Moléculas criadas a partir de plantas podem bloquear a entrada do coronavírus nas células, diz pesquisa de universidade do Ceará

 Arabidopsis thaliana, uma das plantas de onde são extraídas proteínas para o estudo da UFC. — Foto: Ramunė Vakarė/BioDiversity4All/UFC/Reprodução

Um estudo realizado pela Universidade Federal do Ceará (UFC) resultou na criação de moléculas que impedem a entrada do coronavírus nas células humanas e, com isto, reduzem a infecção do vírus. As substâncias bloqueiam a utilização de uma proteína e atrapalham o processo de proliferação do SARS-Cov-2 no corpo humano.

Pesquisadores do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular e do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos da UFC validou in vitro (pondo as moléculas em contato com o vírus in natura) a função das moléculas do tipo peptídeos como agentes capazes de impedir que o coronavírus use a proteína spike (também chamada de espinho), a principal chave de entrada, para se conectar à proteína ACE2, localizada na superfície da membrana das células humanas.

Anteriormente, em um primeiro estudo publicado em julho de 2020, considerado pioneiro, a equipe de pesquisadores atestou a eficiência in silico (por simulação) dos peptídeos, que bloqueiam a ação do vírus da Covid-19, impedindo a ligação com o organismo e evitando a infecção.

Interagindo com o vírus, os peptídeos alteram a proteína spike, retirando dela essa possibilidade de conexão. A ideia é que, uma vez modificada a spike e neutralizada essa chave de entrada do vírus, a infecção ou a replicação dele não ocorra, ou aconteça em nível reduzido, aliviando ou extinguindo os sintomas da Covid-19.

Retiradas de plantas

No total, quatro peptídeos sintéticos foram usados nos testes, todos eles desenhados com proteínas extraídas de plantas: dois deles, batizados de PepKAA e PepGAT, foram desenhados a partir de proteínas da espécie de planta Arabidopsis thaliana. Já as moléculas batizadas de Mo-CBP3-PepII e RcAlb-PepI foram criadas a partir de proteínas das espécies acácia-branca (Moringa oleifera) e mamona (Ricinus communis).

Apesar de todos terem apresentado a habilidade de proteger as células contra infecção em algum nível, dentre os quatro, o que apresentou melhores resultados foi o PepKAA. Nos testes de inibição da formação de placas infectadas, esse peptídeo em específico alcançou cerca de 60% no nível de inibição, nas duas concentrações aplicadas (0,15 e 0,30 mg), além de ter apresentado maior sinergia na interação com a proteína spike do vírus.

“O PepKAA de fato se mostrou o mais relevante. Isso é interessante, porque nas predições feitas nos cálculos computacionais [in silico] ele foi o melhor. Muitos peptídeos são ativos, mas possuem diferentes níveis de toxicidade, e isso não acontece com o PepKAA”, aponta ainda Pedro. “Outra grande vantagem dele, em relação a outros estudos com peptídeos, é que ele interagiu com o vírus in natura, que é a forma mais resistente do vírus”.

    O caminho até que os peptídeos se transformem em fármacos, porém, ainda é longo, já que requer novas pesquisas, com alto nível de investimento. “O próximo passo é partir para teste in vivo com animais e in vitro com células humanas, para ver o comportamento dos peptídeos. A principal ideia é usá-los como aerossol, que será inalado, ou como um fármaco na forma de comprimido. As aplicações para o desenvolvimento de fármacos são as mais diversas”, projeta o pesquisador.

In vitro

A validação in vitro ocorreu por meio da utilização de células Vero E6, isoladas a partir de rins de macacos. Inicialmente, os peptídeos foram incubados com o SARS-CoV-2 e depois postos em contato com uma camada dessas células Vero E6. Como resultado, todos os peptídeos testados impediram significativamente a formação de placa viral nas células.

    “Esse experimento simula muito bem o que ocorre com nossas células durante a infecção pelo vírus”, explica Pedro Filho Noronha de Souza, um dos pesquisadores responsáveis pelo estudo. “É geralmente nesse ensaio que as drogas falham, porque a carga viral é muito alta. Mesmo assim, nossos peptídeos foram efetivos em reduzir a formação da placa viral, mantendo as células vivas”, destaca.

Uma forma de avaliar se as células estão vivas, mesmo após a infecção por coronavírus, é verificando a viabilidade por meio de um teste com o composto químico MTT. Normalmente de cor amarela, esse composto muda para a cor roxa ao entrar em contato com células vivas; caso não haja viabilidade celular, o composto não tem alteração.

“O teste do MTT é utilizado para verificar a viabilidade celular. Quanto maior o número de células vivas, maior é a efetividade dos peptídeos contra o vírus. Isso acontece porque, quando o vírus infecta uma célula e vai ser liberado dela, depois de se replicar, ele mata as células”, explica Pedro.

Nos testes com as células infectadas e os peptídeos sintéticos, a mudança de coloração foi constatada, permitindo o entendimento de que, mesmo com a infecção, os peptídeos mantiveram as células vivas. 



(G1/CE)

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