Alunos do interior do Ceará usam IA para auxiliar diagnóstico precoce de Alzheimer

 




É de Cedro, cidade cearense a 400 km de Fortaleza, que o Ceará pode ver surgir mais uma ferramenta inovadora para a área da saúde. Estudo de alunos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) mostra que a inteligência artificial (IA) pode auxiliar médicos no diagnóstico precoce do Alzheimer.

Os estudantes “ensinaram” a IA, por “deep learning” (quando a inteligência aprende “sozinha”, a partir de dados fornecidos), a analisar imagens de ressonâncias magnéticas (RM) do cérebro e encontrar sinais iniciais da demência. 

A IA avalia os exames, percebe alterações e sugere aos profissionais de saúde pontos de preocupação, facilitando a identificação do Alzheimer.

Imagem mostra quatro alunos do IFCE, duas meninas vestindo um uniforme azul marinho e dois meninos, um vestindo camisa vermelha e outro azul marinho.
Foto: Arquivo pessoal.



O trabalho foi desenvolvido pelos estudantes Amanda do Nascimento Correia, Daniel Teixeira da Silva, Francisco Erivando Bezerra Barbosa e Maria Danielly Benício de Araújo, sob orientação dos professores Michael Lopes Bastos e Francisca Jamires da Costa, do curso de Sistemas de Informação do IFCE Cedro.

A análise detalhada das imagens de RM, incluindo a anotação de regiões com possíveis alterações cerebrais, “possibilitou uma avaliação minuciosa das modificações induzidas pela Doença de Alzheimer”, destacam os alunos, em documento assinado coletivamente.

A ideia surgiu na disciplina de Processamento Digital de Imagem (PDI), que estimula os estudantes a identificar problemas do cotidiano que podem ser resolvidos usando as tecnologias estudadas nas aulas – e as técnicas de IA estão entre elas, como explica o professor Michael Lopes.

Focar no Alzheimer, contudo, foi motivação além da ciência: a avó de uma das alunas que assinam o trabalho convive com a doença. “A partir disso, identificamos essa necessidade de unirmos as tecnologias da disciplina com esse problema”, justifica o docente.

O estudo iniciou com o levantamento de bases de dados relacionadas ao assunto. No processo, os alunos encontraram “uma pesquisa internacional mais longeva, em que os pesquisadores pegaram imagens de ressonâncias magnéticas de longo período para identificar o mais previamente possível o Alzheimer”.

“É algo similar a essa pesquisa, mas tentando adicionar mais algumas técnicas de PDI. A ideia é que isso possa ser feito no futuro: pegar imagens de mais tempo. Técnicas que possam enfatizar mais ainda as lesões que possam ser identificadas”, explica Michael.

Como a IA é usada

Primeiro, é importante reforçar: a ferramenta de inteligência artificial não faz o diagnóstico do Alzheimer. “É um auxílio, porque a máquina não pode dar um laudo. Ela identifica o que ela acha a respeito do problema, e nós, usando o conhecimento humano, mostramos ao profissional médico”, pontua o professor orientador.

Segundo Michael, a máquina analisa os exames de imagem e informa uma porcentagem de correspondência daqueles resultados para Alzheimer. “Ela reduz o espaço amostral de possibilidades, pra que o médico possa tomar a melhor decisão.”

Os alunos autores do estudo destacam que “alterações estruturais e morfológicas frequentemente associadas à perda de memória podem ser observadas por meio da ressonância magnética, destacando sua importância no acompanhamento clínico”.

“A segmentação de imagens demonstrou ser uma ferramenta essencial para o diagnóstico e monitoramento da doença, pois permite a extração de características relevantes e a quantificação do progresso das atrofias em estruturas específicas”, pontuam.

Os alunos reforçam que “a identificação precoce das alterações é considerada essencial para o manejo eficaz da doença, possibilitando intervenções terapêuticas mais oportunas”. Para isso, “o desenvolvimento de métodos automáticos de segmentação contribui para a análise quantitativa e para o apoio ao diagnóstico da doença”. 

Caso a solução progrida, pode ser uma ferramenta valiosa para a medicina – e “na palma da mão” dos profissionais, como reitera o professor Michael. “O diagnóstico desse tipo de doença é desafiador pros médicos. Podemos criar um modelo que possa ser executado em dispositivos móveis ou na nuvem, pra que o médico tenha acesso de maneira rápida”, situa.

“É o médico ter a ressonância do usuário e, em minutos, ter um resultado na tela do computador, já com um mapa de calor nas regiões que podem preocupar”, complementa o orientador. “A gente poderia nacionalizar isso pro SUS. A nível nacional, isso não existe ainda. Uma solução dessa pro Brasil seria algo disruptivo.”

Falta de ‘supercomputador’

Uma contradição, contudo, barra o projeto ir para a frente: a falta de um computador potente o suficiente. “PDI exige um grande poder computacional, porque as imagens são grandes. Fazemos um processamento pra diminuí-las, mas mesmo assim são muitas. Essa solução foi executada nas máquinas dos alunos, que não são adequadas”, declara Michael.

O orientador observa que “os alunos tiveram bons resultados e a solução é promissora”, e acredita que, com mais “poder computacional”, resultados mais completos e precisos podem ser publicados.

Uma próxima fase de desenvolvimento da IA deve incluir melhorias que a tornem mais “entendível” pelo usuário final – que, neste caso, serão os profissionais médicos.

Imagem mostra cérebro visto por meio de exame de ressonância magnética.

Legenda: Conjunto de imagens de ressonância magnética cerebral, mostrando diferentes seções e angulações do cérebro humano.

Foto: Reprodução/Estudo IFCE.


“A IA explicável vem pra tornar o resultado legível e entendível, pra que o médico entenda o porquê de a IA ter tomado essa decisão, por que ela identificou que esse ponto pode vir a ser Alzheimer no futuro”, diz o professor.

As evoluções da pesquisa nascida na sala de aula, em uma disciplina, tendem a ser aceleradas em 2026, já que os alunos e o professor estão criando um grupo de pesquisa voltado à computação no IFCE Cedro, o que ainda não existia.

“A ideia é que a partir disso a gente consiga submeter essas ideias a editais e angariar fundos pra comprar uma máquina que possa dar suporte a um processamento mais robusto dessas imagens. Entendemos as limitações do trabalho, mas entendemos que ele tem muito potencial pra ser melhorado. Os alunos têm muita capacidade”, orgulha-se Michael.

Além do Alzheimer, a solução pode ser, no futuro, aplicada à identificação de outros transtornos e doenças, como o autismo. “Temos muitas ideias”, conclui o docente.

Os estudantes destacam que os achados do estudo “reforçam a necessidade contínua de avanços nas técnicas de imagem e nos métodos computacionais aplicados à neuroimagem, visando otimizar a compreensão e o manejo do Alzheimer”. 

“Os resultados são de grande relevância para a compreensão da extensão e da natureza das alterações cerebrais associadas à patologia, contribuindo para futuras pesquisas e para o desenvolvimento de possíveis abordagens terapêuticas.”

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