Dinheiro de corrupção recuperado, políticos e empresários presos.
Investigações contestadas, vazamentos e disputas internas. Em seis anos,
a Operação Lava Jato enfrentou diversos cenários. Para uns, mudou a
concepção de impunidade no Brasil, mas, na visão de outros, cometeu
ilegalidades. Diante de erros e acertos, a marca Lava Jato vive um dos
momentos cruciais e incertos, avaliam juristas consultados pelo Sistema
Verdes Mares.
Uma queda de braço entre integrantes da Operação e o Procurador-Geral da
República, Augusto Aras, nas últimas semanas, deu o tom do nível de
interlocução na condução de uma investigação que levou para a cadeia um
ex-presidente da República e o maior empreiteiro do País.
Logo após o anúncio do pedido de demissão de um grupo de procuradores
envolvidos nas investigações, em junho, o PGR divulgou nota rebatendo as
críticas recebidas.
A saída dos procuradores teria relação direta com discordâncias com a
coordenadora do setor do Grupo de Trabalho da Lava Jato, a
subprocuradora-geral Lindora de Araújo, e à gestão de Aras na chefia do
Ministério Público Federal. "A Lava Jato, com êxitos obtidos e
reconhecidos pela sociedade, não é um órgão autônomo e distinto do
Ministério Público Federal, mas sim uma frente de investigação que deve
obedecer a todos os princípios e normas internas da instituição",
declarou Aras.
Nessa semana, o Conselho Nacional do Ministério Público, presidido por
Aras, abriu o 19º processo contra o coordenador da força-tarefa da
Operação, o procurador Deltan Dallagnol. O órgão agendou para agosto o
julgamento de um processo em que Dallagnol responde pela apresentação de
um PowerPoint para destacar imagens e gráficos que apontavam o
ex-presidente Lula como o centro de uma organização criminosa.
Setores partidários têm criticado a saída de Sérgio Moro da Operação, em
2018, para entrar na seara política, ao assumir o Ministério da
Justiça.
O ex-juiz e o procurador Dallagnol foram os principais interlocutores
das investigações nas redes sociais, participando de entrevistas à
imprensa e oferecendo palestras pelo País nos últimos anos. Agora,
críticas tentam relacionar o trabalho dos investigadores com interesses
políticos.
Lados opostos
Para o doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul (PUC-RS), Fabriccio Steindorfer, é preciso encarar a Lava
Jato sob duas perspectivas. A primeira, institucional.
"É lógico que ela (Lava Jato) teve o grande serviço de expor a
corrupção, da forma que nunca tinha acontecido no País. Sempre soubemos
que no Brasil houve corrupção, mas nunca se tomou uma providência
concreta. E a Lava Jato foi um marco nesse sentido", frisa.
As investigações, no entanto, para o jurista, também precisam ser
observadas a partir dos seus integrantes, de quem as conduziu. "As
instituições responsáveis como um todo estão passando por um processo de
desgaste, muito proveniente de ataques de diversas correntes
ideológicas. Mas, de certa forma, ajudadas pela própria postura de
certos agentes públicos, que não são maioria, mas que muitas vezes
terminam manchando diversas instituições".
Falta de apoio
Para o professor de Direito do Ibmec-MG, Vladimir Feijó, o fôlego das
investigações não é o mesmo e indica um fim tão logo. A falta de apoio
das ruas, pelo cansaço das manifestações e pela pandemia da Covid-19,
não alimenta a defesa da Operação. Nos últimos dias, as investigações
foram direcionadas a membros do PSDB, como o senador José Serra, eleito
por São Paulo.
Para Feijó, as ações movidas nesse momento, em casos próximos de
prescrição, fazem parte da estratégia de sobrevivência da Operação.
"A minha impressão é que a força-tarefa parece estar soltando algumas
linhas de investigação contra outros partidos para tentar minimizar um
pouco as críticas que ela sempre recebeu por ser partidária".
Longevidade
Doutor em Direito e professor da Universidade Federal do Ceará, Daniel
Maia diz ser "indiscutível a importância da Lava Jato para o Brasil",
mas pontua que "tudo na vida tem um começo, meio e um fim", e que a
"Operação está se esticando demais a ter um fim".
Segundo o jurista, "não há sentido que se dê o nome de Lava Jato a fase
41, 42, 43, e assim por diante. Teria que fazer novas operações".
Maia ressalta que a "Operação conseguiu atingir pessoas poderosas,
conseguiu punir exemplarmente pessoas poderosas, entre elas o
ex-presidente Lula". O professor aponta como um dos seus acertos "o fato
da mudança cultural que ela impôs ao País". "Hoje todo brasileiro sabe
que não importa se você é rico, poderoso, se você é um político. Se você
errar será punido".
Doutor em direito, o professor da Universidade Federal do Ceará, Felipe
Braga, relata que a Operação, no decorrer dos anos, foi sendo
fragilizada porque foram expostos os erros processuais. "A gente tinha
visto um grande clamor punitivo que pressionava de certo modo o
julgador, e o ex-juiz Sérgio Moro entrou nesse jogo. A gente sabe que o
magistrado não pode se deixar seduzir por palmas, mas não foi o que ele
fez", analisa Braga.
Braga lembra a dificuldade de fazer uma apuração contra nomes poderosos
do mundo da política e do mercado financeiro, e pontua que as
investigações desnudaram esquemas de corrupção, mas houve atropelos
processuais.
165 condenações no País
As investigações conseguiram condenar em primeira e segunda instância 165 pessoas envolvidas em desvios de corrupção.
O POVO