Um estudo realizado por
pesquisadores brasileiros independentes e voluntários aponta o Brasil como o
novo epicentro de coronavírus no mundo. De acordo com o levantamento, até 4 de
maio, o país tinha entre 1,3 milhão e 2 milhões de casos confirmados da doença,
mais do que o registrado nos Estados Unidos, atual epicentro, com 1,2 milhão de
casos, segundo o monitoramento da universidade americana Johns Hopkins.
O número apresentado no Portal
Covid-19 foi calculado com base em modelos matemáticos que têm como base a Taxa
de Letalidade da Coreia do Sul, um dos poucos países que tem conseguido
realizar testes em massa - o que sugere que o índice seja mais próximo do real.
A Taxa de Letalidade dos Casos é ainda ajustada a partir de um deslocamento
temporal entre o registro de óbitos e a confirmação de casos. O estudo estima
que o Brasil já tenha entre 10 mil e 12 mil mortos por coronavírus.
“O Brasil é hoje o principal foco
da epidemia no mundo. O atraso dos resultados e a subnotificação nos levam a
lidar com números muito distantes da realidade. Não estamos conseguindo
gerenciar a pandemia. O que estamos fazendo é apenas lidar com os casos de
internação, mas sem um cenário preditivo", explica à Crescer o professor
Domingos Alves, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de
São Paulo (USP), que integra a equipe do Portal Covid-19.
Oficialmente, segundo dados
divulgados pelo Ministério da Saúde nesta segunda-feira (4), o Brasil tem
107.780 casos de coronavírus e 7.321 mortes causadas pela doença. Ainda de
acordo com o governo, 1.427 óbitos permanecem em investigação. O próprio
ministério admite, porém, que apenas pacientes internados são testados para
coronavírus no país. Os casos de assintomáticos ou pessoas com sintomas leves
não são sujeitos à testagem e, portanto, não são notificados.
“A média mundialmente aceita de
pacientes que precisam ser hospitalizados por Covid-19 gira em torno de 15%. Se
temos hoje 107 mil casos notificados no boletim oficial, e sabemos que, por
falta de testes, só estão sendo testadas pessoas internadas, não é difícil
concluir que 85% das pessoas contaminadas com a Covid-19 não aparecem na
estatística. Isso se levarmos em consideração apenas as falas do próprio
governo. Sabemos, porém, que os números são ainda maiores”, explica Domingos
Alves.
São Paulo concentra a maior parte
das notificações, com 32.187 casos e 2.654 mortes, segundo o Ministério da Saúde.
Já segundo o Portal Covid-19, o total real de casos varia entre 421,7 mil e
650,9 mil. O Rio de Janeiro, que aparece em segundo lugar no país, tem 11.721
casos e 1.065 óbitos registrados oficialmente. A estimativa, porém, aponta
entre 152,3 mil e 244 mil casos da doença até 4 de maio.
“O que mais nos preocupa hoje é o
número de casos ocorrendo nas cidades do interior, com uma infraestrutura muito
menor do que a observada nas capitais. Isso pode fugir do controle dos gestores
estaduais. O que as pessoas não estão levando em consideração é que o atraso de
medidas mais rígidas, a falta de gestão da pandemia, representa vidas que
poderiam estar sendo salvas”.
Isolamento e 'lockdown'
O Brasil tem hoje uma taxa de
distanciamento de 50%, muito abaixo da considerada ideal, em torno de 70%.
Ainda assim, os números mostram que o isolamento praticado até aqui reduziu o
número de mortes no país, que poderia ser ainda mais alarmante. “Estimamos que
os números de óbitos seriam de 3 a 4 vezes maiores se não tivéssemos esse nível
de isolamento”, explica Alves.
Na opinião do pesquisador, não é
momento de flexibilizar a circulação de pessoas. Pelo contrário, estudiosos do
Portal Covid-19 acreditam que, para evitar ainda mais mortes, o chamado
"lockdown" - que impõe a restrição de circulação - deveria ser
adotado quando a ocupação de leitos hospitalares nas capitais estiver em 70% -
ou 60% no caso de cidades do interior, que têm menor infraestrutura de saúde.
Em São Paulo, a taxa de ocupação de leitos já ultrapassa os 80%. No Rio, o
índice já passa de 90%. Ainda assim, apenas 4 cidades brasileiras - todas no
Maranhão - já adotaram o "lockdown".
“Se formos rigorosos agora,
talvez daqui um mês possamos tomar medidas de relaxamento como o que está
ocorrendo em Portugal, Nova Zelândia e Alemanha. Se não o fizermos, estaremos
cada vez mais parecidos com o cenário dos EUA e o Equador, com muitos mortos em
casa por falta de atendimento.”