O dramaturgo irlandês George Bernard Shaw costumava afirmar que "a
escola é um edifício com quatro paredes e o amanhã dentro dele", na
perspectiva de que a sala de aula deve ser um perfeito e prazeroso
ambiente de aprendizagem, com alunos motivados, instigados e o professor
preparado, com condições estruturais de desenvolver suas funções de
educador. No Ceará, se muitas barreiras foram vencidas, inúmeras metas
alcançadas e que colocam o Estado na condição de referência nacional,
ainda existe longo e contínuo processo.
Um desafio mais premente é
apontado pela mais recente pesquisa sobre Políticas Eficazes para
Professores: Compreensões do Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes (Pisa), divulgada na semana passada pela Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). De acordo com o estudo,
salas de aula lotadas, jornadas duplas de trabalho, com carga horária
excessiva e baixos salários são alguns problemas enfrentados pela
maioria dos professores no Brasil, e que colocam o País entre os piores
do mundo para a profissão entre mais de 60 analisados. A média
brasileira é de 22 alunos por sala de aula, no Ceará, chega a 40.
Além disso, o estudo, que enfatiza a importância do ensino de alta
qualidade para reduzir as desigualdades sociais, também revela que
apenas 29% dos professores de ciências no Brasil têm especialização na
área.
Em países como a Finlândia, que estão entre os que apresentaram os
melhores resultados do teste do Pisa na área de ciências, a proporção de
professores especializados nessa disciplina nas escolas públicas do
País é 83%. No Ceará, informa a coordenadora de Gestão Pedagógica da
Secretaria de Educação do Estado (Seduc), Iana Nobre, são 12.863
professores efetivos e ativos da rede pública estadual. Desse número,
8.781 possuem especialização, mestrado ou doutorado, o que corresponde a
68,27% do total.
Segundo Iana, a redução do abandono escolar também é uma das metas da
gestão. A rede pública estadual de ensino do Ceará, aponta, apresentou
redução histórica do abandono escolar em uma década. A taxa em 2007
alcançou os 16,4%, baixando para 6,6% no ano passado. "O governo lançou o
Programa Nem Um Aluno Fora da Escola para garantir acesso e permanência
de todas as crianças e jovens de 4 a 17 anos na escola. Para isso, foi
assinado o Termo de Compromisso pelos gestores municipais", destaca.
O desafio é grande, pois de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílio (Pnad), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), de 2017, 50 mil jovens entre 15 e 17 anos nem
estudam e nem trabalham no Estado, sendo oito mil em Fortaleza.
Outro objetivo é a melhoria do nível de aprendizagem em disciplinas
como Matemática e Língua Portuguesa. O sucesso alcançado com o Programa
de Aprendizagem na Idade Certa (Paic), onde as crianças da rede pública
de ensino chegam aos sete anos lendo e escrevendo, deve ser o mesmo a
ser conquistado nos próximos anos com as estratégias em desenvolvimento
para que os estudantes de 5º e 9º anos concluam as séries sabendo operar
cálculos matemáticos e bom nível em Português.
Segundo resultados do Sistema Permanente de Avaliação da Educação
Básica (Spaece) mais recentes, em relação ao 5º ano, dos 184 municípios
que compõem o Estado, 49 foram avaliados com níveis "adequados" de
aprendizagem, 129 "intermediários" e seis "críticos". Já a respeito do
9º ano, somente o Município de Frecheirinha foi avaliado como
"adequado". Outros 32 foram considerados "intermediários" e 151
"críticos". A meta estadual é reduzir pela metade esse nível crítico
ainda neste ano.
Diferença
Em escolas de nível médio em tempo integral e referências do Estado,
como a Matias Beck, no bairro Vicente Pinzón, essas estratégias já
começam a obter bons resultados. Ali, a evasão escolar é praticamente
zero. "No ano passado, por exemplo, dos 280 alunos da unidade, apenas
quatro se afastaram. Aqui, temos fila de espera durante o período de
matrícula, mas nossa prioridade é para quem vem de escolas da rede
municipal", diz a diretora Virgínia Vilagran.
A unidade está inserida numa área de vulnerabilidade social e, com
ações do Ceará Pacífico vem conseguindo resultados expressivos na
qualidade da educação. Entre os pontos relacionados pelos professores, a
valorização, o planejamento e o ensino da disciplina de sua graduação
fazem a diferença. Entretanto, as turmas chegam a 40 alunos por sala e
isso é um ponto ainda a ser vencido pela gestão. Na avaliação dos
docentes da escola, com turmas reduzidas, os professores podem
dedicar-se às necessidades de aprendizagem de cada aluno e diferenciar
as estratégias para alcançar os grupos com distintos tipos e graus de
dificuldade. "Por enquanto, é difícil fazer isso. A Matemática, por
exemplo, precisa de embasamento, os conteúdos são dependentes. A Língua
Portuguesa também e tem jovens no primeiro ano do Médio que têm
dificuldades de leitura", analisa a professora em Língua Portuguesa e
Espanhol, Eveline Valério.
Na visão de especialistas, como coordenador geral da Campanha Nacional
pelo Direito à Educação, Daniel Cara, estabelecer um número ideal de
alunos por turma é importante para garantir a equidade no processo
educacional. "A questão é ainda mais urgente hoje, quando as salas de
aula estão cada vez mais heterogêneas, reunindo alunos com origens e
condições sociais muito diferentes, que requerem estratégias
específicas", avalia.
Inclusão
Já para o professor doutor em Educação e coordenador do curso de
Pedagogia da Uni7, Marco Aurélio Patrício, o Pisa não leva em
consideração os modelos de educação de cada País e compará-los é como
punir os que, como o Brasil, optaram por um sistema inclusivo. "A rede
pública não recusa ninguém e numa mesma sala estão alunos com vários
graus de aprendizagem e crianças e jovens com deficiência. É um modelo
para o mundo e muitos vêm aqui para conhecer como fazemos", comenta,
acrescentando que esse tipo de pesquisa deveria ter outros mecanismos de
análise para premiar e não punir modelos diferentes.
Marco Aurélio frisa a alta rotatividade de professores de um colégio
para outro também é outro aspecto a ser considerado como ponto negativo.
"Estudo revela que três anos ou mais no mesmo local de trabalho melhora
a qualidade, sem falar na remuneração, sempre um assunto importante em
pauta", pondera.
Em sua análise, a escola em tempo integral é uma conquista a ser
destacada, sendo que a cada três escolas no Ceará, uma é em tempo
integral. "Temos mais de uma centena, todas bem estruturadas,
organizadas, com professores e gestão compromissados e estamos colhendo
frutos dos investimentos que o Estado vem fazendo em mais de dez anos".
Marco Aurélio aponta o Ceará como um oásis quando se fala em Educação no
Brasil onde em muitos estados está regredindo ao invés de progredir.
"Acho que a questão número de alunos em sala de aula é real, mas nada
que não possamos superar".
Diário do Nordeste