O ano passado foi marcado pelo crescimento no número de arboviroses -
doenças transmitidas por picadas de mosquitos - registradas no Ceará. O
índice foi o maior das últimas três décadas, quando o Estado registrou a
primeira epidemia de dengue. Com o objetivo de incentivar os municípios
a atingirem melhores resultados no enfrentamento às arboviroses, o
Governo do Estado liberou R$ 10 milhões às cidades que cumprissem seis
critérios estabelecidos pela Secretaria da Saúde (Sesa) do Ceará.
A medida, na prática, foi eficaz. Em 2018, o número de doenças caiu e
100 cidades cearenses foram premiadas com o recurso. Os dados
epidemiológicos do Estado apontam para um cenário de maior redução de
casos de arboviroses observada nos últimos dez anos de análise.
No primeiro Levantamento Rápido de Índices de Infestação pelo Aedes
aegypti (LIRAa) deste ano, das 183 cidades cearenses participantes,
54,6% apresentaram baixa infestação e 34,9% tiveram média infestação. Já
o número de municípios com alta infecção pelo mosquito caiu de 45, em
2017, para 19, neste ano, o que representa redução de 65,9%. Em
contrapartida, o número de municípios com infestação satisfatória saltou
de 56 para 100.
De acordo com a Sesa, os resultados alcançados em 2018 devem-se em
parte ao incentivo financeiro, "pois houve um engajamento de vários
segmentos da sociedade e dos gestores públicos municipais. A população
em geral se solidarizou aos movimentos dos comitês municipais de
enfrentamento às arboviroses e fez a sua parte". Diante da estratégia
virtuosa, o Governo do Estado já planeja uma nova edição do incentivo
para o próximo ano. O rateio do montante deste ano foi pago aos
municípios no mês passado e os recursos devem beneficiar mais de três
milhões de habitantes.
Engajamento
Entre as cidades classificadas, observa-se uma homogeneidade das ações
de combate ao mosquito transmissor das doenças. Trabalhos
intersetoriais, com o engajamento de diversas secretarias, investimento
na educação e medidas regulares se destacam e convergem em resultados
positivos. Em Iguatu, a maior cidade da região Centro-Sul do Estado, o
cenário mudou de 2017 para 2018 e o Município foi um dos que conseguiram
alcançar os critérios estabelecidos pela Sesa.
O secretário da Saúde de Iguatu, Marcelo Sobreira, explica que no ano
passado, a cidade possuía um grande número de casos de chikungunya
(1.319) e dengue (177). Em 2018, portanto, foi montada uma "operação de
guerra" para combater as arboviroses, com destaque na educação e foco ao
trabalho de conscientização da população.
O titular da pasta destaca que o primeiro ponto atacado foi a parceria
com as escolas da cidade e empresas. "Criamos também um projeto com a
CDL para premiar as casas que reduzem a zero esse índice. E, por fim,
aumentamos consideravelmente o número de agentes de endemias",
complementa.
Segundo Sobreira, a implantação do "Selo Zero" foi um incentivo para
que os próprios moradores se conscientizassem e buscassem manter o baixo
índice de arboviroses na cidade. "A Prefeitura cria os canais, mas é a
população que atua de forma efetiva. Somente com os trabalhos dos
agentes não conseguiríamos lograr êxito", acrescenta.
Com advento destas ações, na cidade de Iguatu o número de doentes por
dengue e chikungunya declinou. Nos primeiros seis meses de 2018, a
Secretaria da Saúde do Município confirmou apenas oito casos de
chikungunya e 114 de dengue. A premiação de R$ 100 mil, conforme detalha
Sobreira, será destinada em sua totalidade para manutenção da
infraestrutura de combate as endemias. "Passamos de 35 para 52 agentes,
então vamos destinar a verba para compra de novos fardamentos, aquisição
de insumos, manutenção de carros, e tudo que seja necessário para
manter a cidade livre dessas doenças transmitidas pelo Aedes", finalizou
o secretário da Saúde de Iguatu.
