Relatório divulgado hoje (17) pela organização não governamental (ONG)
Humans Rights Watch (HRW) afirma que os grupos que desmatam a Amazônia
praticam ameaças e assassinatos para invadir terras de comunidades
tradicionais. De acordo com o pesquisador da ONG César Muñoz, as
organizações que atuam em diversas atividades ilegais mantêm conexões,
formando redes criminosas.
“Essas redes criminosas têm contato entre elas e atuam com diversos
atores que estão em diversas funções ilegais. Então, você tem o grupo
que faz extração ilegal de madeira, tem outro especializado em grilagem e
outro esquentando a madeira”, afirmou durante a apresentação das
conclusões.
O trabalho foi elaborado a partir de dois anos de pesquisa, com visitas a
três estados, e 170 entrevistas, parte por telefone, com moradores da
região e agentes públicos. “Viajamos por vários estados da Amazônia e
documentamos padrões de violações de diretos em pelo menos 12
comunidades”, ressaltou Muñoz.
Um dos principais fatores que possibilita a ação das redes criminosas na
região é, segundo o relatório, a falta de apuração das mortes e
ameaças. Dos mais de 300 assassinatos ligados a conflitos fundiários
registrados na região pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), desde 2009,
apenas 14 foram julgados. Para elaboração do documento, a HRW analisou
em profundidade 28 casos ocorridos depois de 2015.
De acordo com Muñoz, não há dados do Poder Público sobre a violência
ligada às disputas pela terra na região. “Os casos de violência e
ameaças estão em muitos lugares da Amazônia. E esse é um dos problemas,
nenhuma autoridade federal ou estadual compila os casos”, enfatizou o
pesquisador. As informações da CPT tem baseado as ações do Ministério
Público Federal, que usou esses registros na elaboração da publicação
Violências Praticadas contra Defensores de Direitos Humanos no Campo
Possibilidades de Atuação, lançada em abril deste ano.
A falta de responsabilização dos crimes começa, de acordo com o
pesquisador, com a forma como são conduzidas as investigações. Muñoz
disse que, em vários casos, os delegados admitiram que não houve sequer
autópsia dos corpos de pessoas assassinadas nesses crimes. “Eles
reconhecem os problemas e falam que os crimes acontecem em lugares muito
longe”, disse sobre a má qualidade das investigações.
A situação só muda, segundo o pesquisador, quando os crimes ganham
repercussão para além da região, aumentando a pressão sobre as
autoridades. “Temos casos onde houve ação penal do Ministério Público,
porque houve investigação da polícia, porque houve repercussão nacional.
Isso mostra que é possível fazer”, destacou.
Nesse sentido, uma das recomendações do relatório é que a violência
contra os agricultores e comunidades tradicionais na Amazônia passe a
ser acompanhada diretamente pelo governo federal. O documento aponta a
necessidade que as autoridades federais registrem os casos de violência
relacionada a disputas pela terra e identifiquem os padrões de violação
de direitos das pessoas que vivem nessas áreas.
A coordenadora da Articulação de Mulheres Indígenas do Maranhão, Maria
Helena Gavião, disse que se sente desamparada diante das ameaças e
agressões contra sua comunidade. “As pessoas não se intimidam mais,
entram diretamente dentro do território, de dia e de noite”, disse em
relação aos grupos que fazem o desmatamento ilegal dentro da terra
indígena. “O povo, as autoridades não estão nem aí para os povos
indígenas”, reclamou.
O relatório aponta os índios como fator de proteção da floresta. Nas
terras indígenas, muitas vezes, o desmatamento é muito menor até mesmo
do que em áreas de proteção ambiental, devido ao esforço feito pelas
comunidades. É justamente por isso, segundo documento, que essas pessoas
são ameaçadas e mortas.
“As vítimas receberam ameaças antes de serem atacadas e mortas. Se as
autoridades tivessem levado essas denúncias a série e investigado, essas
pessoas ainda poderiam estar vivas”, ressalta o diretor da HRW, Daniel
Wilkinson.
Em agosto, após o aumento das queimadas na região amazônica, o governo
federal iniciou a Operação Verde Brasil, levando 7 mil homens das Forças
Armadas para a floresta. Desde o início da ação, no último dia 24 de
agosto, os militares combateram mais de 400 focos de incêndio,
apreenderam cerca de 17 mil metros cúbicos de madeira e aplicaram multas
em um total de R$ 22,5 milhões.
Foram apreendidos caminhões, tratores, carretas, motos, motosserras e
embarcações utilizadas no desmatamento ilegal e em garimpos
clandestinos. Foram interditadas quatro madeireiras dentro da terra
indígena Alto Turiaçu, com a destruição de dez acampamentos e oito
pontes clandestinas.
Agência Brasil