Fraudes em licitações nas prefeituras na mira do MPCE


Desde o ano passado, o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) acionou pelo menos 13 prefeituras, câmaras de vereadores ou agentes públicos, ainda em exercício dos cargos ou fora deles, por suspeitas de fraudes em licitações. É o que mostra levantamento do Sistema Verdes Mares feito a partir de ações do MPCE divulgadas pelo próprio órgão desde janeiro de 2019. São casos de possíveis superfaturamentos, restrição à ampla concorrência, contratação de terceiros e licitações por “cartas marcadas” que ferem os princípios da boa gestão pública. Há investigações em andamento, inclusive, que abrangem suspeitas de organizações criminosas com atuação em diferentes municípios. 

Em ano eleitoral, a atenção dos órgãos de fiscalização é redobrada para que não haja conluio entre empresas e candidatos. Em paralelo, Ministério Público, Tribunal de Contas do Estado e Controladoria-Geral apostam em novas tecnologias de transparência dos gastos públicos e em diálogo com população e gestores. 

“Essas fraudes em licitações, às vezes, são muito difíceis de serem detectadas porque, do ponto de vista legal, elas estão perfeitas. É preciso que alguém que tenha participado da trama nos revele ou que a gente consiga identificar algum dado que nos dê a possibilidade de caminhar ao encontro da prova”, afirma a coordenadora da Procuradoria de Crimes Contra a Administração Pública (Procap), Vanja Fontenele. 

Nos últimos meses, a Procap deflagrou duas grandes operações na área. Em dezembro, a Procuradoria e a Polícia Civil deflagraram a operação “Coisas de Pai”, que cumpriu 13 mandados de busca a apreensão nas sedes da Prefeitura de Assaré e de empresas situadas no Município, em Juazeiro do Norte e em Fortaleza, bem como em imóveis de residência do prefeito Evanderto Almeida e de outros suspeitos. 

“Coisas de Pai” investiga suspeitas de crime de peculato em diversas contratações, como no fornecimento de combustíveis, realização de obras e na locação de veículos, com suspeita de participação do gestor municipal. 

Em agosto, já havia sido deflagrada a Operação Norteiras, em Antonina do Norte – cidade vizinha a Assaré, para investigar fraudes em licitações, inexecução contratual e sobrepreço para a execução do serviço de limpeza pública. A operação chegou a apreender mais de R$ 260 mil em dinheiro vivo, no quarto do prefeito Evandro Arrais.

A reportagem não conseguiu contato com os gestores municipais citados. 
“A nossa dificuldade é encontrar a conduta do agente com essa prerrogativa. A licitação não é conduzida pelo prefeito, elas são conduzidas por secretários, pelo presidente da comissão de licitação... Em tese, não tem a participação direta do prefeito. Há casos em que, na verdade, ele seria uma ‘vítima’”, pontua Vanja Fontenele. 

Quando não há indícios de envolvimento de prefeitos, as investigações são guiadas por promotorias locais ou outros grupos de atuação especializada, como o Grupo Especial de Combate à Corrupção (Gecoc) e o Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco). 
“O Ministério Público busca, como fiscal da lei, analisar as contas públicas e verificar a existência de alguma ilegalidade. Quando é verificado que há desvio, busca-se a responsabilização criminal das pessoas que participam da fraude”, afirma o promotor Oigrésio Mores, da Promotoria de São Benedito. 

No ano passado, Mores ajuizou Ação Civil Pública (ACP) por improbidade administrativa com pedido de ressarcimento ao erário contra uma ex-secretária de Saúde da Prefeitura de São Benedito e uma ex-pregoeira, além dos responsáveis pela empresa BT Locação e Limpeza LTDA. 
O grupo é investigado por irregularidades no aluguel de veículos para a Secretaria da Saúde. Segundo o promotor, houve sobrepreço e superfaturamento, causando enriquecimento indevido da empresa. O mesmo promotor pediu à Justiça a condenação de ex-gestores da Prefeitura de Carnaubal, cidade vizinha, por fraude no aluguel de veículos com a mesma empresa. 

“Temos notado uma profissionalização de algumas empresas em fraudar licitações. Há empresas que têm expertise no sentido de direcionar licitações e fraudar a concorrência”, pontua Mores. Ele conta que já foi procurado por licitantes que se disseram ameaçados ou que receberam ofertas para se abster de participar de concorrências. 

Em agosto, o Gaeco deflagrou a Operação Display, abrangendo Limoeiro do Norte, Pacajus e Quixeré, que cumpriu sete mandados de busca e apreensão em residências e empresas em Limoeiro e Fortaleza, além de Mossoró, no Rio Grande do Norte. O grupo investiga suposto conluio de empresas em licitações. 

“Esse trabalho de fiscalização é muito importante porque é um trabalho preventivo, corretivo para direcionar a administração pública a selecionar a proposta mais vantajosa, mais eficiente e com menor impacto no orçamento público”, ressalta o promotor Alan Moitinho Ferraz. 


(Diário do Nordeste)

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