O Ceará tem o segundo maior índice do País em número de ações judiciais
que reivindicam direitos relativos à saúde. A média do Estado chega a
78,52 ações dessa área na Justiça para cada grupo de 100 mil habitantes.
As informações são do estudo “Judicialização da Saúde no Brasil: Perfil
das demandas, causas e propostas de solução”, elaborado pelo Instituto
de Ensino e Pesquisa (Insper), a pedido do Conselho Nacional de Justiça
(CNJ). O período analisado pela pesquisa foi de 2009 a 2017,
considerando o ano de distribuição dos processos. O trabalho indica que
haja mais de 1 milhão de ações judiciais de saúde no País.
O trabalho do CNJ havia sido divulgado no mês passado, mas até então sem
o detalhamento dos dados. O documento completo soma 174 páginas. O
primeiro lugar desse índice de judicialização é do Mato Grosso do Sul,
com média de 111,2 processos/100 mil habitantes. O Ceará ultrapassa Rio
Grande do Norte (76,67), Pernambuco (62,05) e Mato Grosso (61,89), que
despontam entre os cinco primeiros. A maior parte dos casos julgados no
Ceará se refere a demandas de atendimento suplementar: 67% dos processos
são sobre seguros, 11% ligados a questões de planos de saúde. Outros
10% das reivindicações no Ceará se referem a disputas na área da saúde
pública. Nacionalmente, os principais entraves judiciais se invertem na
ordem: planos de saúde (30,32%) e seguro (21,16%).
No período 2008-2017, a Justiça cearense julgou 63.149 processos em 1ª
instância que demandavam acesso à saúde e 39.941 foram pautados na 2ª
instância. Foram totalizados mais de 103 mil processos julgados nesses
dez anos pelos magistrados do Estado em questões sobre saúde. No Brasil,
o Ceará tem a maior representatividade desse tipo de ação. Em 2017,
quase 2% dos processos de 1º grau, Turmas Recursais e Juizados Especiais
eram sobre direito à saúde.
O relatório, que se identifica como “analítico propositivo”, reconhece
que havia uma ideia comum no setor de que a maior judicialização da
saúde acontecia nas regiões Sul e Sudeste, o que precisará ser
reconsiderado com a conclusão da pesquisa. O estudo aponta como causa
para este aumento nas demais regiões “a hipótese de que os Estados que
experimentaram uma elevação desproporcional de casos tenham implementado
ações voltadas ao equacionamento das causas da judicialização, seja na
esfera administrativa ou judicial”.
“As pessoas têm mais conhecimento dos direitos delas e os serviços são
mais divulgados, até mesmo via redes sociais. A população também
aumentou, com mais expectativa de vida e com necessidades de saúde as
mais variadas possíveis, isso desemboca numa quantidade maior de
processos”, analisa a defensora pública Karinne Matos, do Núcleo de
Defesa da Saúde (Nudesa), da Defensoria Pública do Ceará. O setor tem
três defensores titulares especializados em representar ações voltadas
para o direito à saúde.
Houve alta de 22% nos registros feitos pelo Nudesa, nos dois últimos
anos, o que também ajuda na explicação. O Núcleo saltou de 6.235
atendimentos, em 2017, para 7.663, em 2018. Encaminhamentos que
receberam um protocolo judicial. Em Fortaleza, 15.232 passaram pelo
Nudesa no ano passado, em busca de algum tipo de assistência ou
orientação. Nos dois primeiros meses de 2019, o Núcleo registrou mais
1.181 atendimentos.
“Pelo perfil dos nossos assistidos, 90% das nossas ações são
direcionadas à saúde pública: alimentação, fraldas, cirurgias, exames
negados pela atenção básica, procedimentos cirúrgicos mais complexos e
medicação para pacientes oncológicos são exemplos de pedidos que fazemos
aqui”, descreve Karinne Matos, dos litígios conduzidos via Defensoria.
“A procura aumenta anualmente, porque as pessoas encontram violações ao
direito à saúde e confiam na instituição (Defensoria) para
solucioná-las”, banca a defensora.
“O principal objetivo desta pesquisa foi o de contribuir para a
compreensão da judicialização da saúde por meio de uma análise de
representatividade nacional, com classificação que identifique tipos de
demandas e características das decisões judiciais. Esse diagnóstico
oferece elementos que podem orientar políticas judiciais para o
aprimoramento da solução de conflitos na área”, aponta o relatório. O
número de demandas judiciais da área da saúde cresceu 130% entre 2008 e
2017, enquanto o número total de processos judiciais aumentou 50%,
aponta os dados do CNJ. O Ministério da Saúde informa ao documento que,
“em sete anos, houve crescimento de aproximadamente 13 vezes nos seus
gastos com demandas judiciais, atingindo R$ 1,6 bilhão em 2016”.
O POVO