual do Ceará e a Universidade de Cornell, nos Estados Unidos. O trabalho é amparado no Plano de Ação Nacional para conservação das aves da Caatinga.
"A gente tem 20 chupa-dentes sendo monitorados. Alguns deles têm rádio transmissor onde a gente tem acompanhado a movimentação. Saber se eles estão se alimentando, se estão sobrevivendo, isso é muito importante pra gente entender o impacto dessa translocação. E a gente viu que eles estão se adaptando bem", explica Nunes.
A Serra da Aratanha tem 6 mil hectares de área de mata úmida. Desde maio, os primeiros indivíduos foram levados ao local para soltura. Pesquisadores da Universidade de Cornell instalaram gravadores autônomos para acompanhar a adaptação dos pássaros no novo ambiente.
O chupa-dente-do-nordeste é uma espécie insetívora que mede entre 11 e 14 centímetros de comprimento e pesa de 16 a 27 gramas.
"Temos aqui uma floresta madura, rica em insetos, o que indica a presença de um sub-bosque muito semelhante ao da Serra de Baturité. Eu diria que esta área é uma extensão daquela serra, separada há milhares de anos, mas com origens comuns. Por algum motivo, o chupa-dente desapareceu desse trecho, e agora estamos oferecendo a ele uma segunda chance", conclui Fábio Nunes.