Dois milhões de gatos
exterminados. Essa é a meta que o governo australiano pretende atingir até
2020.
Não são gatos quaisquer, mas animais
que retornaram para a vida selvagem e agora estão ameaçando cerca de 140
espécies nativas na Austrália.
São os chamados gatos ferais.
"Os gatos ferais são da mesma espécie dos gatos domésticos, mas vivem e se
reproduzem na selva, sobrevivendo da caça ou de animais mortos. São encontrados
em toda a Austrália, em todos os habitats", diz o Departamento de Meio
Ambiente e Energia do país.
Estima-se que existam entre dois
e seis milhões de gatos ferais na Austrália. Eles se alimentam principalmente
de pequenos animais nativos ou exóticos, como coelhos, pássaros e lagartos.
Em julho de 2015, o país declarou
oficialmente que gatos ferais são uma praga que ameaça a vida nativa
australiana. "Apesar de reconhecer a importância dos gatos domésticos como
animais de companhia, gatos que voltam à vida selvagem podem ameaçar a fauna
nativa", diz a declaração.
Além disso, o país lançou um
programa de eliminação desses gatos não domesticados. "Eles têm sido um
dos principais responsáveis pela extinção de pelo menos 27 mamíferos, desde que
foram introduzidos na Austrália. Hoje, eles colocam em perigo pelo menos 142
espécies e mais de um terço dos mamíferos, répteis, sapos e pássaros que estão
ameaçados", afirma o documento Estratégia para Espécies Ameaçadas, também
de 2015.
"Sendo um fator de extinção
para tantos dos nossos animais nativos, e sendo uma ameaça que foi
relativamente negligenciada no passado, o combate à ameaça dos gatos selvagens
é a principal prioridade desse plano de ação."
Ativistas e personalidades
criticaram a medida
Na época do lançamento do
programa de abate de gatos, em 2015, foram criados abaixo-assinados contra a
medida.
Um dos mais populares conseguiu
cerca de 30 mil assinaturas, muitas delas este ano, depois que o fato voltou a
ganhar destaque na imprensa internacional. O texto da petição recomenda que o
governo australiano utilize outro método de controle da população de gatos:
fazer armadilhas para capturar os animais, castrá-los e depois liberá-los.
Personalidades também fizeram
críticas públicas ao governo australiano, entre elas, a atriz francesa e
ativista pelo direito dos animais Brigitte Bardot. "Esse genocídio animal
é desumano e ridículo. Além de ser cruel, matar esses gatos é absolutamente
inútil, já que o resto deles continuará se reproduzindo", escreveu Bardot
em carta para o então ministro do Meio Ambiente australiano.
Em resposta, o governo
australiano disse que "não é realista ou factível fazer armadilhas e
castrar milhões de gatos ferais nos mais de sete milhões de quilômetros
quadrados" do território australiano. Além disso, argumentou que não seria
humano permitir que animais nativos continuem sendo mortos pelos gatos, dia
após dia.
Petiscos envenenados e espalhados
com aviões e drones
Segundo o Departamento de Meio
Ambiente da Austrália, os métodos de tiro e armadilha são difíceis, caros,
demorados e exigem pessoal especializado. Assim, "a forma mais efetiva de
controlar os gatos selvagens em grandes áreas é por meio de petiscos envenenados".
Tratam-se de pequenos petiscos de
carne, injetados com uma toxina fatal para os gatos. A recomendação é que sejam
jogados no chão, com aviões ou drones, por exemplo - já que gatos não cavam o
solo para achar comida.
Há mais de um tipo de veneno. Para
a região da Austrália Ocidental, o governo desenvolveu uma isca chamada
"Eradicat". É um petisco de carne de canguru e frango com uma toxina
sintética chamada de 1080, que reproduz um veneno natural encontrado em algumas
plantas dessa região.
Por isso, muitos dos animais
nativos da região já desenvolveram resistência. Já os gatos, que são espécies
exóticas, não têm a mesma tolerância e acabam não resistindo. Ao ser ingerido,
o 1080 interromper a capacidade das células dos gatos de processar energia, fazendo
com que percam a consciência e morram.
Já em outras regiões da
Austrália, como o Norte e o Leste, a toxina 1080 pode ser perigosa também para
espécies nativas. Assim, o "Eradicat" não é recomendado. Como
alternativa, o Departamento do Meio Ambiente desenvolveu outro tipo de petisco,
contendo uma cápsula de plástico rígido com veneno, chamada
"Curiosity".
Gatos não costumam mastigar muito
a comida, pelo contrário, tendem a engolir pedaços inteiros. Assim, acabam
ingerindo a cápsula envenenada presente no petisco. Já a maioria dos animais
nativos australianos mordiscam e mastigam a comida e acabam cuspindo o plástico
presente no petisco.
A "Curiosity" provoca a
morte por falta de envio de oxigênio para o cérebro e outros órgãos vitais.
"É um claro ganho de humanidade em relação a outras toxinas", diz o
Departamento de Meio Ambiente da Austrália.
Abatimento de 2 milhões de
animais
O documento Estratégia para
Espécies Ameaçadas, de 2015, estabelece metas para conter os gatos ferais.
Entre elas, abater 2 milhões de
animais até 2020; erradicá-los completamente de cinco ilhas, para que estas se
tornem santuários de espécies selvagens; e manejar sua presença em até 12
milhões de hectares (equivalente aos Estados de Pernambuco e Sergipe juntos).
A previsão era abater 150 mil
gatos até 2016, 1 milhão até o 2018, até chegar a 2 milhões em 2020.
Os princípios que norteiam a
eliminação dos gatos são que ela seja feita de forma "humana, efetiva e
justificável". As ações são tomadas principalmente em regiões remotas e
longe das cidades - reduzindo o perigo para os gatos domésticos.
Uma das maiores dificuldade para
atingir essas metas é que os gatos não domesticados estão espalhados por
regiões muito extensas e são tímidos. Por isso, é difícil localizá-los.
Para ajudar na tarefa de
localização dos animais, o Departamento do Meio Ambiente da Austrália financiou
o lançamento do site Feral Cat Scan, que recebe relatos de avistamento de gato
ferais.
"As informações fornecidas
vão ajudar a identificar soluções para manejar os gatos selvagens e reduzir seu
impacto na preciosa vida nativa australiana", diz o site, que já recebeu
mais de 4 mil notificações - 130 apenas este ano.
Ainda não há informações sobre o
status das metas de abate. Este ano, o governo australiano lançou uma pesquisa
destinada a organizações e australianos em geral que estejam envolvidos no
combate ao gato feral. O objetivo é entender como está sendo o "esforço
nacional para combater essa ameaça" e conhecer os progressos feitos até
2018.
BBC News Brasil