Quase 600 pessoas sofrem infecção em cidade no Ceará; vigilância apura contaminação em água de fábrica

UPA de Morada Nova registra lotação por casos de infecção no município — Foto: Arnaldo Araújo/SVM
Foto: Arnaldo Araújo/SVM

 

 

 


A Secretaria de Saúde de Morada Nova, no interior do Ceará, informou que já foram atendidas 582 pessoas com sintomas de infecção desde a última quinta-feira (14), quando funcionários de uma fábrica de calçados sofreram o surto e denunciaram a contaminação de água na empresa.

 Os pacientes atendidos na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e no hospital municipal tiveram sintomas como diarreia, vômito e febre. Ainda não há uma causa definida: na rede municipal, os pacientes receberam diagnósticos que vão desde leptospirose até infecção gastrointestinal.

Também há registro de pessoas procurando unidades de saúde por infecção na cidade de Ibicuitinga, cidade vizinha a Morada Nova. Esses pacientes também são pessoas que trabalham na mesma fábrica.

A TV Verdes Mares esteve na UPA onde é atendida a maioria dos pacientes. A unidade está superlotada, com pacientes inclusive sentados no chão à espera de atendimento.

Uma mulher que preferiu não se identificar afirmou que desde quinta-feira já esteve na unidade de saúde três vezes por conta dos sintomas, e que até o momento não lhe foi pedido nenhum exame. "95% das pessoas que estão aqui são da fábrica e ninguém fala nada, ninguém se declara", afirmou.

A mulher relatou que foi trabalhar na quinta-feira e começou a se sentir mal por volta das 9 horas da manhã. Ao procurar atendimento, percebeu que havia muita gente na mesma situação. "Comecei a sentir um mal-estar, ânsia de vômito, aquele rebuliço na barriga, falei que não estava me sentindo bem e falei que queria ir à enfermaria. Cheguei na enfermaria e já tava lotada, eu me admirei quando vi", relembra.

Em entrevista à TV Verdes Mares, o secretário de Saúde da cidade, Luiz Carlos da Silva, disse que não pode afirmar ainda que todos os 582 pacientes atendidos até agora têm relação com a fábrica de onde partiram as denúncias, a Coopershoes. O empreendimento é um dos principais polos geradores de emprego da região - em 2022, a empresa tinha 4 mil funcionários somente na filial.

Além dos moradores da cidade, pacientes que moram nos municípios de Ibicuitinga e Limoeiro do Norte, mas trabalham em Morada Nova, também apresentaram os sintomas. "Está todo mundo aqui reunido procurando fazer um plano de ação, vamos em busca do problema", afirmou Luiz Carlos.

Vigilância sanitária vai investigar

Funcionários de fábrica de calçado foram parar na UPA após consumir água na empresa. — Foto: Arquivo pessoal
Funcionários de fábrica de calçado foram parar na UPA após consumir água na empresa. — Foto: Arquivo pessoal


A Vigilância em Saúde do Estado do Ceará e a Secretaria da Saúde de Morada Nova estão "conduzindo investigações rigorosas para esclarecer a suspeita de contaminação ocorrido na Coopershoes".

Uma equipe foi mobilizada para coletar amostras de alimentos e água que possam estar relacionados ao incidente. Esses materiais serão enviados ao Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará (LACEN-CE) para análises. A expectativa é que até a próxima terça-feira (19) haja um resultado.

Também por meio de nota, a Coopershoes afirmou que "ao tomar conhecimento da procura de membros da comunidade nos postos de saúde, imediatamente notificou a Secretaria de Saúde de Morada Nova no dia 14 de novembro de 2024."

"No mesmo dia, a Vigilância Sanitária realizou uma inspeção nas instalações da empresa para verificar possíveis fontes de preocupação. Além disso, procedemos à coleta de amostras de água e alimentos, que foram encaminhadas para análise em um laboratório credenciado do estado, na cidade de Fortaleza. Estamos aguardando os resultados dessas análises e, assim que forem disponibilizados, compartilharemos todas as informações com os órgãos responsáveis, reafirmando nosso compromisso com a segurança e o bem-estar de nossos colaboradores e da comunidade."

Relatos

Uma funcionária da empresa que trabalha no local há três anos contou ao g1 que desde a segunda-feira (11) começaram os relatos de trabalhadores sentindo enjoos.

"Quinta-feira começou um surto total: gente saindo (da empresa) de cadeira de rodas. Inclusive, vi um rato caindo em cima do bebedouro de um setor. Enfim, ratos por todo lado"

A funcionária é uma das atendidas pela UPA da cidade. Ela teve um diagnóstico de leptospirose e disse que não urina há três dias. "Notei que a água estava com um gosto estranho. Comecei a sentir dor nos rins, muita febre, dores nas pernas e nos braços, manchas vermelhas no corpo. E estou sem urinar, o que foi crucial para o diagnóstico", relatou a trabalhadora.

Outra funcionária disse que também tem sintomas desde a quinta-feira. Ela teve um diagnóstico de diarreia e gastroenterite de origem infecciosa.

"Passei meu horário todo bebendo água. Quando voltei do descanso, havia comentário de que havia ratos na caixa d'água. Parei de beber água. Meia-noite, comecei a sentir meu corpo todo quebrado, vomitei muito. Ainda estou vomitando, com diarreia e dor de cabeça", contou.

Ela também está na empresa há três anos e relata que já viu ratos pela fábrica, especialmente nas esteiras de produção.

Uma terceira funcionária que aceitou falar com o g1 disse que na última semana a água da empresa apresentava cor diferente, aparentando estar suja. "E mesmo assim tivemos que beber porque não podemos levar água de casa, eles não aceitam entrar (...) Na quinta, algumas pessoas não conseguiam nem chegar ao banheiro e vomitavam na porta (da empresa).".

Um quarto funcionário foi atendido na UPA da cidade na manhã deste domingo (17) afirmando sentir sintomas como febre, dor de barriga e na cabeça, vômito, fraqueza, sem vontade de comer, garganta seca e inflamada.

Ele disse que começou a sentir os incômodos na quinta-feira também, mas resolveu retornar à UPA no fim de semana quando sentiu seu estado agravar.

 
 
 
 
 
(g1)