O cenário desfavorável leva os municípios a atrasar pagamentos de
fornecedores, do funcionalismo, suspender serviços e paralisar obras. O
descompasso entre receitas e despesas coloca os gestores em uma situação
delicada mediante a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O gasto com
pessoal ultrapassa o limite legal, que é de 54%, mesmo sem novas
contratações e com medidas de ajustes.
Tende a piorar
“A situação é grave e tende a piorar”, disse o presidente da Associação
dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece), Expedito José do Nascimento.
“Os prefeitos reduziram despesas, demitiram temporários, cargos em
confiança, mas mesmo assim já ultrapassam o índice legal com gasto de
pessoal”. Nascimento foi taxativo: “Logo todos os municípios serão
enquadrados pela lei, é uma questão de tempo, se nada for feito”.
Segundo lista do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Ceará
(TCM-CE) divulgada em maio passado, pelo menos 68 municípios cearenses
tinham ultrapassado o limite de gastos com pessoal. Essa situação coloca
os gestores em risco de perda de mandato, enquadramento por improbidade
administrativa, multa, possibilidade de prisão e suspensão das
transferências de recursos federais e estaduais para os municípios.
“As prefeituras atravessam uma situação de emergência, que exige reforço
financeiro por parte do governo federal”, disse o presidente da União
Brasileira de Municípios (Ubam), Leonardo Santana. A entidade vai expor
ao presidente interino Michel Temer, o panorama geral da crise, a
necessidade de redefinição do pacto federativo.
Quadro é geral
O quadro é o mesmo na maioria das Prefeituras do Brasil. Não é um
problema regional. A retração da economia trouxe redução das
transferências constitucionais, inviabilizando as gestões municipais e a
manutenção dos principais programas de assistência às populações. Por
outro lado, as despesas cresceram com reajuste do salário mínimo,
custeio da máquina e implantação de piso salarial de categorias como
professores, agentes de endemias e de Saúde.
O economista Irineu de Carvalho mostra que esse problema vem se
agravando desde 2012, mas nada foi feito até agora de concreto para
minorar a crise que se abate sobre as administrações municipais. “As
receitas vêm caindo e as despesas aumentando”, frisou Carvalho. “Muitos
gestores já adotaram medidas, fizeram o que tinha que ser feito, mas não
conseguem superar as dificuldades e isso não é uma questão de ser ou
não bom administrador”, completou.
Para Irineu Carvalho, a solução está nas mãos do governo federal. “O ano
passado foi o ano da crise e esse está sendo o ano da consagração do
desequilíbrio”, observou. “Até o fim de 2016 mais municípios vão entrar
na lista do TCM por ter gasto pessoal acima de 54% das receitas”,
destacou.
Carvalho espera um reposicionamento dos órgãos de fiscalização e
controle mediante o quadro atual decorrente da crise fiscal. “Há a
exigência legal, mas há a queda elevada das receitas, mesmo sem
contratação de novos servidores e esse é um problema nacional que afeta
municípios e Estados”, diz. A LRF já prevê prazo de dois quadrimestres
para o ajuste, entretanto a situação atual não dá margem de manobra.
A crise atual é considerada uma das mais profundas. “A situação é
complexa e exige uma ampla articulação das entidades que representam os
municípios”, frisou Carvalho. “Infelizmente o socorro aos municípios
nunca chega. Já nos mobilizamos e reivindicamos, mas ainda não fomos
atendidos”, afirmou disse o presidente da Aprece, Expedito José do Nascimento, que é prefeito de Piquet Carneiro.
Preocupação
Os prefeitos e secretários de finanças estão preocupados. Jaguaretama é
um dos municípios que ultrapassaram o índice com gasto de pessoal
previsto na LRF. “Reduzi salário dos cargos em comissão, número de
servidores temporários, extingui cinco secretarias, mas não posso
demitir concursados. Perdemos receitas federais e estaduais e a situação
está inviável”, disse o prefeito, Francini Guedes.
Guedes ressaltou que está enquadrado na LRF por perda de receita, sem
ter elevado despesas. “O sertão enfrenta cinco anos de seca, as coisas
estão difíceis. A piscicultura, que é base da economia local, está
acabada com a morte de peixes no Castanhão. Sinceramente, não sei o que
fazer para voltar a me enquadrar na lei”, disse.
Iguatu é um dos 68 municípios que estão na lista do TCM por apresentar
folha de pagamento de 58% da receita corrente líquida. O prefeito
Aderilo Alcântara explicou que concedeu aumento ao funcionalismo público
em 2015 de 8,9%, implantou Plano de Cargo, Carreira e Salário, reajuste
de 11,36% para o magistério, mas o governo federal só repassou 7,5%
para os docentes. De janeiro a abril deste ano em comparação com igual
período de 2015 houve um aumento de R$ 3 mi na folha de pagamento do
município.
“Realizamos dois concursos públicos e contratamos dois mil servidores.
Apesar das enormes dificuldades estamos pagando o salário em dia”, disse
o prefeito. O gestor de Iguatu afirmou que a situação está ficando
inviável. “Estamos adotando medidas, esforço enorme para cumprir a Lei
de Responsabilidade Fiscal, mas houve aumento do salário mínimo e queda
nas receitas. Estamos caminhando para o caos, mais de 700 Prefeituras no
Brasil estão com salários atrasados e, no próximo ano, a crise vai se
agravar, com queda na atividade econômica”, declarou.
Ainda conseguindo
O município de Mucambo não está na lista do TCM. Vem mantendo as
despesas de pessoal dentro do limite legal. O prefeito, Vilebaldo
Aguiar, disse que o segredo, até agora, foi a economia em determinados
setores e priorização despesas. “Consegui fazer milagres, mas estou
preocupado porque a queda de receitas eleva o percentual das despesas.
Não vejo sensibilidade do governo federal em querer ajudar os
municípios, pois estamos atravessando um período excepcional”, afirmou.
Mais informações:
Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece)
Telefone: (85) 4006-4000
Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Ceará (TCM-CE)
Telefone: (85) 3218-1142
Diário do Nordeste