As mudanças impostas pela pandemia de Covid-19 afetaram, em absoluto,
todos os setores da sociedade, evidenciando o despreparo de muitos
deles diante da crise sanitária. A Educação, então, foi uma das mais
impactadas, com uma guinada de 180 graus na rotina de professores e
estudantes. Entre os profissionais do Ceará, 91% não tinham experiência
alguma com ensino remoto antes da pandemia - e outros 62% afirmam que
não estão recebendo formação ou suporte das instituições para o trabalho
online.
Os dados são da pesquisa "Trabalho Docente em Tempos de Pandemia",
realizada em diversos estados do País pelo Grupo de Estudos Sobre
Política Educacional e Trabalho Docente (Gestrado/UFMG), em parceria com
a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Quase 16
mil professores responderam ao questionário online, entre 8 e 30 de
junho, 2.235 deles cearenses, sendo esta maior amostra entre todos os
estados.
O estudo buscou informações sobre condições de trabalho, relação com
estudantes, formação profissional e impactos na saúde mental dos
docentes no cenário atual. A maioria (84%) das respondentes foi de
mulheres; e 89% atuam em escolas municipais, 5% em estaduais, outros 5%
em ambas, e 1% em federais. Além disso, 41% dos professores lecionam nos
anos finais do ensino fundamental, 29% na educação infantil e outros
22% nos anos iniciais do EF.
O resultado principal foi o retrato, em números, dos impactos de uma
adaptação forçosa e repentina ao ensino online, sem formação prévia dos
professores, como avalia Adriana Borges, professora e pesquisadora do
Gestrado.
"Nesse momento, é como se eles tivessem que trocar o pneu com o carro em movimento. A tecnologia sempre foi subutilizada nos sistemas educacionais. E a questão não é só utilizar os equipamentos, mas como estabelecer um processo educacional com um aluno que não está presente. Os professores não foram ensinados", pondera.
Além das formações inicial e continuada deficientes no que tange à
utilização da tecnologia para o ensino, os professores não têm tido
suporte no momento atual: para 61,9% deles, o processo de dar aulas
online no Ceará é tocado por conta própria. Outros 16,4% dizem ter
acesso a tutoriais online sobre como utilizar as ferramentas virtuais;
9,5% têm formação oferecida pela Secretaria da Educação; 7,2% são
assistidos por outra instituição; e 4,9% pela própria escola.
"Uma coisa é os professores não terem tido essa formação
anteriormente. Mas pensar que no momento atual eles estão sendo
convocados para realizar essas mudanças e não estão recebendo suporte é
bem complicado. Nesse momento de crise, é necessário que as secretarias
deem suporte", frisa a pesquisadora, apontando ainda que esse
"despreparo" aumenta a sobrecarga. De acordo com a pesquisa, mais de
três a cada quatro professores afirmam que o tempo de planejamento das
aulas remotas aumentou.
Em nota, a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc) garante que "tem
apoiado alunos e educadores para o uso de aparatos tecnológicos a fim de
facilitar a conexão e a operacionalização dos recursos digitais neste
período de ensino domiciliar". Segundo a Pasta, um "Guia de Apoio aos
Estudos Domiciliares" foi criado "com o objetivo de compartilhar
estratégias pedagógicas para estabelecer rotinas de estudos e de
aprendizagem".
Ainda conforme a Secretaria, têm sido ofertadas "oficinas voltadas
aos professores sobre planejamento de aulas virtuais, para dar suporte a
educadores e escolas no processo de migração emergencial para ensino
remoto".
A Secretaria Municipal de Educação (SME) de Fortaleza também foi procurada, mas não respondeu até o fechamento desta reportagem.
(Diário do Nordeste)