Quando Gerardo Alves Mascarenhas, de 39 anos, o
'Pirata', foi preso pela Polícia Civil do Ceará, em 26 de setembro de
2019, ele estava em Coreaú, na Região Metropolitana de Sobral. Natural
da cidade do interior, o miliciano já estava há 18 dias morando no
local. Ele veio à sua terra natal, em fuga, após o Ministério Público do
Rio de Janeiro (MPRJ) requerer sua prisão por integrar a organização
criminosa "Escritório do Crime".
A milícia é suspeita de ter cometido uma série de crimes na região de
Rio das Pedras, na Zona Oeste do Estado, e de ter assassinado a
vereadora carioca Marielle Franco e o seu motorista Anderson Gomes. Além
disso, a principal liderança do grupo, o miliciano Adriano Magalhães da
Nóbrega, o 'Capitão Adriano', foi morto pela Polícia Militar da Bahia,
em 9 de fevereiro deste ano.
Adriano Nóbrega já havia sido homenageado pelo senador Flávio
Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, enquanto
deputado estadual no Rio de Janeiro. Além disso, a esposa e a mãe de
Adriano foram funcionárias de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio.
Mas Gerardo Mascarenhas não é o único cearense integrante da milícia,
com ele juntam-se Benedito Aurélio Ferreira Carvalho, o 'Aurélio',
preso em janeiro de 2019; e Fabiano Cordeiro Ferreira, o 'Mágico', em
outubro. Eles entraram com habeas corpus no Tribunal de Justiça do Rio
de Janeiro, mas foram negados pela 4ª Vara Criminal em fevereiro deste
ano.
Enquanto Gerardo Mascarenhas é natural de Coreaú, Benedito Aurélio
nasceu em Barroquinha, no Norte do Estado. Além da veia cearense, ambos
também compartilham o mesmo modus operandi no "Escritório do Crime". De
acordo com o MPRJ, os dois eram os principais "laranjas" da milícia e
cediam seus nomes para serem sócios de supostas empresas; algumas delas
eram responsáveis pela construção de edifícios irregulares na Zona Oeste
do Rio de Janeiro.
Braço armado
Gerardo e Benedito aparecem como sócios das empresas "Depósito e
Distribuidora de Bebidas dos Amigos" e "São Jorge Construção Civil",
ambas ficam localizadas nos territórios de atuação da organização
criminosa, conforme o Ministério Público. O órgão conseguiu, por meio de
conversas telefônicas interceptadas com autorização da Justiça,
confirmar que as empresas são citadas pelos denunciados em ligações
internas.
Benedito também aparece como sócio da empresa "São Felipe Construção
Civil". De acordo com as investigações do MPRJ, o "Escritório do Crime"
manejava ainda contas bancárias em nome dos dois cearenses. A relação
entre os dois era tão forte que um telefone utilizado por Benedito era
registrado no nome de Gerardo. Eles seriam, ainda, subordinados ao mesmo
chefe, Manoel de Brito Batista, o 'Cabelo', que detinha maior
influência na organização criminosa e era considerado o "gerente armado
da quadrilha".
Enquanto Benedito atuava como um dos principais funcionários dele,
Gerardo era seu segurança, caracterizado pelo MPRJ como "braço armado da
quadrilha".
E o mágico?
Já Fabiano Cordeiro Ferreira, o 'Mágico' é natural de Ipueiras, no
Sertão de Crateús. Ele foi um dos últimos denunciados pelo MPRJ a serem
capturados em 6 de outubro de 2019. Fabiano era procurado desde janeiro
do mesmo ano pela ligação com o grupo paramilitar e por homicídios. Ele
atua na milícia do Rio das Pedras, pelo menos, desde 2008, e o seu nome
aparece de forma destacada do Relatório Final da CPI das Milícias, como
um dos principais executores da organização criminosa que age no Rio.
Na denúncia recebida pela Justiça, Fabiano é considerado "braço
armado, espécie de soldado da organização criminosa, agindo sob os
comandos da liderança em ações armadas, sobretudo, na prática de
homicídios e cobrança de taxas aos moradores e comerciantes das
localidades dominadas".
Conforme o MPRJ, ele e seus comparsas cobravam
mais de R$ 100 por semana de cada comerciante da região, sob ameaça de
tomar os estabelecimentos comerciais.
Além disso, 'Mágico' também é um dos suspeitos de ter assassinado um
homem identificado como Júlio de Araújo, em 24 de setembro de 2015.
Segundo o MPRJ, ele foi assassinado por queima de arquivo, uma vez
que ele teria presenciado o homicídio de um outro homem, identificado
como Jerre Adriano da Silva Gouveia, no mesmo dia. Fabiano "concorreu
eficazmente para a prática do crime, na medida em que prestou auxílio
moral e material, com a presença encorajadora no local, estímulo comuns
com os demais asseclas ainda não identificados, desempenhando todas as
demais atividades necessárias à execução da vítima", escreveu o MPRJ.
Situação atual
Atualmente, os três réus cearenses estão presos. Em nota, o Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) informou que, "em fevereiro deste
ano, Gerardo e outros réus entraram com pedido de Habeas Corpus, mas
foram negados pela 4ª Câmara Criminal". A denúncia da nova empreitada
contra integrantes da milícia, realizada no fim de janeiro deste ano, de
acordo com o Tribunal, "está em segredo de Justiça, como todos os casos
da Vara Criminal Especializada" e, por isto, não haveria acesso aos
detalhes.
No Ceará
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará
(SSPDS-CE) informou que a prisão de Gerardo Mascarenhas, em Coreaú, "foi
fruto de uma troca de informações entre as polícias Civis do Ceará e do
Rio de Janeiro sobre o paradeiro do homem, à época foragido da
Justiça". Segundo a Pasta, os três cearenses não registram antecedentes
criminais no Ceará e não são investigados por delitos praticados no
Estado.
Já o Ministério Público do Ceará (MPCE) afirmou por meio de nota que
"por parte do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate às
Organizações Criminosas), não há investigação que envolva as três
pessoas (Gerardo, Benedito e Fabiano)". De acordo com o órgão, desta
forma, não haveria como "dar qualquer declaração referente à possível
atuação deles no Ceará, ou envolvimento com grupo criminoso do Estado".
Investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro dão conta da
presença de três cearenses entre os principais milicianos do "Escritório
do Crime". Em fevereiro deste ano, eles pediram habeas corpus à
Justiça, mas foram negados
(Diário do Nordeste)