O ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) atuou como "arrecadador de
propinas" e também de recursos para abastecer a campanha de seu
sucessor, Luiz Fernando Pezão, em 2014. Detalhes da ação de Cabral para
eleger Pezão estão na ação civil pública que o Ministério Público do Rio
ingressou na Justiça nesta terça-feira, 2, contra os dois e outros
envolvidos no esquema.
Cabral, já condenado a 197 anos de prisão, e Pezão estão atrás das
grades. Cabral vinha negando enfaticamente ligação com desvios de verbas
públicas e corrupção. Agora, mudou de estratégia, virou réu confesso e
disse que o apego ao poder e ao dinheiro "é um vício".
Nesta ação, a Promotoria cobra R$ 325 milhões dos réus, solidariamente,
por propinas supostamente pagas a Pezão a partir de autorização do 4º
aditivo das obras do Metrô.
O aditivo contratual de número 4 ao contrato original de concessão da
Linha 4, único assinado por Pezão, acarretou um incremento de cerca de
R$ 852 milhões ao valor do contrato, "a cargo exclusivamente do
combalido erário estadual fluminense", segundo a ação.
O quarto aditivo, firmado em 29 de dezembro de 2015, elevou o custo total das obras da Linha 4 do Metrô para R$ 9,64 bilhões.
Segundo a investigação, Cabral fazia uma espécie de "transição de
poder", apresentando Pezão e "informando que os esquemas de pagamentos
de propinas seriam a partir de abril de 2014 tratados e
instrumentalizados diretamente com o novo governador do Estado do Rio de
Janeiro" - Cabral renunciou ao cargo de governador em 2 de abril
daquele ano.
"Em tais reuniões, além de explicar essa espécie de transição no esquema
arrecadador de propinas levado a cabo pela alta cúpula do governo do
Estado do Rio de Janeiro, o demandado Sérgio Cabral, com prévio
conhecimento e anuência do demandado Luiz Fernando de Souza (Pezão),
solicitava ainda contribuições/doações para a campanha (de Pezão), pagas
das mais variadas formas, desde doações declaradas até pagamentos por
serviços, mormente de propaganda, sem devida declaração à Justiça
Eleitoral ("caixa 2")", sustenta a Promotoria.
Os pagamentos de caixa 2 podiam ser pagos "com entrega em dinheiro em
território nacional ou ainda no exterior por meio de transações por
empresas offshore".
A investigação foi reforçada com detalhes indicados pelo executivo da
Odebrecht Benedicto Barbosa da Silva Júnior, o "BJ". "O colaborador
exerceu a função de diretor superintendente da área de Infraestrutura da
Construtora Norberto Odebrecht no Brasil - Região Sudeste e desenvolveu
uma relação de proximidade com Sérgio Cabral, que passou para a esfera
pessoal, de modo que se tornaram bem próximos."
"Essa relação se estendeu a Luiz Fernando Pezão; (...) na campanha de
2014 para o governo do Estado do Rio, o então governador Sérgio Cabral
lançou a candidatura de seu vice-governador, Luiz Fernando Pezão, seu
aliado político e também filiado ao PMDB; (...) o governador Sérgio
Cabral atuou como arrecadador de recursos para financiamento de campanha
do então candidato Luiz Fernando Pezão."
Segundo o delator, no primeiro trimestre de 2014, em reunião no Palácio
Guanabara, sede do governo do Rio, o então governador Cabral solicitou a
ele doações para a campanha de seu candidato, Pezão. "BJ" afirma que
atendeu ao pedido de Cabral, concordando em fazer doações para a
campanha com recursos de caixa 2.
"A eleição de Luiz Fernando Pezão representaria a continuidade do
projeto do governador Sérgio Cabral para o Estado do Rio, com a
sequência de projetos de infraestrutura que interessavam à Construtora
Norberto Odebrecht", segue o delator.
Segundo ele, o atendimento aos pedidos de Cabral "visava manter a boa
relação conquistada pela Construtora na sua gestão, durante a qual a
Odebrecht havia conquistado projetos relevantes, e, dessa forma, evitar
embaraços aos projetos existentes e interrupções ou atrasos no fluxo
regular de pagamento dos contratos conquistados".
Na ação, a Promotoria sustenta: "além de propinas recebidas em seu
próprio benefício e de pessoas a si ligadas e oriundas de diversas
fontes corruptoras, o demandado Sérgio Cabral, no primeiro trimestre de
2014, quando ainda exercia o cargo de governador do Estado do Rio, atuou
como arrecadador de recursos para a campanha do demandado Luiz Fernando
de Souza (Pezão), à época seu vice-governador e secretário Estadual de
Obras."
O Ministério Público assinala que o próprio Sérgio Cabral "admitiu em
recente depoimento que no início de 2014 ocorreram diversas reuniões no
Palácio Guanabara com grupos empresarias, dentre os quais o Grupo
Empresarial Odebrecht, nas quais fazia uma espécie de "transição de
poder", apresentando Luiz Fernando de Souza, e informando que os
esquemas de pagamentos de propinas seriam a partir de abril de 2014
tratados e instrumentalizados diretamente com o novo governador do
Estado do Rio".
Estadão Conteúdo