Famílias reclamam de burocracia para acesso a tratamento para bebês com síndrome congênita

Profissionais que acompanham bebês com síndrome congênita do zika investigam de que forma o vírus ainda está presente no organismo das crianças. Hidrocefalia e convulsões estão entre os sintomas apresentados




Dois anos depois de o zika instaurar pânico no Brasil — principalmente entre as gestantes que viam os filhos nascerem com microcefalia associada ao vírus (até então, a principal característica da infecção congênita), dúvidas sobre as consequências do contágio permanecem. No acompanhamento da geração de bebês que cresce marcada pela epidemia, o surgimento de hidrocefalia com sorologia positiva para o vírus aponta para uma possível ameaça: a de o zika seguir vivo nos bebês.

Segundo André Pessoa, neurogeneticista do Hospital Infantil Albert Sabin (Hias), em Fortaleza, a hidrocefalia se mostra uma complicação tardia, que acometeu, neste ano, quase 20% das 119 crianças com síndrome congênita do zika até então assistidas pelo Hias. Pelo resultado dos exames do fluido drenado dos cérebros dos que se submeteram à cirurgia, o pesquisador investiga: o vírus está vivo dentro dos cérebros das crianças ou somente partículas dele permaneceram, assegurando a positividade do teste sorológico?

Em Recife, algumas crianças acompanhadas pelo Grupo de Pesquisa da Epidemia de Microcefalia (Merg) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) também apresentaram a complicação da hidrocefalia, de acordo com o infectologista Demócrito Miranda. “Provavelmente isso sugere que o vírus está ativo no sistema nervoso central. E, talvez, essa atividade esteja resultando numa piora do quadro (clínico)”, conjectura.

Entre os sintomas que têm afetado as crianças (incluindo as que têm e as que não têm microcefalia), em diferentes níveis, estão, além da hidrocefalia, que pode ser tratada cirurgicamente: convulsões graves, calcificações intracerebrais, comprometimento oftalmológico, dificuldade de deglutir e de mexer os membros.

Ana Lis
Luciana Martins, 31, conta que, em junho deste ano, num mutirão de atendimento a crianças com síndrome congênita do zika, foi descoberto que a filha Ana Lis, de um ano e sete meses, tem crises epilépticas durante o sono. Segundo o neurogeneticista André Pessoa, “às vezes, as crises são sutis e evoluem para uma epilepsia de difícil tratamento”.
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A bebê ainda foi diagnosticada com astigmatismo grave quando completou um ano e quatro meses e uma simples gripe pode fazer com que a menina, de Apuiarés (a 120 quilômetros de Fortaleza), passe uma semana internada na Capital. “Suspeitam de pneumonia”, justifica o pai, Raimundo Nonato dos Santos Sousa, 33. Mas nenhuma suspeita jamais se concretizou.

Luciana conta que a fonoaudióloga de Ana Lis recentemente diagnosticou a garota com dificuldade para engolir. “A gente levou em outros especialistas e (o diagnóstico) foi descartado. É que há crianças que têm gases muito frequentes e há o risco de ir pro pulmão”, diz o pai. A menina só se alimenta de pastosos.

Às outras mães de crianças com a síndrome congênita do zika, Luciana aconselha se empoderar sobre o tratamento do filho e buscar opiniões de outros especialistas sobre as complicações. “A gente não tem pressa, trata a Ana Lis como bebê. Porque (o desenvolvimento) é no tempo dela. No tempo de Deus”.


O Povo

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