Em 16 anos de lei Maria da Penha, mulheres se sentem mais seguras, mas luta contra violência persiste

 Lei Maria da Penha completa 16 anos, mas mulheres ainda têm dificuldade para denunciar

A lei Maria da Penha, que completa 16 anos neste domingo (7), passou por diversos avanços e alterações nesse período. Apesar de representar um marco para a efetividade da segurança e do direito da mulher, denunciar casos de violência, para muitas, ainda é um momento de dificuldade e um motivo de discriminação.

"Pensei mil vezes antes de denunciar meu marido, não só pelos meus filhos que sofreriam com isso, mas por imaginar o que as pessoas falariam, seria o de sempre: 'denuncia e logo está com ele de volta'", diz ela. "Apesar de ter recebido apoio para ir à delegacia, de saber que tem uma lei que me protege, eu era casada, mãe, precisava acreditar na mudança, até o ponto que eu achei que ele fosse me matar", disse ao R7 uma recepcionista e moradora da Favela do Pó, na zona norte de São Paulo, que preferiu não ser identificada.

A mulher afirma que viveu com o marido por mais de dez anos e, por pelo menos oito ele a agrediu. "Não era todos os dias, tinha vezes que eu achava que ele tinha melhorado, mas logo ele voltava a fazer de novo", relatou. A última vez, para a recepcionista, foi "a gota d'água". Segundo ela, o homem quebrou uma cadeira na cabeça dela, momento em que o filho mais velho, de nove anos, tentou intervir e também foi agredido.

Dois dias após o ocorrido e depois de refletir sobre o que havia lhe acontecido, observando as marcas deixadas pelo corpo por conta das agressões, a mulher chamou uma colega, que também havia enfrentado um episódio de violência doméstica, e decidiu ir à delegacia denunciar o ex-marido. Lá, ela conseguiu uma medida protetiva contra ele.

Somente em junho desse ano, 3.464 ocorrências foram registradas por lesão corporal dolosa contra as mulheres em todo o estado de São Paulo. O número de boletins de ocorrência por ameaça é ainda maior, de 4.639, segundo informações da Secretaria de Segurança Pública.

De acordo com a advogada e fundadora da Escola Brasileira de Direitos das Mulheres, Mariana Tripode, as medidas protetivas são consideradas um dos principais avanços proporcionados pela lei Maria da Penha. O reconhecimento de crime de violência psicológica, bem como a assistência psicológica, social, jurídica e médica também fazem parte da conquista obtidas com a lei.

"Os 16 anos da lei Maria da Penha são um marco que representa a liberdade que as mulheres têm hoje de poderem denunciar os agressores e saírem de relações abusivas com assistência", afirmou a advogada.

"Queria que a lei Maria da Penha colocasse mais medo nesses agressores", o desejo da recepcionista, entrevistada pela reportagem, reflete o de outras vítimas que viveram experiências semelhantes às dela. Esse sentimento tem relação com o elevado número de denúncias e diversos casos noticiados constantemente sobre agressões contra mulher, seja em casa ou fora dela.

Em junho, o caso de uma procuradora que foi brutalmente agredida por um colega de trabalho repercutiu. O homem, que também era procurador na prefeitura de Registro (SP) não se importou com a presença de outros funcionários na sala. Transtornado após saber de uma denúncia que ela havia feito sobre o compartimento dele, o agressor impediu qualquer pessoa de tentar defendê-la.

Na última semana, uma mulher foi encontrada espancada em frente ao condomínio da mãe, no Guarujá, litoral de São Paulo. Ela precisou ser internada e está em estado grave. O namorado chegou a confessar o crime para uma tia. "Eu sempre peço perdão a Deus por ter acontecido isso, mas não sou um monstro. Eu errei, mas nunca a abandonei. Estou orando muito por ela", disse o suspeito, que está foragido.

A advogada especialista em questões de gênero Marina Ruzzi explica que, apesar da lei, a luta contra a violência é constante. "Temos leis penais que servem para punir, em alguns casos até severamente as pessoas que as descumprem, como o tráfico de drogas, ou até mesmo homicídio, e a gente segue vendo casos em que são cometidos esses crimes. No caso da lei Maria da Penha é a mesma coisa", exemplificou.

Para ela, a solução, buscada cada vez mais pelos profissionais de direito, é garantir condições materiais para que as vítimas consigam romper o ciclo da violência de gênero. Mas, mais do que isso, é, também, garantir que os agressores sejam conscientizados e responsabilizados. "Temos a capacitação de serviços da rede de enfrentamento para eles terem sensibilização de gênero e temos que criar políticas para que eles discutam sua própria masculinidade e as questões da violência. A medida penalizante tem um alcance até certo ponto", concluiu a advogada.

R7

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