Em Banabuiú, no Sertão Central, a secretária da Saúde, Rianna Nobre,
explica que a principal estratégia, assim como em Iguatu, foi a "da
promoção e educação em saúde, com capacitações e palestras". Rianna
detalha ainda que cada semana um bairro da cidade era alvo de uma ação
mais intensificada que durava o dia todo. Ela comemora o recebimento da
verba e diz ser "imensurável a importância do incentivo, tendo em vista
que o setor de Endemias passou a ter uma interação com os demais setores
da saúde, já que a arbovirose não é um tema restrito apenas a Saúde". O
recurso, acrescenta a secretária, será destinado a Pasta com prioridade
para garantir melhores condições de trabalho ao setor de vigilância.
Grandes cidades
Fortaleza e Juazeiro do Norte - maior cidade do interior do Ceará -
integram a lista das cidades que não receberam o incentivo do Governo do
Estado. O coordenador de vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de
Saúde (SMS) de Fortaleza, Nélio Moraes, minimiza a "não inclusão" e
justifica que os critérios adotados pela Sesa não se "encaixam"
adequadamente para os grandes centros e nem traduzem, ao pé da letra,
que as cidades fora desta lista não obtiveram êxito na redução dessas
doenças.
"Esses critérios vestem melhor as cidades de pequeno e médio porte. Não
desmerecendo estes municípios, há sim muitos méritos, mas nas grandes
cidades a realidade é outra. Os desafios vão além destes critérios
estabelecidos. Fortaleza cresce 30 mil imóveis a cada ano, então é um
universo de atuação bastante superior. Ainda assim, conseguimos atingir
números bastante relevantes no combate ao Aedes", destaca.
Nos primeiros seis meses deste ano, foram confirmados 619 casos de
dengue em Fortaleza. Em igual período de 2017, a SMS confirmou 12.915
casos, o que representa um recuo maiúsculo de 95%. Moraes explica que o
baixo número de casos deve-se a um trabalho do Comitê Intersetorial
desenvolvido pela SMS. "Temos que envolver outros setores senão a
realidade será sempre a mesma", pontua, elencando o trabalho da remoção
de lixo em pontos estratégicos que conta com as ações da Agência de
Fiscalização de Fortaleza (Agefis). O coordenador também lembra que a
redução está relacionada com a dinâmica de circulação da dengue,
"Atualmente, há um estado de acomodação natural do mosquito, devido a
escassez de chuvas", acrescenta.
Em Juazeiro do Norte, na região do Cariri, o cenário é semelhante à
Capital cearense. Em 2017, houve confirmação de 46 casos de dengue e,
nos primeiros oito meses deste ano, apenas três. Em relação a
chikungunya, foram 89 casos em 2017 contra seis em 2018, o que expõe uma
redução nas arboviroses.
No entanto, a cidade não conseguiu atender todos os critérios pontuados
pela Sesa. A secretária da Saúde de Juazeiro, Francimones Rolim
Albuquerque, explica que os agentes de endemias não conseguiram cumprir
os 80% mínimos de visitação nos domicílios, conforme preconiza a Sesa.
"Tivemos uma greve que durou 48 dias, isso nos prejudicou muito e
atrapalhou nosso cronograma", acrescenta.
Ainda de acordo com a titular da Pasta, "mutirões foram realizados,
inclusive nos fins de semana, após a paralisação dos agentes e todos os
bairros já receberam cobertura". Francimones destaca ainda outras
medidas ao combate das arboviroses, como a criação de um aplicativo para
smartphone que auxiliará a visitação e servirá, também, como canal de
denúncia.
Atualmente, 176 agentes de endemias estão cadastrados no municípios, e
142 estão em plena atividade. O número, na avaliação da secretária, não é
satisfatório. "Não é um número ideal, mas como não podemos abrir edital
neste ano para concurso, vamos adotando medidas adicionais, para manter
a redução".
Preocupação constante
Embora tenha ocorrido uma redução de 95% nos casos de dengue em
Fortaleza, o coordenador de vigilância, Nélio Moraes, alerta para
necessidade de manter o trabalho frequente de combate as arboviroses,
sobretudo nas regiões em que continuam sendo confirmados casos, como os
bairros Bom Jardim, Cristo Redentor, Serrinha, Granja Portugal e
Conjunto Ceará I.
Nélio explica, por fim, que, para manter o cenário de alívio,
necessita-se investimentos concretos e bem direcionados. Para este
semestre, está previsto o lançamento do Plano Dengue Zero em 2019.
Diário do Nordeste