A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, defendeu, em parecer
encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), que juízes não podem
determinar a apreensão do passaporte ou da Carteira Nacional de
Habilitação (CNH) para obrigar o pagamento de dívida. Segundo a
Procuradoria-Geral da República (PGR), tais medidas são
inconstitucionais por atingir as liberdades fundamentais dos indivíduos,
em especial a de ir e vir, o que não estaria ao alcance do juiz numa
ação patrimonial. “Patrimônio e propriedade de bens não se confundem com
liberdade, como outrora”, afirmou Raquel Dodge.
A apreensão de carteira de motorista ou passaporte passou a se tornar
menos rara a partir da aprovação, em 2015, do novo Código de Processo
Civil (CPC), que deixa em aberto a possibilidade de juízes determinarem,
em processos de execução e desde que com fundamentação, medidas nem
sempre previstas em lei, as chamadas “medidas atípicas”.
“Esse contorno normativo possibilitou aos juízes inovações como, por
exemplo, a apreensão de passaporte ou carteira nacional de habilitação”,
enfatizou Raquel Dodge. Entre outras medidas que vêm sendo adotadas,
estão a suspensão do direito de dirigir e a proibição de participação em
concurso público e licitação.
Para a PGR, contudo, mesmo com a abertura dada pelo novo código civil, o
juiz deve se ater ao campo patrimonial, não podendo adentrar o campo
das liberdades individuais. “A liberdade do indivíduo não está
disponível nem ao credor, nem ao Estado-juiz no momento em que age para
efetivar direitos patrimoniais. Esta é, precisamente, a função dos
direitos fundamentais, estabelecer limites ao poder estatal, mesmo
quando há pretensões legítimas em jogo”, afirmou.
Dodge pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que considere
inconstitucional medidas restritivas de liberdade – como a apreensão de
passaporte e CNH e a proibição de participação em concursos e licitações
– como meio de garantir a execução de dívidas. O parecer foi
encaminhado em uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) aberta
pelo PT. O relator é o ministro Luiz Fux.
STJ
Casos do tipo chegam ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde os
ministros têm considerado que a apreensão de passaporte ou CNH não é
ilegal em si, mas deve ter sua adequação analisada no caso a caso.
Em caso mais recente, a Terceira Turma do STJ, confirmou, no último dia
12, a apreensão do passaporte e da CNH de um devedor imposta por um juiz
do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). O valor inicial da causa,
aberta em 2008, é de R$ 54 mil.
A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, considerou não haver
ilegalidade na cobrança pela via indireta de apreensão dos documentos.
Ela ressalvou a possibilidade de reversão da medida caso o devedor
apresente uma solução para o pagamento da dívida.
(Agência Brasil)