As suspeitas de falsificação nos cadastros das
visitas aos presídios cearenses começaram a resultar em denúncia do
Ministério Público do Ceará (MPCE). Duas 'giriquitas' (denominação para
prostitutas no cárcere) e dois detentos, que participaram de um esquema
criminoso, foram acusados pelos crimes de uso de documento falso e
falsidade ideológica.
A denúncia - obtida pelo Sistema Verdes Mares - foi entregue à
Justiça no dia 24 de maio deste ano e aguarda apreciação do Poder
Judiciário. O Núcleo de Investigação Criminal (Nuinc), do MPCE, abriu a
investigação no ano passado, após o Núcleo de Cadastro de Visitantes
(Nucav), da antiga Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus) - hoje
Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) - desconfiar da troca de
companheiras de dois presos.
Os agentes penitenciários suspeitaram de falsificação quando
receberam, na unidade do Antônio Bezerra, na Capital, a mulher
identificada como Sabrina da Silva Lima, com 18 anos recém completos, no
dia 17 de maio de 2018. Ela desejava se cadastrar como companheira do
interno Wellington Cristhiano Ribeiro, que se encontrava na Casa de
Privação Provisória de Liberdade Agente Elias Alves da Silva (CPPL IV),
em Itaitinga. No dia seguinte, o detento já autorizou a visita de
Sabrina.
Porém, Sabrina levou Sandra Andrea Sales do Nascimento, a
ex-companheira de Wellington, para testemunhar a declaração de união
estável entre os dois, com suposta convivência há mais de um ano. Sandra
visitava o companheiro no presídio, regularmente, em 2017, entre os
dias 20 de agosto e 9 de dezembro. O preso cancelou a visita de Sandra
em 11 de janeiro do ano passado. As duas mulheres ainda usaram o mesmo
endereço no cadastro, que seria da residência da mãe de Sandra Andrea.
Falsas
O Ministério Público concluiu, na denúncia, que as informações
apresentadas pelas mulheres ao Nucav eram "inverídicas, ideologicamente
falsas, assim empregadas com o único escopo de cumprir os requisitos
legalmente exigidos e, via de consequência, lograr êxito em acessar as
dependências da unidade prisional, quiçá com o escopo de repasse de
materiais ilícitos".
Dois dias antes do pedido de Sabrina, em 15 de maio do ano passado,
Sandra Andrea apresentou ao Nucav uma declaração de união estável, há
mais de um ano, com outro interno da CPPL IV, Benedito Carneiro Barreto.
Ao ser questionada pelo MPCE, Sandra voltou atrás, disse que mantinha
relação com Benedito há cinco meses, mas que nunca conviveu com ele.
Bruxo
O preso, por sua vez, confirmou aos promotores que não conhecia
Sandra e que "vendeu seu nome" por apenas R$ 100, para que Sandra
pudesse entrar na unidade penitenciária. Na linguagem dos detentos,
Benedito era o 'bruxo' do esquema criminoso e Wellington, o 'patrão',
que comprava o nome do colega de cárcere para receber outra visita além
da que tinha direito. O MPCE entendeu que as duas mulheres não tinham
união estável com os internos.
Sandra Andrea do Nascimento e Sabrina Lima foram acusadas por uso de
documento falso, enquanto Benedito Barreto e Wellington Ribeiro foram
denunciados por falsidade ideológica. A defesa dos investigados não foi
localizada pela reportagem.
Outras investigações
Pelo menos 12 investigações contra falsificações no sistema de
visitas dos presídios cearenses, para corroborar com a prostituição,
estão em andamento no MPCE. Além das 'giriquitas' e dos presos, existe a
suspeita sobre agentes penitenciários que se corrompiam para corroborar
com o esquema criminoso.
Reportagem do Diário do Nordeste publicada em 30 de abril do ano passado
mostrou que a participação dos servidores foi descoberta a partir da
Operação Masmorras Abertas - que combatia crimes cometidos por
servidores públicos no sistema penitenciário.
Ainda não há registros de falsificações nas visitas neste ano.
Questionada sobre as mudanças no sistema de cadastro de visitantes, a
SAP afirmou que "a suspensão da visita íntima nas unidades prisionais
encerrou o mercado ilegal da prostituição dentro do sistema
penitenciário cearense". "Os mecanismos de controle e verificação de
visitantes das unidades não podem ser detalhados e devem se manter em
sigilo por uma questão de segurança aos agentes penitenciários,
servidores e os próprios internos", disse a SAP.
(Diário do Nordeste)